Consumo desenfreado e precarização do trabalho são temas de "Agamenon 12h", texto de Rodrigo García e direção de Carlos Canhameiro que alterna 12 atores em 12 horas de sessões ininterruptas
Agamenon 12h. Foto: Mariana Chama
Rodrigo García, encenador argentino radicado na Espanha, é autor de dezenas de peças de teatro; algumas de suas obras estiveram no Brasil, como “Gólgota Picnic” (MITsp/2014) e “4” (Mirada/2016)
12 atores e atrizes se sucedem interpretando o mesmo texto, no mesmo cenário, em uma experiência cênica que dura 12 horas seguidas, sem intervalos, das 10h às 22h, de quarta a sábado em um dos endereços mais movimentados da capital paulista. Para assistir, a plateia pode entrar, acompanhar, sair, voltar e ainda assim haverá o mesmo texto sendo interpretado, mas agora já por outro artista. E depois outra. E outro e outra.
Esta é a proposta de "Agamenon 12h", concepção e direção de Carlos Canhameiro que estreia 10 de agosto de 2022, na Praça (térreo) do Sesc Avenida Paulista (Av. Paulista, 119 - Bela Vista). A entrada e a saída são grátis e livres - o espectador escolhe quanto tempo ele quer assistir, com acesso liberado.
"Agamenon 12h" é uma experiência cênica com os atores e atrizes Amanda Lyra, Cauê Gouveia, Chico Lima, Danielli Mendes, Eduardo Bordinhon, Janaina Leite, Jorge Neto, José Jardim, Nilcéia Vicente, Mariana Senne, Mercedez Vulcão e Veronica Valenttino, a partir do texto do autor argentino Rodrigo García. É a primeira vez que o texto ganha uma versão brasileira. A tradução e adaptação do texto “Agamenon - Voltei do Supermercado e dei uma surra no meu filho” (2004), de Rodrigo García, é do Canhameiro e de Chico Lima.
Nenhum dos dias de apresentação é igual ao outro. Isso porque os doze atores não se apresentarão na mesma ordem, a cada dia eles vão também se alternando, como peças de uma engrenagem em que se pode alterar sem prejuízo do funcionamento, mas com diferenças no entendimento. A cada versão, cada ator oferece sua proposta, uma linguagem e uma cena diferente apesar do mesmo texto.
“O teatro tem inúmeras possibilidades formais que podem ser muito diferentes entre si. Não acredito que exista a maneira certa de fazer um texto. Acredito sim que a diversão para o público será perceber quais as formas, e os afetos escolhidos por cada artista em cada cena, o agrada, o instiga ou o repulsa. Para mim, essas diferenças são mais complementares do que excludentes, o teatro é mais plural do que singular." explica Canhameiro.
Este projeto foi contemplado pela 12ª Edição do Prêmio Zé Renato de apoio à produção e desenvolvimento da atividade teatral para a cidade de São Paulo - Secretaria Municipal de Cultura.
Rodrigo García
O texto de Rodrigo García é bastante violento, ao mesmo tempo que é bem-humorado. Traz a história de um dia de um pai de família vivendo em um mundo do consumo que não tem fim, uma vida abarrotada de coisas inúteis. E de sentimentos que não têm vazão. De abundância de estímulos e de informações. O enredo é uma profunda reflexão sobre a ordem mundial atual, as disparidades econômicas e também as questões de gênero.
Autor de dezenas de peças de teatro, o encenador argentino radicado na Espanha desde a década de 1980 Rodrigo García ocupa lugar de destaque nas artes cênicas atuais. Suas montagens costumam ter imagens de forte impacto, problematizando valores éticos, principalmente nas relações de poder. Parte da dramaturgia causa sentimentos confusos nos espectadores e acabam provocando grandes protestos de grupos ligados à proteção dos animais e também à Igreja Católica. Obras como 4 e Gólgota Picnic estiveram presentes no Brasil em festivais importantes como a MITsp – Mostra Internacional de Teatro de São Paulo e o Mirada - Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas do Sesc SP.
No texto Agamenon, de Rodrigo García, são as diferentes formas de criar uma cena que reinventam a tragédia diária e o modo de passar o tempo. A ideia de trazer o texto para o Brasil veio com a reforma trabalhista de 2017 - que mudou as regras de jornada de trabalho, trouxe uma pretensa flexibilização, aumentando ainda mais a precarização das relações empregatícias e empurrando ainda mais os trabalhadores à informalidade. Essa relação com o fazer cada vez mais para ganhar cada vez menos e gastar cada vez mais com produtos que duram cada vez menos está no texto de García.
O dia de um pai de família, hoje mesmo, ou anteontem. O mundo do consumo que não tem fim, uma vida atafulhada de coisas inúteis. Uma intensa reflexão sobre a ordem mundial, as assimetrias econômicas, o terror e as questões de gênero. Um autor convulsivo que reformula o teatro. Tiro tudo o que há em cima da mesa / as Coca – Colas, os restos dos molhos, tudo / Deixo o espaço limpo só para as asinhas de frango / Uma duas sete asinhas de frango / Coloco-as na mesa, cada qual no seu sítio / Perfeitas / Agarro no ketchup e escrevo bem grande na mesa a palavra: tragédia / E o meu filho caga-se a rir / E explico-lhe que a tragédia começa com o mundo industrializado.
Rodrigo García, Agamémnon
Consuma, consuma, consuma
O ponto inicial do texto é a produção desenfreada de produtos supérfluos que acabam virando lixo, acarretando inclusive em questões ambientais. “Produzir lixo com roupagem de coisa fina. Comprar sem entender o processo de criação, o mecanismo de produção… Tudo luminoso, excessivo e inútil do ponto de vista do homem, mas que será lixo na perspectiva do planeta”, conta Canhameiro.
A dramaturgia vai do registro radical de uma situação cotidiana de um pai de família decepcionado com o seu vazio existencial a partir da frustração de uma compra em um supermercado seguida de uma ida ao restaurante fast food. Esse pai de família desconta esse vazio em sua família e tenta explicar o (des)funcionamento da sociedade atual para seu filho, de maneira nada ortodoxa, mas que faz uma relação peculiar com o dia-a-dia atual.
O cenário - criado por Renato Bolelli Rebouças - faz referência a uma banca de camelô, com centenas de produtos de diferentes usos e qualidade e durabilidade descartáveis. A instalação ficará disponível para que o público ‘visite’ mesmo quando não houver sessão.
A trilha sonora - composta por Guilherme Marques e Paula Mirhan - também é diferenciada. Foram produzidas 12 trilhas sonoras originais e diferentes - uma para cada sessão diária de espetáculo, produzida para aquele “horário”. O desenho de som é de Lilla Stipp.
Sinopse: "Agamenon 12h" é uma experiência cênica com os atores e atrizes Amanda Lyra, Cauê Gouveia, Chico Lima, Danielli Mendes, Eduardo Bordinhon, Janaina Leite, Jorge Neto, José Jardim, Nilcéia Vicente, Mariana Senne, Mercedez Vulcão e Veronica Valenttino, a partir do texto do autor argentino Rodrigo García. Se a tragédia começa no mundo industrializado, e se temos gastado a nossa vida fazendo o que nos disseram, como diz o texto, em "Agamenon 12h", são as diferentes formas de criar uma cena que reinventam a tragédia diária e o modo de passar o tempo. Com concepção e direção de Carlos Canhameiro, ao longo de 12 horas, os 12 artistas se revezam na Praça (térreo) do Sesc Avenida Paulista para apresentar 12 versões de um mesmo texto. E o público é livre para acompanhar essa experiência por quanto tempo quiser.
"A esperança não é um sonho; é um projeto" - Rodrigo García
Ficha Técnica
Concepção e direção: Carlos Canhameiro
Texto: Rodrigo García
Elenco: Amanda Lyra, Cauê Gouveia, Chico Lima, Danielli Mendes, Eduardo Bordinhon, Janaina Leite, Jorge Neto, José Jardim, Nilcéia Vicente, Mariana Senne, Mercedez Vulcão e Veronica Valenttino
Trilha sonora: Guilherme Marques, Paula Mirhan
Desenho de som: Lilla Stipp
Cenário: Renato Bolelli Rebouças
Iluminação: Daniel Gonzalez
Figurino: Anuro, Cacau Francisco
Fotos: Mariana Chama
Produção: Corpo Rastreado - Gabi Gonçalves
Serviço
Teatro | "Agamenon 12h"
Data: 10 a 27 de agosto de 2022. Quarta a sábado, das 10h às 22h.
Local: Praça - Térreo - Sesc Avenida Paulista - Av. Paulista, 119.
Classificação: 14 anos.
Duração: 12 horas
Capacidade: 80 lugares.
Ingressos: Grátis.
Horário de funcionamento da unidade:
Terça a sexta, das 10h às 21h30.
Sábados, domingos e feriados, das 10h às 18h30.