Por Vieira Vivo, escritor e ativista cultural.
"Liberdade são portas e janelas
de uma casa que só se abrem por dentro."
A partir de um muro, podemos delimitar a catatonia interior da subalternidade e sua antítese elucidativa construtora de consciência e autodeterminação. A claridade intensa da liberdade advém de um pequeno raio de luz teimosamente infiltrado por um minúsculo orifício. A sede cognitiva aliada à curiosidade intelectual eleva e expande a visão do ser humano. À despeito de um ambiente claustrofóbico e opressor, o personagem alimenta-se de conhecimentos ofertados por uma pequena saliência, descoberta ao acaso, em seu obscuro e ínfimo mundo existencial. Esta é a primeira janela, neste livro de contos, aberta ante nosso deslumbrado e atento olhar.
As sagas cotidianas de personagens anônimos oriundos das camadas inferiores do nosso extrato social, a carregar sempre o peso da pele escura e da pobreza secular em suas residências simples em vielas periféricas à sombra das imensas chaminés dos complexos industriais. Nessa atmosfera cinza e esfumaçada aos pés da Serra do Mar, transitando por ruas enlameadas, valas e chuva intensa, as pessoas traçam metas e vitórias opacas entre seus pequenos grandes conflitos, suas perspectivas rotas e fugazes e a perpetuidade das parcas condições de movimentação restritas aos seus conflitos pessoais.
Além de ser uma ode à cidade de Cubatão e suas adjacências, Márcio Gregório de Sá nos faz trafegar por ínvias trilhas da exuberante Mata Atlântica, pelos pátios de armazéns e trilhos infinitos, pelo comércio claudicante e estagnado de sua urbanidade, traçando conflitos inglórios, retratando a exaustiva e sobre humana tarefa diária dos que vivem à margem do capitalismo. Além do envolvimento dos personagens aos movimentos sociais, ao grafite urbano e à militância sindical. No livro há, ainda, os explícitos métodos preconceituosos arraigados nas elites praianas e o contrastante viver amargo das palafitas.
Os personagens são entes com que cruzamos anonimamente entre os transeuntes e aí reside a grandeza da literatura em tornar o simples e opaco em algo radiante e eterno. Até mesmo Afonso Schmidt encontra seu personagem Salústio no centro histórico de Santos com a mesma familiaridade com que encontramos Marcelo Portuária, com seu violão e chapéu, nas noites boêmias do Valongo.
"Cordilheira de Sonhos" (Editora Patuá). prefácio de Flávio Viegas Amoreira, revela-se um livro marcante, tocante, cativante e tem lugar de destaque, não só em nossa biblioteca pessoal, mas no seleto rol de escritos incorporados ao que há de preponderante em nossa literatura. Compre o livro "Cordilheira de Sonhos", de Márcio Gregório Sá, neste link.









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