sábado, 22 de novembro de 2025

.: No musical "Titanique", Céline Dion assume o leme e vira furacão pop


Por 
Helder Moraes Miranda, jornalista e crítico de cultura, especial para o portal Resenhando.com
Foto: Caio Gallucci

Há algo deliciosamente profano em ver o mito do navio Titanic ser desmontado, reconfigurado e servido como um grande cabaré marítimo onde Céline Dion, diva absoluta do exagero emocional e dos hits românticos, transforma o naufrágio mais famoso do cinema em uma ópera pop de humor ácido, brilho extravagante e inteligência cênica. "Titanique - O Musical" zomba, com respeito, do clássico de James Cameron, para, paradoxalmente, homenageá-lo com mais amor do que reverência. 

Sob a direção lúcida e debochadamente precisa de Gustavo Barchilon, o espetáculo entende que o segredo do riso não está no pastelão gratuito, mas na consciência estética da própria precariedade. O exagero é método, o nonsense é linguagem e o camp é tratado como filosofia de palco. É besteirol? Sim. Mas do mais alto nível, como quem ri sabendo exatamente de onde vem a piada. Há glamour, deboche e genialidade.

No centro desse furacão pop está Alessandra Maestrini, simplesmente avassaladora como Céline Dion. Sua performance é um espetáculo dentro do espetáculo. Ela incorpora, ironiza e usa a potência vocal com precisão cirúrgica, sem jamais abandonar o timing cômico que a transforma em uma narradora tão divina quanto ridiculamente humana. Há elegância na caricatura dela, há humor sofisticado na diva que ela interpreta, e há classe até quando tudo parece desabar. É Céline Dion como você nunca viu e talvez como sempre imaginou, no fundo.

Ao seu lado, Giulia Nadruz constrói uma Rose que flutua entre a delicadeza romântica e uma ironia sutil absolutamente vital para o jogo cênico. A beleza delicada encontra na experiência brilhante do teatro musical uma camada extra de inteligência dramática. É uma Rose que sabe que está dentro de um delírio e se diverte com isso. Luis Lobianco, recém-saído da televisão como o controverso Freitas de "Vale Tudo", encontra nesse espetáculo outro campo fértil para o humor ferino. A Ruth de Lobianco é cruel, afetada e debochada na medida certa. Marcos Veras sustenta um Jack que talvez não seja o mais heroico, mas certamente é o mais autoconsciente. 

Musicalmente, "Titanique" passeia pelos grandes hits de Céline Dion com energia e irreverência - “My Heart Will Go On” está lá, em toda sua glória piegas e monumental - mas o espetáculo não se prende à nostalgia fácil. Pelo contrário: faz dela uma arma, uma piada, um gesto político queer que transforma o passado em festa, a tragédia em carnaval, o drama em delícia pop.

É impossível sair ileso. Não porque emociona apenas, mas porque desmonta a ideia de que o riso precisa ser raso. Aqui, rir é um ato sofisticado. É entender que a cultura pop também pensa, critica, ironiza e reinventa. O palco vira navio e nele o público se vê refletido na fome por exagero, por catarse, por um espetáculo que não pede desculpas por ser excessivo. "Titanique - O Musical" não afunda. Pelo contrário, ele boia, dança, desafia o iceberg do bom gosto conservador e transforma a tragédia em celebração. E se for para naufragar, que seja ao som de Céline Dion, com luzes, plumas e um público gargalhando em estado de puro êxtase.


"Titanique - O Musical" | Ficha técnica
Direção artística: Gustavo Barchilon 
Elenco: Alessandra Maestrini (Celine Dion), Marcos Veras (Jack), Giulia Nadruz (Rose), Luis Lobianco (Ruth - mãe da Rose), George Sauma (Carl), Wendell Bendelack (Victor Garber), Valéria Barcellos (Tina Turner), Talita Real (Molly Brown), Matheus Ribeiro (Marinheiro), Luiza Lapa, Marcos Lanza e Luan Carvalho.
Direção artística: Gustavo Barchilon
Direção de produção: Thiago Hofman
Direção musical | Arranjo | Orquestração: Thiago Gimenes 
Desenho de luz: Maneco Quinderé
Direção de movimento: Alonso Barros
Figurino: Theo Cochrane
Cenografia: Natália Lana
Visagismo: Feliciano San Roman
Design de som: João Baracho
Assistentes de direção: Talita Real e Gabi Camisotti

"Titanique - O Musical" | Serviço
Local: Teatro Sabesp Frei Caneca - Shopping Frei Caneca
Endereço: Rua Frei Caneca, nº 569 • 7° Piso I Consolação • São Paulo • SP
Temporada: 11 de outubro a 14 de dezembro de 2025
Sessões: Sábados às 17h e 20h e Domingos às 15h e 18h 
Duração: 110 minutos
Capacidade: 600 pessoas
Classificação indicativa: 12 anos 

Bilheteria do Teatro Sabesp Frei Caneca • Sem incidência de Taxa de Serviço
7º Piso do Shopping Frei Caneca
Rua Frei Caneca, nº 569 • 7° Piso I Consolação • São Paulo • SP
Horário de funcionamento: terça-feira a domingo, das 12h00 às 15h00, e das 16h00 às 19h00, e segunda-feira bilheteria fechada.

.: “Beetlejuice”: musical reafirma pacto com absurdo e encontra nova pulsação


Por 
Helder Moraes Miranda, jornalista e crítico de cultura, especial para o portal Resenhando.com

Se existe algo mais perigoso do que invocar Beetlejuice três vezes, é subestimar o poder de um elenco que entende o caos como linguagem e o grotesco como celebração. Na nova temporada paulistana, em cartaz até 30 de novembro no Teatro Liberdade, “Beetlejuice - O Musical” não apenas confirma o status de fenômeno premiado. O espetáculo se reinventa no detalhe, na troca de energia, no risco calculado de quem sabe que a morte - quando bem encenada - é uma forma superior de estar vivo.

Os críticos do portal Resenhando.com assistiram ao espetáculo com Fabrizio Gorziza, substituto de Eduardo Sterblitch, e o que poderia ser uma simples alternância transforma-se em afirmação artística. O Beetlejuice de Gorziza é menos caricatura e mais veneno cênico elegante: há um brilho perverso no olhar, um domínio vocal seguro e um timing cômico que beira o insolente. E ele não entra tímido nesse universo: chega como um mestre de cerimônias do além, confortável em sua irreverência e perigosamente magnético. Em cena, não sobra espaço vazio - tudo vibra sob a presença desse artista que sempre é outro a cada novo personagem.

E quando o espetáculo poderia se perder em sua própria grandiloquência visual, surge Pâmela Rossini como Lydia Deetz para lembrar que carisma não se fabrica, mas se sustenta. Com a bagagem de quem já foi Wandinha e Elphaba em musicais anteriores, Rossini imprime à personagem uma densidade rara: é gótica, sim, e nunca rasa. A voz dela é um acontecimento à parte - forte, expressiva, tecnicamente impecável - e a atuação dessa atriz cria um contraste delicioso entre melancolia e ironia. Lydia, nas mãos dela, é uma adolescente em luto que zomba da própria sombra. E brilha. Sempre.

Ivan Parente, como o fantasma Adam Maitland, é daqueles acertos que arrancam risos e aplausos sem esforço... aparente. Está impagável e lírico neste personagem. Há uma comicidade fina na composição dele, mas também um cuidado afetuoso que humaniza o absurdo de um homem que acabou de morrer e precisa assombrar a casa para afastar novos moradores. O talento dele irrompe em cena com naturalidade, como quem compreende que o humor mais inteligente não grita: seduz.

É importante sublinhar: “Beetlejuice - O Musical” não é um espetáculo para crianças. O texto brinca com duplos sentidos, palavrões e humor ácido - ainda bem. A obra respeita a própria inteligência e confia no espectador. Não higieniza o riso, não suaviza o grotesco, não pede desculpas pela ousadia. Pelo contrário: celebra e faz dela um manifesto festivo sobre a precariedade humana, sobre rir da morte para insistir na vida.

A direção de Tadeu Aguiar mantém a engrenagem afinada entre espetáculo visual e emoção sincera. Cenários, figurinos, luz entre o roxo e o verde e coreografias operam como um organismo pulsante que envolve a plateia numa estética de Tim Burton, que consagrou o personagem em duas produçoes cinematográficas, e não se limita à nostalgia: atualiza, provoca e expande. "Beetlejuice - O Musical” é sombrio, divertido, debochado e tecnicamente irrepreensível. Uma espécie de lembrete torto de que o teatro, quando se permite ser estranho, também se torna lendário. E que, às vezes, os mortos são muito mais interessantes do que os vivos.

Serviço
"Beetlejuice - O Musical"
Teatro Liberdade | Rua São Joaquim, 129 - Liberdade / São Paulo
Temporada: até dia 30 de novembro

Sessões
Quarta a sexta-feira, às 20h00 | Sábado, às 16h00 e às 21h00 | Domingo, às 16h00 às e às 20h30
*O elenco pode sofrer alterações sem prévio aviso.
Duração: 2h30m (com intervalo de 15m)
Classificação: 14 anos

Valores
Plateia Premium: R$350,00 (Inteira)  R$175,00 (Meia-entrada)
Plateia R$280,00 (Inteira)  R$140,00 (Meia-entrada)
Balcão A Visão Parcial: R$170,00 (Inteira)  R$85,00 (Meia-entrada)
Balcão A: R$240,00 (Inteira)  R$120,00 (Meia-entrada)
Balcão B : R$190,00 (Inteira)  R$95,00 (Meia-entrada)
Ingresso Popular*: R$42,36 (Inteira)  R$21,18 (Meia-entrada)
*Os ingressos populares são válidos em todos os setores, sujeito à disponibilidade

Vendas:
Internet (com taxa de conveniência): https://www.sympla.com.br/
Funcionamento de bilheteria física (sem taxa de conveniência)
Atendimento presencial: de terça à sábado das 13h00 às 19h00. Domingos e feriados apenas em dias de espetáculos até o início da apresentação.
Formas de pagamento: dinheiro, cartão de débito ou crédito.

.: Crítica: “Um Dia Muito Especial” revela o lado mais visceral de Gianecchini


Por 
Helder Moraes Miranda, jornalista e crítico de cultura, especial para o portal Resenhando.com
Foto: Priscila Prade

O que acontece quando Reynaldo Gianecchini e Maria Casadevall são colocados no mesmo palco, sob a direção sensível e precisa de Alexandre Reinecke, em plena Roma de 1938, com Mussolini e Hitler desfilando suas sombras ao fundo? A resposta é, de certa forma, simples e ao mesmo tempo devastadora: surge um teatro que lembra que a política, o amor e a humanidade não podem ser separados. “Um Dia Muito Especial” vai além da transposição de um clássico do cinema italiano para o palco brasileiro, é um ensaio sobre o que torna as pessoas vulneráveis e, ao mesmo tempo, extraordinárias. 

Maria Casadevall, no papel de Antonietta, dá vida a uma mulher submissa, esmagada pelo machismo e pela rotina doméstica, mas que consegue despertar afeto sem jamais se tornar apenas objeto de piedade. É impossível não se emocionar com cada gesto, cada pausa, cada olhar que ela entrega. É uma grande atriz que ficou conhecida na televisão em um momento impressionante da carreira, desta vez no teatro - lugar em que consegue elevar a arte dela a um patamar que beira o sagrado.

Gianecchini, por sua vez, está em um momento raro de visceralidade teatral. O Gabriele interpretado por ele, recém-demitido por ser homossexual, é alguém que faz o público confrontar os próprios preconceitos e, por vezes, a covardia. A química do ator com Maria Casadevall é elétrica, mas nunca óbvia. Eles conversam, trocam e, mais importante, tornam os espectadores cúmplices de um amor platônico que não precisa de cenas grandiosas para ser arrebatador. É. E ponto. 

Quando Gianechini berra em plenos pulmões, em uma cena tensa e ao mesmo tempo comovente, ele se coroa como ator de teatro, um lugar que sempre foi dele, mas que precisou ser conquistado e merecido. Essa consagração vai além do número de peças que ele vem apresentando desde que passou a ter autonomia para escolher os projetos que quer fazer, mas principalmente em relação às histórias que ele escolhe contar.

O espetáculo vai além do romance: desenha o fascismo, não com cartazes ou discursos, mas a partir da vida das pessoas comuns, dos pontos de vista conflitantes, das escolhas assumidas e das limitações apresentadas pelos personagens. É nessa tensão que o texto de Ettore Scola e Ruggero Maccari, traduzido por Célia Tolentino e adaptado por Reinecke, encontra seu respiro: cada diálogo é uma provocação.

Tecnicamente, a montagem é impecável. Marco Lima e Cesar Pivetti transformam o palco em um mosaico de intimidade e história, enquanto Dan Maia, com a trilha sonora, consegue fazer a música dialogar com a dor, a esperança e o absurdo da existência. A iluminação, o figurino e o design gráfico completam o quadro de maneira tão sutil quanto necessária: nada rouba a atenção do que realmente importa - a conexão entre os personagens e, por extensão, com o público. A atriz Carolina Stofella tem uma participação singela, mas marcante.

Nesse duelo de talentos, os espectadores têm a chance de sair do Teatro Sérgio Cardoso diferente de como entrou. Mais atento, mais sensível, mais inquieto. Dizem que a marca dos grandes espetáculos é transformar quem assiste a partir de uma boa história. “Um Dia Muito Especial” convida a sentir com urgência. Se você acredita que o teatro é apenas entretenimento, ou quer assistir a uma história de amor "levinha", prepare-se para se surpreender. Nesse espetáculo, a política, o amor e a coragem se entrelaçam de maneira tão natural que, durante a apresentação, é possível que os espectadores se sintam participantes de um diálogo impossível de ignorar.


Ficha técnica
"Um Dia Muito Especial" 
Autor: Ettore Scola e Ruggero Maccari
Tradução: Célia Tolentino
Adaptação: Alexandre Reinecke
Direção Geral: Alexandre Reinecke
Elenco: Reynaldo Gianecchini, Maria Casadevall, Carolina Stofella
Direção de Produção: Marcella Guttmann
Produção Executiva: Tatiane Zeitunlian
Assistência de Produção: Erica Paloma
Assistência de Direção: Carolina Stofella
Design Gráfico: Victória Andrade
Iluminação: Cesar Pivetti
Cenários: Marco Lima
Fotografia: Priscila Prade
Trilha Sonora: Dan Maia
Hair Stylist e Visagismo: Robson Souza
Makeup Artist: Beatriz Ramm 
Figurino Masculino: Ricardo Almeida
Figurinos Femininos: Debora Ceccatto
Assessoria de Imprensa: Pombo Correio
Operação de Luz: Rodrigo Pivetti 
Produtores associados: Reynaldo Gianecchini e Alexandre Reinecke
Realização: Reinecke Produções Culturais Ltda.


Serviço
"Um Dia Muito Especial"
Direção Alexandre Reinecke com Maria Casadevall e Reynaldo Gianecchini
Temporada: até dia 30 de novembro, sexta-feira, às 20h00; sábado, às 17h00 e às 20h00, e domingo, às 17h00
Ingressos entre R$ 70,00 e R$ 200,00 | Sympla
Duração: 90 minutos 
Classificação etária:10 anos 
Local: Teatro Sérgio Cardoso | Rua Rui Barbosa, 153 – Bela Vista, São Paulo/SP
Capacidade: 827 lugares
Bilheteria: Aberta nos dias de espetáculos, das 14h00 até o horário da atração.
Contato bilheteria: (11) 3288-0136

sexta-feira, 21 de novembro de 2025

.: Crítica musical: "Who Are You", a despedida de Keith Moon


Por
 Luiz Gomes Otero, jornalista e crítico cultural. Foto: divulgação

Lançado em 1978, o álbum "Who Are You" marcou o fim da formação original da banda The Who. Foi a última vez que o baterista Keith Moon gravou com a banda em estúdio. Recentemente foi lançada um box set especial do álbum, com uma série de faixas bônus. Em termos de sonoridade, "Who Are You" está abaixo de outros trabalhos feitos anteriormente, como os icônicos "Tommy",  "Who´s Next" e "Quadrophenia". Mas é preciso contextualizar o momento que a banda atravessava para entender isso.

O vocalista Roger Daltrey tinha problemas nas cordas vocais, enquanto que o baixista John Entwistle dava uma atenção maior ao seu trabalho paralelo solo. Por sua vez, o guitarrista Pete Townshend, principal compositor da banda, se sentia cada vez menos estimulado para criar novas composições, enquanto que o baterista Keith Moon era apenas uma sombra do que havia sido no passado.

Mas ainda assim há momentos bem interessantes, como a faixa título, que acabou sendo usada na trilha sonora oficial do seriado  americano CSI, apresentando o som da banda para as novas gerações. Poderia citar ainda "Sister Disco", "Trick Of The Light" e "Had Enough" como exemplos positivos.

Keith Moon faleceria em 7 de setembro de 1978, pouco antes do lançamento do álbum. Tinha apenas 32 anos e acabou tomando uma overdose acidental de medicamentos para controlar o seu vício em bebidas alcoólicas. A morte de Moon encerrou a fase mais criativa da banda, que até prosseguiu adiante com outros bateristas, mas que nem de longe lembravam o toque selvagem do integrante original.

 "Who Are You"

"Sister Disco"

"Trick Of The Light"

.: #VivoLendo: "Des Casulo", de Flávio Viegas Amoreira, a dica de Vieira Vivo


Por Vieira Vivo, escritor e ativista cultural.

"tanta querência
nesse silêncio de fonte"


Ao trilhar um difuso trajeto direcionado pelas palavras, os versos nos iluminam e guiam ao imprevisível. A surpresa sintetizada em versos que nos induzem ao inatingível, a uma suspensa e extrema comoção poética a flutuar numa atmosfera fluídica e misteriosa. Os entes, objetos deste instigante tabuleiro fonético, bailam em um ambiente movediço onde o alvo jamais revela-se em sua crua totalidade. Há sempre algo a ser descoberto, a ser desvendado. E essa contínua busca dissonante nos enreda em um minimalismo sonoro e intenso fruto de um complexo poder de síntese alicerçado pelo manejo minucioso da escrita: "essa sensação sideral de estarmos nus num aquário etéreo".

Jakobson define a poesia como a linguagem voltada para a sua própria materialidade, porém Flávio Viegas Amoreira em “Des Casulo”, publicado pela Editora Costelas Felinas, incorpora à esta tese a ressonância etérea das sensações incorpóreas a flutuar em devaneios atemporais e esquivos trazendo à tona o sumo das elucubrações utópicas das fantasias mais íntimas: "entre tentações tentaculares os gomos mais rígidos".

Nota-se, ainda, em cada verso uma sensualidade oculta qual um porvir eternamente ausente e distante, porém com uma determinada e concreta presença a emoldurar a dança das emoções cotidianamente. Se para Octavio Paz a poesia é o dizer que diz o indizível, para Viegas o indizível revela-se claridade em um labirinto de sensações profundamente germinadas em seu relicário interior: "há uma forma de poesia não pretérita esboçada no imprevisível horizonte".

Em “Des Casulo” somos, também, agraciados pelos faróis prefaciais de Luiz Rodrigues Corvo e de J. A. Garbino a nos conduzir ao cerne pulsante de cada micro poema. E após a leitura, temos a nítida sensação de termos presenciado ao desabrochar de recônditos alvéolos emocionais iluminados pelos cálidos raios de uma meticulosa depuração poética: "poema o que se escreve poesia o que se sente".

.: Quarta edição do Patfest homenageia a banda Leeds


Por Luiz Gomes Otero, jornalista e crítico cultural. Foto: divulgação

O Patfest chega à sua quarta edição no dia 26 de novembro, reunindo grandes artistas na Audio, em São Paulo, em uma noite marcada por celebrações, reencontros e homenagens. Entre os momentos mais aguardados está o tributo à memória de Renan Paiva - guitarrista, vocalista, compositor e fundador da banda Leeds ao lado de seu irmão Willian Paiva.

Willian subirá ao palco para reviver um dos capítulos mais intensos da trajetória dos irmãos: uma apresentação especial com uma música da Leeds, fazendo vibrar novamente a lendária Gibson Les Paul de Renan - agora como símbolo de uma história de arte, irmandade e sensibilidade.

Idealizado por Andreas Kisser, da banda Sepultura, e familiares, o Patfest nasceu em homenagem a Patrícia Kisser, falecida em 2022 em decorrência de um câncer de cólon. Desde então, o festival se tornou um evento de música, solidariedade e amor, reunindo artistas de diferentes estilos e gerações em apresentações únicas e emocionantes. Toda a renda arrecadada nesta edição será destinada às entidades Heliópolis Compassiva e Favela Compassiva Rocinha e Vidigal, que desenvolvem projetos sociais e humanitários em comunidades vulneráveis do Brasil.

"Nada na Vida É para Sempre (Leeds)"

quinta-feira, 20 de novembro de 2025

.: Crítica: "Wicked - Parte II" é sombria conclusão épica cheia de ação

 
"Wicked - Parte II", em cartaz na Cineflix Cinemas de Santos


Por: Mary Ellen Farias dos Santos, editora do Resenhando.com

Em novembro de 2025


A conclusão da épica história das bruxas de Oz acontece magistralmente em "Wicked - Parte II", com a química perfeita de Cynthia Erivo como Elphaba e Ariana Grande na pele de Glinda. O desfecho grandioso e comovente, com um visual de cenários e figurinos impecáveis, amarra as pontas soltas da trama paralela a do clássico "O Mágico de Oz". Assim, tudo é retomado durante a construção da estrada de tijolos amarelos. Pelo ar, no caminho para a Cidade das Esmeraldas, surge a demonizada Bruxa Má do Oeste dando o seu recado.

Enquanto Glinda reside na Cidade das Esmeraldas com o apoio do grande mágico, desfrutando de fama e poder como o símbolo da bondade (ainda sem qualquer poder mágico), e prestes a se casar com seu amado Fiyero, Elphaba mergulha no sombrio, vivendo exilada na remota floresta de Oz para escapar das autoridades da Cidade das Esmeraldas e continuar sua luta para expor a verdade sobre o Mágico. No entanto, até os moradores de Oz são embebidos de ódio contra a Bruxa verde, o que acaba unindo Elphaba e Glinda novamente.

A sequência do primeiro longa, "Wicked", que estreou nos cinemas há quase 1 ano, entrega um visual belíssimo e encantador, como por exemplo, na do casamento de Glinda e Fiyero, que são cenas de encher os olhos e perfeitamente cinematográficas. Muita ação e adrenalina ficam a cargo de uma Elphaba vingativa e muito sombria, mas que também tenta arrumar os erros alheios -e segue incompreendida. 

Numa dualidade mais latente, "Wicked - Parte II" retrata o poder da fama dada a um grande vilão bom de lábia (que pode até ter um laço sanguíneo), a força dos boatos, que mesmo sendo mentirosos, dificilmente são desfeitos, a verdadeira amizade entre personagens opostas capaz de superar até o amor pelo mesmo homem, mas acima de tudo, reflete a importância de aceitar as diferenças e crescer com o outro.

Assistir "Wicked - Parte II" na telona do cinema é um prazer que resgata o universo da magia tão bem trabalhada nos cinemas há mais de 20 anos com a saga Harry Potter, mas também entrega um visual de confrontos, que faz lembrar do épico "O Senhor dos Aneis", principalmente, nas sequências soturnas. É inegável que a história das bruxas agora encerrada já tem um lugar entre os clássicos filmes de fantasia. 

"Wicked - Parte II" pode não agradar a todos, pois não segue a linha da primeira produção em que é pautada nas rusgas que fortalecem o elo de amizade entre Elphaba e Glinda, logo há mais comédia e drama com magia. A segunda parte dos dois filmes dirigidos por Jon M. Chu entrega revelações fortes, embora muitas dicas tenham sido dadas, de modo discreto anteriormente. Em meio a muita ação, acaba pesando um pouco mais no drama. Tal qual acontece no espetáculo teatral, incluindo, a divisão que é exatamente igual, quando há um intervalo. No caso dos filmes, gerou uma divisão em duas partes e, para uma parcela do público, pode não justificar a necessidade de dois longas.

Não há como negar que "Wicked - Parte II" é poderoso, emociona e encanta. Fazendo valer cada centavo pago no ingresso de cinema, incluindo menção na cena final ao cartaz famoso do musical da Broadway. Mas também deixa claro que tudo em torno de "Wicked" é transformado em puro comércio, uma vez que ao longo dos anos, quando o livro de Gregory Maguire foi parar nos palcos, virando um fenômeno mundo afora. "Wicked - Parte II" é imperdível e, sem dúvida, para ser visto mais de uma vez na telona!


O Resenhando.com é parceiro da rede Cineflix Cinemas desde 2021. Para acompanhar as novidades da Cineflix mais perto de você, acesse a programação completa da sua cidade no app ou site a partir deste link. No litoral de São Paulo, as estreias dos filmes acontecem no Cineflix Santos, que fica no Miramar Shopping, à rua Euclides da Cunha, 21, no GonzagaConsulta de programação e compra de ingressos neste link: https://vendaonline.cineflix.com.br/cinema/SAN.

"Wicked - Parte II". (Wicked For Good). Direção: Jon M. Chu. Roteiro de Winnie Holzman e Dana Fox. Elenco: Cynthia Erivo, Ariana Grande, Jonathan Bailey, Jeff Goldblum. Duração: 2h 18 min. Gênero : Fantasia, musical. Distribuidora: Universal Pictures. Sinopse: Elphaba, agora conhecida como a Bruxa Má do Oeste, vive exilada na floresta de Oz, tentando revelar a verdade sobre o Mágico.

Trailer de "Wicked - Parte II"


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Thiago Sobral
é escritor. Também publica semanalmente no site Minha Arca Literária e no Instagram @thiago.sobral_

No princípio, havia o nada, e do nada, criou-se o tudo. Do tudo veio o todo e do todo fizeram-se as partes; ou das partes fez-se o todo, tanto faz. Digo isso porque aqui temos o princípio do que antes era o nada para mim. Devo confessar que esta é a primeira vez que me cedem uma coluna. Estou lisonjeado, encantado e um pouco tímido, mas não deixarei isso transparecer. Antes, fingirei costume e erguerei o nariz; deslizarei a pena, deitando ao papel palavras que se pretendem como um manual crônico para aqueles que tiverem a gentileza e a paciência de as ler.

Ainda que não lhe faça promessas, juro que trarei aqui palavras leves, mesmo que carreguem o peso do sentido. Não ofertarei reflexões profundas, embora, vez ou outra, possamos dar algum mergulho no reino das palavras. Não farei filosofia, mesmo quando quisermos saber o porquê. Não serei proselitista, ainda que, por vezes, queira convertê-lo ao verbum literário. Na verdade, meu capitão, pretendo oferecer um verdadeiro "Manual Crônico" da vida prática, a saber: a beleza escondida em um verso qualquer, o fiat lux de um movimento literário ou o sorriso banguela de um cãozinho de rua que tenha cruzado meu caminho. 

Sim, tudo isso pode vir a ser objeto do nosso "Manual Crônico" da vida prática, que lhe ofertarei em troca do módico valor de sua atenção. Esse é o meu devir. Talvez seja muito o que lhe peço, mas peço de coração. Se assim puder agir, prometo - sem jurar - retribuir-lhe com palavras de mentira e fingimento, pois não posso trair nossa divindade suprema, Fernando Pessoa (sou politeísta, confesso), que determinou que “o poeta é um fingidor”. Acolhi esse verso como um mandamento.

E por que deve você, meu capitão, dar-me fé e atenção? Digo sinceramente que não sei, mas desejo ardentemente que faça isso. Sou um modesto professor de Língua Portuguesa e Literatura, estudante de Filosofia, autor de romances e crônicas, que busca ardentemente o apodo de escritor. Se me leres, serei mais feliz. Se não, paciência - nem todo céu se dá ao homem, nem todo inferno se dá ao ser. E, quando um não quer, dois não brigam.

Como sou politeísta (sei que já disse isso e não quero amolar mais, mas sinto-me obrigado), rendo graças aos deuses editores deste nobre veículo que me cedem esse espaço, ainda que talvez paguem um preço alto por isso. Mas eles são pessoas de bom coração, e juro - sem prometer - que farei de tudo
para não decepcioná-los.

Como no princípio havia o nada, já agora temos alguma coisa, talvez uma parte de um todo que se pretende construir com crônicas, ensaios e artigos literários. E, se os deuses quiserem, permitirem e me inspirarem, alguma poesia, porque ninguém é de ferro. Espero alcançar tal intento. Por ora, é o que temos: a palavra se fez texto e esta coluna está entre nós. Eis o nosso "Manual Crônico".

quarta-feira, 19 de novembro de 2025

.: Cineflix traz "Wicked - Parte II", "Homo Argentum" e "Entre duas mulheres"

A unidade Cineflix Cinemas de Santos, localizada no Shopping Miramar, traz três estreias para as telonas. A aguardada sequência do universo de Oz, "Wicked - Parte II" e as comédias "Homo Argentum" e "Entre duas mulheres".

Seguem em cartaz o thriller eletrizante "Truque de mestre - O 3º ato", com elenco estelar que inclui Dave Franco, Isla Fisher, Morgan Freeman, Daniel Radcliffe, Ariana Greenblatt, Jesse Eisenberg, Mark Ruffalo, Rosamund Pike e Woody Harrelson, thriller dramático nacional "O Agente Secreto", cotado para o Oscar 2026 e estrelado por Wagner Moura, ao lado de Maria Fernanda Cândido, Gabriel Leone, além da cinebiografia "Mauricio de Sousa: O Filme".

Sábado, dia 13 de dezembro, haverá exibição do filme "Harry Potter e o Cálice de Fogo" em comemoração aos 20 anos, a venda dos ingressos estará aberta a partir de 27 de novembro. Você também pode antecipar os seus ingressos para a estreia de "Five nights at Freddy's 2".

A unidade de Cinemas Cineflix Santos, fica no Miramar Shopping, à rua Euclides da Cunha, 21, no Gonzaga.

"Wicked - Parte II"". (Wicked For Good). Direção: Jon M. Chu. Roteiro de Winnie Holzman e Dana Fox. Elenco: Cynthia Erivo, Ariana Grande, Jonathan Bailey, Jeff Goldblum. Duração: 2h 18 min. Gênero : Fantasia, musical. Distribuidora: Universal Pictures. Sinopse: Elphaba, agora conhecida como a Bruxa Má do Oeste, vive exilada na floresta de Oz, tentando revelar a verdade sobre o Mágico.

"Entre duas mulheres". (Deux femmes en or). Direção: Chloé Robichaud. Duração: 1h 40min. Roteiro: Catherine Léger, Elenco: Karine Gonthier-Hyndman, Laurence Leboeuf, Félix Moati, Mani Soleymanlou, Sophie Nelisse, Juliette Gariépy. Distribuição: Imovision. Sinopse: Violette enfrenta uma licença-maternidade difícil. Florence, uma depressão persistente. Mesmo com vidas estáveis, ambas se sentem fracassadas. Mas e se a felicidade estiver em romper expectativas?

"Homo Argentum". (Homo Argentum. Direção: Mariano Cohn e Gastón Duprat. Duração: 1h e 50min. Gênero: comédia. Distribuição: Disney. Sinopse: O filme é composto por 16 histórias curtas e independentes que formam uma crítica social sobre a realidade argentina.  

"Truque de mestre - O 3º ato". (Now You See Me: Now You Don't (ou Now You See Me 3). Gênero: Suspense, Ação, CrimeDireção: Ruben Fleischer. Roteiro: Seth Grahame-Smith, Eric Warren Singer.  Duração: (1h 52min). Sinopse: Os Quatro Cavaleiros estão de volta com uma nova geração de ilusionistas e uma trama cheia de reviravoltas, mágicas e surpresas, em um truque que envolve uma joia valiosa do mundo. Eles se reúnem para derrubar uma empresa corrupta que lava dinheiro para criminosos.


"O Agente Secreto". Gênero: thriller, drama. Diretor: Kleber Mendonça Filho. Elenco: Wagner Moura, ao lado de Maria Fernanda Cândido, Gabriel Leone. Sinopse: Em 1977, Marcelo trabalha como professor especializado em tecnologia. Ele decide fugir de seu passado violento e misterioso se mudando de São Paulo para Recife com a intenção de recomeçar sua vida. Marcelo chega na capital pernambucana em plena semana do Carnaval e percebe que atraiu para si todo o caos do qual ele sempre quis fugir. Para piorar a situação, ele começa a ser espionado pelos vizinhos. Inesperadamente, a cidade que ele acreditou que o acolheria ficou longe de ser o seu refúgio.

"Mauricio de Sousa: O Filme". Gênero: cinebiografia. Diretor: Pedro Vasconcelos. Elenco: Mauro Sousa, Diego Lamar. Sinopse: A infância de Mauricio, sua paixão por quadrinhos, a invenção de uma carreira em um momento em que era considerada improvável e a criação de seus personagens icônicos. a produção sobre o quadrinista mais importante do Brasil, traça os primeiros passos que tornaram realidade o seu sonho de se tornar desenhista. Criador de Turma da Mônica, a trama traz um olhar pessoal e sensível para a vida de um artista e das referências que o formaram. Da descoberta e paixão pelos quadrinhos à construção de uma carreira considerada impossível na época, a coragem de Mauricio de Sousa em sustentar suas ideias, histórias e personagens.


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terça-feira, 18 de novembro de 2025

.: Entrevista: Eric Nepomuceno, tradutor brasileiro de Gabriel García Márquez

Por Helder Moraes Miranda, jornalista e crítico de cultura, especial para o portal Resenhando.comFoto: Paula Johas

Eric Nepomuceno pertence à categoria dos tradutores que vão além das palavras, ele decifra mundos. Ao transportar a linguagem de um idioma para outro, ele também tem o dom de preservar todas as nuances de um texto, como a musicalidade, a sombra e a memória de um autor. Amigo íntimo de Gabriel García Márquez por quase quatro décadas, ele testemunhou de perto não apenas a construção literária de "Cem Anos de Solidão", mas o homem por trás de Macondo, os rituais, as manias, o humor e a personalidade do grande mestre. 

Agora, com a nova edição ilustrada do romance - que chega ao Brasil publicado pela Editora Record acompanhada das imagens vibrantes de Luisa Rivera -, Nepomuceno revisita a obra-prima que o acompanha desde sempre e reflete sobre o gesto de traduzir um universo tão musical quanto indomável. Nesta entrevista exclusiva para o portal Resenhando.com, ele fala sobre a amizade com Gabo, das escolhas que se fazem entre uma língua e outra, da resistência em ver os Buendía desenhados e da música secreta que só é possível ouvir quando se lê devagar. Um encontro raro com um dos maiores intérpretes literários das Américas. Compre a edição ilustrada de "Cem Anos de Solidão" neste link.


Resenhando.com - A nova edição de "Cem Anos de Solidão" apresenta ilustrações inéditas da artista chilena Luisa Rivera. Como o senhor percebe o diálogo entre texto e imagem nessa edição? As ilustrações influenciam de alguma forma a leitura do romance?
Eric Nepomuceno - Primeiro quero elogiar o trabalho da Luisa Rivera, que é uma desenhista extremamente talentosa. E suas ilustrações influenciam, claro, a leitura. Por isso García Márquez jamais permitiu que seus personagens fossem desenhados e recusou milhões e milhões de dólares para que "Cem Anos..." fosse levado ao cinema. Queria que cada leitor tivesse o seu Aureliano Buendía pessoal, cada personagem só dele. Depois que García Márquez cometeu a cruel imprudência de partir na viagem sem volta, os filhos autorizaram tudo. Não vi os filmes, passei os olhos por poquíssimas ilustrações justamente para continuar tendo meu Buendía pessoal, todos os meus personagens pessoais, e manter a fidelidade que me uniu a García Márquez por quase 40 anos de amizade.


Resenhando.com - O senhor traduziu obras de García Márquez ao longo de décadas. Como foi construir, ao longo do tempo, uma intimidade literária com o autor? Em que ponto o tradutor passa a “respirar” junto com o texto do escritor?
Eric Nepomuceno - Eu digo sempre que não sou e nunca fui tradutor profissional. Traduzo os amigos , além de duas ou três exceções que tinham especial interesse para mim. E digo que minha função é passar para o meu idioma o que o autor passou no dele: a mesma respiração, o mesmo ritmo, a mesma melodia, as mesmas pausas... Repito sempre que o melhor prêmio que recebi ao longo da vida não foram os Jabutis. Foi ouvir que nem parece tradução...


Resenhando.com - Muitos leitores de "Cem Anos de Solidão" dizem que o romance tem um ritmo próprio, quase musical. Como o senhor traduz ritmo, cadência e silêncio - elementos tão importantes na prosa de García Márquez? 
Eric Nepomuceno - Ora, mil perdões, mas a resposta está na pergunta: ritmo é ritmo, como na partitura musical. Cadência é cadência, no andamento da melodia. E silêncio é silêncio... Se a literatura de outro mestre de mestres, Ernest Hemingway, é mais silenciosa, a de García Márquez é extremamente musical... Ele traz o Caribe para a escrita, com todo o seu balançar e a sua melodia, ora alegre, ora melancólica...


Resenhando.com - Quando o senhor traduz, pensa no leitor brasileiro ou tenta manter a atmosfera original para que o leitor “viaje” até Macondo? 
Eric Nepomuceno - Sim, penso no leitor brasileiro, com certeza. E repito, mil perdões pela repetição...: minha função é trazer o livro para o português falado no Brasil. Daí manter a atmosfera e levar o leitor até Macondo e apresentar a ele os personagens, para que cada leitor crie a sua própria imagem. Daí minha resistência a ver o livro ilustrado. Vi apenas as primeiras, para confirmar que a Luisa não é propriamente uma ilustradora, é uma ótima desenhista.


Resenhando.com - O vocabulário latino-americano é riquíssimo e, às vezes, intraduzível. Há alguma palavra ou expressão de García Márquez que o senhor tenha lutado para encontrar uma equivalência em português?
Eric Nepomuceno - Nada é intraduzível. É sempre possível encontrar a tradução correta, com o mesmo peso, a mesma melodia, a mesma pausa. Não me lembro de nenhuma palavra ou expressão que tenha sido especialmente difícil. Repito: o importante é encontrar o ritmo, a melodia, as pausas...


Resenhando.com - Além de tradutor, o senhor é escritor e jornalista. Essas três funções conversam entre si ou entram em conflito quando está traduzindo?
Eric Nepomuceno
 - Eu só sei fazer duas coisas na vida, cozinhar e escrever. Como nunca fui convidado para assumir um restaurante, só me restou viver do ofício de escrever. Não, nunca há conflito, é só uma das três vertentes do meu ofício...


Resenhando.com - Seu trabalho como correspondente e jornalista investigativo o levou a cobrir momentos históricos e tensos, como o período das ditaduras latino-americanas. Essa vivência interferiu na sua forma de ler e traduzir a literatura do continente? 
Eric Nepomuceno
 - Mais que só ditaduras, cobri guerras civis especialmente sanguinárias, especialmente na América Central. Sua pergunta é boa, mas serei honesto na resposta: nunca pensei nisso. Interferiu, com certeza, na minha forma de ver a vida e o mundo... 


Resenhando.com - O senhor costuma dizer que traduzir é “escutar o texto”. O que "Cem Anos de Solidão" diz quando ninguém está ouvindo? 
Eric Nepomuceno
 - O que pretendo dizer é justamente o que disse agora há poco: para mim, literatura é música. Tem ritmo, tem harmonia, tem linha melódica, tem pausar... Não posso dizer aqui o que ouço quando leio e releio "Cem Anos...". Que cada leitor ouça do seu jeito...

Resenhando.com - García Márquez afirmava que todo escritor escreve sempre o mesmo livro - e o dele seria “o livro da solidão”. Qual é o livro que o senhor, como tradutor e escritor, tem escrito ao longo da vida?
Eric Nepomuceno
 - Eu, além de traduzir, escrevo contos e livros de não-ficção, livros jornalísticos. Vou dizer o que sinto neste exato instante, que pode mudar amanhã... De não ficção, "A Memória de Todos Nós", que conta de vítimas das ditaduras instaladas na América do Sul entre 1964 e 2020. E de contos, fico na dúvida entre "A Palavra Nunca" e "Quarenta Dólares e Outras Histórias".

.: "A Sabedoria dos Pais" reúne Natália do Vale e Herson Capri no teatro


Comédia romântica, que estreia no dia 26 de fevereiro, no Teatro Bradesco, marca o retorno da atriz aos palcos, após 23 anos, e o reencontro em cena com Herson. Fotos: Nana Moraes

Amigos de longa data, os atores Natália do Vale e Herson Capri celebram 50 anos de carreira em 2025 com o espetáculo "A Sabedoria dos Pais", de Miguel Falabella, escrito especialmente para a dupla. Depois de 23 anos, Natália volta aos palcos, seu último trabalho no teatro foi Capitanias Hereditárias, também de Falabella, em 2002, e reencontra Herson, com quem contracenou na novela "Em Família", de Manoel Carlos, em 2014. Após estreia no Rio de Janeiro, a montagem chega a São Paulo para temporada no Teatro Bradesco, de 26 de fevereiro a 21 de março, com sessões de quinta a sábado às 20h00 e aos domingos, às 19h00.

“Durante grande parte da minha carreira, eu sempre fiz teatro e televisão ao mesmo tempo. Mas, nos últimos anos, eu não queria mais fazer desta forma. E agora eu posso me dedicar mais ao teatro, como não estou fazendo TV, e ter uma parte da minha vida dedicada ao palco. Esse projeto nosso, com Miguel, é antigo. Fizemos irmãos numa novela ("O Outro", de 1987). E viramos irmãos. Nosso afeto vem de mais de 30 anos”, explica Natália, sobre as mais de duas décadas longe do tablado. 

Este é o terceiro trabalho da atriz com Herson. Eles atuaram juntos na novela "Negócio da China", de 2009, escrita por Miguel. “Eu e Natália nos damos muito bem em cena. Começamos as leituras na casa dela. Natália é gentil e acolhedora, temos uma ótima conexão, e com o Miguel também. Os ensaios foram muito alegres, estou feliz em fazer um texto inédito dele", entrega Herson. Dirigida por Falabella, a montagem aborda recomeços, amadurecimento e as possibilidades do amor depois de uma vida inteira compartilhada. 

A história narra a trajetória de um casal que, após 35 anos de um casamento aparentemente perfeito, decide se separar. Nos dez anos que se seguem, cada um busca novos caminhos, novas experiências. Um aprende a viver sem o outro, ambos guiados pelas lembranças e ensinamentos de seus pais, que tiveram casamentos duradouros.

Neste processo, enquanto tentam construir novas vidas, eles seguem movidos pela esperança e, com humor e delicadeza, percorrem temas como etarismo, reinvenção pessoal e a continuidade da vida afetiva na maturidade. O espetáculo é atravessado por afeto, cumplicidade e verdade, celebrando os encontros e desencontros da vida a dois e a eterna busca pelo sentido das relações humanas. O histórico reencontro em cena de Natália do Vale e Herson Capri vai brindar o público com uma experiência sensível, divertida e inesquecível, sob a batuta de Miguel Falabella.  


"A Sabedoria dos Pais" | Ficha técnica
Texto e Direção: Miguel Falabella. Elenco: Natália do Vale e Herson Capri. Assistente de direção: Edwin Luisi. Cenário: Turíbio e Zezinho Santos Arquitetura. Luz: Paulo César Medeiros. Trilha Sonora: Leandro Lapagesse. Vídeo: Richard Luiz. Figurino: Marco Pacheco e Jemima Tuany. Assistente de Produção: Pillar Paiva. Assessoria de Comunicação: Adriana Balsanelli e Renato Fernandes. Produção executiva: Robert Litig. Direção de Produção: Theo Falabella.
 

"A Sabedoria dos Pais" | Serviço
Estreia dia 26 de fevereiro de 2026.
Temporada: de 26 de fevereiro a 21 de março - Quinta a sábado, às 20h00. Domingo, às 19h00.
Ingressos a partir de R$ 50,00
Duração: 90 minutos.
Classificação etária: 12 anos
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