quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

.: Dança com menos cadeiras, por Rogério Godinho

Por Rogério Godinho
Em dezembro de 2015

Há um consenso ardiloso no ar. A maior parte dos artigos e matérias sobre a ocupação das escolas aponta que o principal erro da administração Alckmin foi não dialogar com pais e professores. E isso é um fato. Só que aí eles deixam implícito que esse diálogo seria somente uma oportunidade de explicar a maravilha que é a reorganização. Cadê o ardil? Ele está em vender que a reorganização é essencialmente boa, pois privilegia as escolas de ciclo único. Pais e alunos é que não entenderam, coitados. 

Este é um reducionismo perigoso. E extremamente eficaz como argumento. Afinal, o ciclo único realmente é indicado pelos especialistas e pode melhorar a qualidade da educação (embora não tenham sido feitos estudos mostrando o impacto disso na rede paulista). 

Todo mundo acreditou. Quem pode ser contra melhorar a educação? Ah, somente grupos com interesse político, sugerem matérias que entrevistam fontes do governo. 

A sugestão é uma ofensa a milhares de pessoas que participam de uma das maiores movimentações políticas da década. Elas não estão revoltadas com o ciclo único, mas com o fechamento das escolas. Admito: o governo foi genial ao misturar as duas coisas. Pegou uma ideia antiga e nunca seriamente discutida– ciclo único – e enfiou no pacote para tentar justificar fechar escolas. Ô governo bão

Fica a dica para o futuro: rejeite um rótulo – reorganização – que tenta colocar juntos uma medida potencialmente positiva e outra indubitavelmente negativa.

É como dizer que você vai fazer uma danças das cadeiras – remanejar – e para fazer isso bem vai ter que retirar algumas cadeiras. Ora, remanejar fica mais fácil se você mantiver as cadeiras.

A verdade indiscutível é que o objetivo de todo esse circo é reduzir custos. 

Em junho, Alckmin anunciou 28 medidas para fazer isso, incluindo fechar o Fundap (cúmulo da cegueira). Essa é a questão central, o que justifica toda essa preocupação com educação: poupar dinheiro. 
Para quem foca no fechamento das escolas, o governo responde que o número de alunos diminuiu, o que é verdade. O que ele deixa de dizer é que quase todas as salas de aula estão acima do número ideal de alunos. 

No início do ano disseram que tentariam limitar em 40 alunos no ensino médio, mas nem isso foi cumprido, sendo comum encontrar quase 50 por sala. Há casos de mais de 70 alunos. 

Se quisesse mesmo aumentar a qualidade da educação, Alckmin aproveitaria essa diminuição e proporia reduzir o número de alunos por sala. Ou, melhor ainda, o aproximasse do que o Conae recomenda: 15 para a educação infantil, 20 para o ensino fundamental e 25 para o Ensino Médio. 

Ah, não tem dinheiro. Para educação nunca tem. Quem quer investir em uma área que só dá frutos muito depois que o político sai?

Sobre o autor
Rogério Godinho é jornalista e biógrafo. Trabalhou em diversos veículos da grande imprensa, como a Gazeta Mercantil e a Forbes Brasil. Foi ainda editor ­executivo e associado das revistas B2B Magazine e Consumidor Moderno. Durante um longo período, produziu especiais para o jornal Valor Econômico. Estudou história global e globalização em Harvard e frequentou o Massachusetts Institute of Technology (MIT) como aluno­visitante de Filosofia. É autor das seguintes obras: "O Filho da Crise", lançado em 2011, "Tente Outra Vez", 2014 e "Direitos Humanos ­ Nunca na Solidão", em 2014.
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