Por Helder Moraes Miranda, especial para o portal Resenhando.com. Foto: Luiz Franco.
Há músicas que grudam feito chiclete e sobrevivem ao tempo mesmo contra a vontade de quem tenta esquecê-las. Canções que explodiram em rádios, trilhas de filmes e pistas de dança, mas acabaram arrastando para o limbo da memória os próprios artistas que as criaram. É nesse território delicado entre o brilho efêmero e o anonimato que o jornalista Braulio Lorentz, editor de cultura do G1 e apaixonado confesso por pop, mergulha em seu novo livro, "Baseado em Hits Reais", publicado pela editora Máquina de Livros.
A obra reúne mais de 40 histórias de nomes que já ocuparam o topo das paradas, de Natalie Imbruglia a Kelly Key, de Lou Bega a Daniel Powter. Artistas que tiveram seu momento de glória e depois precisaram lidar com o rótulo cruel do “one-hit wonder”. Alguns seguiram na música, outros abandonaram os palcos para dar aulas, filosofar ou até programar para gigantes da tecnologia. Todos, no entanto, guardam bastidores surpreendentes, melancólicos e por vezes engraçados sobre o que significa ter vivido “o auge” por um breve instante. Em entrevista exclusiva para o portal Resenhando.com, Braulio Lorentz fala sobre a arqueologia do pop, entre hits inesquecíveis e trajetórias improváveis. Compre o livro "Baseado em Hits Reais", de Braulio Lorentz, neste link.
Resenhando.com - Você humaniza hits esquecidos com uma ternura provocativa. Mas o que você acha que a gente projeta neles - nostalgia, vergonha alheia ou aquele prazer proibido de quem canta “Barbie Girl” no chuveiro?
Braulio Lorentz - Eu concordo que a nostalgia tem um papel para querer cantar e querer saber mais sobre esses hits. Também entendo que muitos deles se encaixam naquilo que se chama de "guilty pleasure", ouvir com culpa. Mas eu, sinceramente, nunca tive disso. Sem querer pagar de diferentão, mas lembro que no meu aniversário de 14 anos um amigo me pergunto qual CD eu gostaria de ganhar e eu disse: “Middle of Nowhere” do Hanson ou “The Colour and the Shape” do Foo Fighters. Ele pensou que eu estivesse zoando e me deu o do Foo Fighters. Mas eu, claro, não estava. Então, a gente projeta um monte de coisa quando ouve, mas, no final, a gente só está em busca de boas canções e boas histórias.
Resenhando.com - Ao escutar tantos relatos de ascensão meteórica e quedas silenciosas, você se viu mais como jornalista, terapeuta ou cúmplice melancólico de um karaokê emocional?
Braulio Lorentz - Eu me senti terapeuta algumas vezes, principalmente nas entrevistas em que eu precisava ir entrando no assunto óbvio (o sumiço, a decadência comercial, as mágoas) aos poucos. Então, talvez em mais da metade dos casos, teve algum momento do papo que a pessoa do outro lado foi se soltando até assumir que, sim, guardava algum tipo de sentimento ambíguo relacionado ao sucesso.
Braulio Lorentz - Eu me senti terapeuta algumas vezes, principalmente nas entrevistas em que eu precisava ir entrando no assunto óbvio (o sumiço, a decadência comercial, as mágoas) aos poucos. Então, talvez em mais da metade dos casos, teve algum momento do papo que a pessoa do outro lado foi se soltando até assumir que, sim, guardava algum tipo de sentimento ambíguo relacionado ao sucesso.
Resenhando.com - Existe algo mais cruel do que o conceito de “one-hit wonder”? Por que a cultura pop tem essa obsessão sádica por canonizar um sucesso e enterrar o resto da discografia - mesmo quando ela é decente?
Braulio Lorentz - Eu gosto muito do resumo feito pelo Vinny, com o qual outros artistas concordam: para a maioria dos artistas, o natural é nunca ter um grande sucesso. Eles furaram a bolha, fizeram muito sucesso e veio um declínio comercial natural. Então, aquele período de sucesso absurdo tem que ser tratado com exceção. Acho que esse ciclo faz parte da música pop: é muito difícil se manter no topo e existe vida fora da parte mais alta das paradas.
Resenhando.com - Você ouviu mais de 40 músicas que foram chicletes - e sobreviveu para contar. Qual delas você nunca mais quer ouvir nem sob tortura midiática?
Braulio Lorentz - Eu consigo ouvir todas sem problema, porque passei a ter um apego por elas. Agora, elas fazem parte da trilha sonora do primeiro livro que eu lancei. Mas, obviamente, gosto mais de algumas do que de outras. Na minha opinião, KT Tunstall e Vanessa Carlton são cantoras muito subestimadas, por exemplo. Acho também que Snow Patrol e Cornershop são nomes mais alternativos do britpop pelos quais eu tenho muito carinho.
Resenhando.com - Dos entrevistados, quem mais surpreendeu: o filósofo, o programador da Amazon ou o artista que ainda insiste num comeback? Qual dessas reinvenções você achou mais tocante - e qual deu aquele nó na garganta?
Braulio Lorentz - Acho que o depoimento mais genuíno de uma pessoa que encontrou sua verdadeira vocação foi a do vocalista do EMF, o James Atkin. Ele fala com carinho do "Unbelievable", um hit número um do Hot 100 da Billboard americana, mas fala com mais carinho ainda dos alunos e alunas das classes de música no interior da Inglaterra. James é um cara muito good vibes e vê-lo sorrindo quando o comparei ao personagem do Jack Black em “Escola do Rock” foi um dos grandes momentos que estão no livro.
Braulio Lorentz - Acho que o depoimento mais genuíno de uma pessoa que encontrou sua verdadeira vocação foi a do vocalista do EMF, o James Atkin. Ele fala com carinho do "Unbelievable", um hit número um do Hot 100 da Billboard americana, mas fala com mais carinho ainda dos alunos e alunas das classes de música no interior da Inglaterra. James é um cara muito good vibes e vê-lo sorrindo quando o comparei ao personagem do Jack Black em “Escola do Rock” foi um dos grandes momentos que estão no livro.
Resenhando.com - Seu livro faz uma espécie de arqueologia pop. Qual foi o fóssil mais valioso que você desenterrou?
Braulio Lorentz - É meio bizarro constatar isso, mas a entrevista que me deu mais trabalho, das publicadas no livro, foi a de um cara que morava no Brasil: Evan Dando, o ex-galã grunge do Lemonheads. Embora tenha desmarcado nosso papo quatro vezes pelos mais variados motivos (falta de luz, lanche da tarde, sonolência, reunião com empresário), Dando foi simpático e atencioso.
Qual hit virou dinossauro sem esqueleto?
Braulio Lorentz - Acho que os dinossauros sem esqueleto foram as entrevistas que tentei marcar, mas sem sucesso. Para tentar falar com o Spin Doctors, por exemplo, mandei uma foto em que segurava meus quatro CDs da banda. Só que “problemas na agenda” me impediram de falar com eles. No primeiro capítulo do livro conto outros casos de entrevistas que eu não consegui fazer.
Braulio Lorentz - É meio bizarro constatar isso, mas a entrevista que me deu mais trabalho, das publicadas no livro, foi a de um cara que morava no Brasil: Evan Dando, o ex-galã grunge do Lemonheads. Embora tenha desmarcado nosso papo quatro vezes pelos mais variados motivos (falta de luz, lanche da tarde, sonolência, reunião com empresário), Dando foi simpático e atencioso.
Qual hit virou dinossauro sem esqueleto?
Braulio Lorentz - Acho que os dinossauros sem esqueleto foram as entrevistas que tentei marcar, mas sem sucesso. Para tentar falar com o Spin Doctors, por exemplo, mandei uma foto em que segurava meus quatro CDs da banda. Só que “problemas na agenda” me impediram de falar com eles. No primeiro capítulo do livro conto outros casos de entrevistas que eu não consegui fazer.
Resenhando.com - Existe uma verdade incômoda por trás de todo grande hit?
Braulio Lorentz - Não sei se existe. Alguns são apenas o retrato de uma época. “One Thousand Miles” representa quem a Vanessa Carlton era aos 16 anos: uma menina apaixonada que tinha um senso melódico excelente e tocava muito bem piano. No fim, os hits retratam uma fase bem específica do artista e é um baita desafio tentar dar novo sentido àquela velha canção todas as noites. Afinal, muita gente vai ou ia aos shows apenas para ouvir aquela música.
Braulio Lorentz - Não sei se existe. Alguns são apenas o retrato de uma época. “One Thousand Miles” representa quem a Vanessa Carlton era aos 16 anos: uma menina apaixonada que tinha um senso melódico excelente e tocava muito bem piano. No fim, os hits retratam uma fase bem específica do artista e é um baita desafio tentar dar novo sentido àquela velha canção todas as noites. Afinal, muita gente vai ou ia aos shows apenas para ouvir aquela música.
Resenhando.com - Se você fosse obrigado a montar um trio elétrico só com os artistas do livro, quem puxaria o bloco? E quem você deixaria na calçada segurando a pochete?
Braulio Lorentz - Não deixaria ninguém na calçada, coitados. Se chamasse para o carnaval, gostaria que estivessem nos holofotes. Acho que para um trio elétrico botaria todos os artistas do capítulo mais agitado do livro, dedicado ao dance pop (Ace of Base, Alexia, Aqua, t.A.T.u., DJ Bobo e Kasino). Tiraria apenas o Right Said Fred, porque eles são antivax e não quero que eles tenham chance de propagar doenças.
Braulio Lorentz - Não deixaria ninguém na calçada, coitados. Se chamasse para o carnaval, gostaria que estivessem nos holofotes. Acho que para um trio elétrico botaria todos os artistas do capítulo mais agitado do livro, dedicado ao dance pop (Ace of Base, Alexia, Aqua, t.A.T.u., DJ Bobo e Kasino). Tiraria apenas o Right Said Fred, porque eles são antivax e não quero que eles tenham chance de propagar doenças.
Resenhando.com - O livro tem trilha sonora. Mas se tivesse cheiro, qual seria? Aroma de CD novo? De mofo de sebo? De lágrimas de artista pós-fama?
Braulio Lorentz - Seria cheirinho de loja de encarte amarelado de CD. Aquele que está até meio rasgadinho de tanto tempo que você passou folheando e lendo as letras, vendo as fotos.
Braulio Lorentz - Seria cheirinho de loja de encarte amarelado de CD. Aquele que está até meio rasgadinho de tanto tempo que você passou folheando e lendo as letras, vendo as fotos.
Resenhando.com - No fundo, todo jornalista cultural quer escrever sobre o lado B do sucesso? A fama esquecida é mais literária do que a glória?
Braulio Lorentz - Acho que não. Muitos jornalistas preferem falar dos fenômenos pop mais recentes. Eu também me incluo nessa e gosto de explicar o que está rolando agora. Na minha opinião, existem boas histórias de bastidores em todas as épocas. O negócio é correr atrás para contá-las da melhor forma. De preferência falando com quem estava lá. Por isso, fiz questão de só incluir hits de artistas que falaram comigo.
Braulio Lorentz - Acho que não. Muitos jornalistas preferem falar dos fenômenos pop mais recentes. Eu também me incluo nessa e gosto de explicar o que está rolando agora. Na minha opinião, existem boas histórias de bastidores em todas as épocas. O negócio é correr atrás para contá-las da melhor forma. De preferência falando com quem estava lá. Por isso, fiz questão de só incluir hits de artistas que falaram comigo.
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