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domingo, 21 de julho de 2024

.: Entrevista com Adriano Dolph, autor do livro "Fevereiro em Chamas"


"Durante anos uma lenda urbana foi divulgada até por veículos jornalísticos, de que teriam sido encontradas em um elevador, e que os corpos estavam carbonizados. Isso nunca ocorreu", comenta Adriano Dolph em entrevista exclusiva para o portal Resenhando.com.

Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

O livro “Fevereiro em Chamas” (compre neste link), do jornalista Adriano Dolph, é dramático e revelador, O autor percorre um longo caminho relembrando as três tragédias que abalaram o Brasil no mês de fevereiro: edifícios Joelma, Grande Avenida e Andraus. Com uma abordagem humana, sensível e jornalística, mostra a dor de familiares; ecos, cicatrizes e consequências dos incêndios. A partir daí, ele conta histórias de força e persistência. Dolph conduziu uma grande investigação sobre o tema, percorrendo arquivos de fóruns, jornais, corporações e até da ditadura militar.

Devido à abordagem documental, a obra literária ganhou uma segunda fase, agora em formato de audiovisual em um canal na internet. O documentário apresentado em série traz uma abordagem ampla e que abre espaço para novos registros, agora em audiovisual vídeos inéditos. “Fevereiro em Chamas” também está disponível no YouTube  (@fevereiroemchamas) e também no Spotify - Edifício Joelma - 50 anos em busca da verdade.

Nascido em 1975 em São Paulo, Adriano Dolph, é jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero, com Pós-Graduação em Comunicação. A Iniciou em 2004 uma série de pesquisas e entrevistas para o livro “Fevereiro em Chamas”, contribuindo também para um trabalho acadêmico sobre narrativas midiáticas e opinião pública na cobertura dos incêndios do Edifício Joelma e da Boate Kiss. Atualmente, atua como comentarista esportivo na plataforma Brasileirão Play, além de ser apresentador, criador de conteúdo digital e mestre de cerimônias.


Resenhando.com - O que motivou você a escrever o livro "Fevereiro em Chamas"?
Adriano Dolph - Este assunto dos grandes incêndios na cidade de São Paulo sempre me chamou a atenção. Ainda jovem, buscava referências e textos, informações específicas sobre o tema, e era muito difícil encontrar reportagens apuradas e checadas. Como exemplo, cito a questão das 13 vítimas não identificadas que foram sepultadas no cemitério São Pedro. Ou então a questão dos réus que foram julgados. Resolvi arregaçar as mangas e correr atrás das informações. Foram 15 anos de trabalho checando mais de 10 mil páginas de documentos, fotos e arquivos.

Resenhando.com - Em que as tragédias do Edifício Joelma, Grande Avenida e Andraus - e também a tragédia da Boate Kiss, podem dizer a respeito da segurança contra incêndios e nas políticas públicas do Brasil?
Adriano Dolph - 
Importante salientar que nos incêndios do Andraus e Joelma, ainda estava em vigência um Código de Obras datada da década de 1930, ou seja, muito obsolete e que não atendia as demandas do crescimento vertical de uma cidade como São Paulo. Em 1972, por exemplo, não existiam noções de brigada de incêndio e primeiro combate ao fogo nas edificações, o que era um total absurdo para um prédio como o Andraus, com mais de 25 andares. Em 1981 ocorreu o segundo incêndio no Edifício Grande Avenida, onde foram constatadas diversas irregularidades nas obras de reconstrução após o primeiro incêndio, em 1969. Dezessete pessoas perderam a vida em decorrência, justamente, da falta de uma escadas com isolamento para o fogo. Mesmo neste século presenciamos diversas tragédias do relacionadas ao fogo, como na Boate Kiss. Todas tem como coincidência alguns pontos: o desleixo das autoridades ao fiscalizar edificações, ao exigir o cumprimento das regras e da lei. E a imperícia de funcionários ou responsáveis.

Resenhando.com - Essas tragédias poderiam ser evitadas - ou você acredita no poder imutável do destino?
Adriano Dolph - 
Em termos técnicos, de fiscalização e prevenção, com toda certeza. Infelizmente o Poder Público falhou, e obviamente, os responsáveis pelos edifícios, ao designar pessoas inabilitadas para desempenhar funções que exigiam conhecimento prévio.


Resenhando.com - Qual das tragédias pesquisadas por você o impactou mais?
Adriano Dolph - Todas tiveram um impacto muito forte, pois em todos os incêndios ocorreram histórias de dor e sofrimento. Mas é inegável que o incêndio do Edifício Joelma ocorre um impacto maior, especialmente pelo número de perdas elevado, e pela dimensão das imagens, fotos e videos.

 
O que podemos aprender a respeito sobre essas tragédias nacionais e o que fazer para evitá-las?
Adriano Dolph - 
Onde há prevenção, treinamento, e fiscalização, as chances de ocorrerem um grande incêndio diminuem consideravelmente. Seja o Poder Público, seja os responsáveis pelas edificações, fica a lição de que o desleixo pelas normas e regras pôde significar em uma grande tragédia.

 
Realizar as pesquisas para três tragédias arrebatadoras demanda tempo. Quando percebeu que era a hora de parar de pesquisar para começar a escrever o livro?
Adriano Dolph - O livro foi escrito e publicado, mas ainda há outras histórias sendo apuradas e checadas para uma futura edição revisada, ou um novo livro sobre o edifício Joelma. No caso de "Fevereiro em Chamas", o timing foi o marco dos 50 anos do incêndio do edifício Andraus. Costumo falar que o jornalista nunca deve parar de pesquisar e apurar. Essa é a função da profissão.

 
Na investigação sobre o tema, você percorreu arquivos de fóruns, jornais, corporações e até da Ditadura Militar. Como a ditadura militar pôde ajudar a contar essa história?
Adriano Dolph - 
Os três incêndios ocorreram em um período de perseguição a opositores, onde foram cassados direitos políticos, e havia restrição do que poderia ser ou não publicado. E obviamente tive muita atenção desse contexto em relação aos eventos. Na produção do livro descobri documentos sigilosos de que todos os incêndios chegaram a ser investigados como atentados subversivos, sem que nada tenha sido provado. Pessoas foram conduzidas a delegacias e órgãos repressores para depoimentos. Mas ainda há muito a ser desvendado especialmente no incêndio do edifício Joelma.

 
Há alguma informação que encontrou, durante as pesquisas, que o surpreendeu?
Adriano Dolph - 
A informação mais importante foi em relação aos 13 corpos não identificados que foram enterrados em Vila Alpina. Durante anos uma lenda urbana foi divulgada até por veículos jornalísticos, de que teriam sido encontradas em um elevador, e que os corpos estavam carbonizados. Isso nunca ocorreu. Através de uma intensa apuração e pesquisa, descobrir que estas pessoas faleceram em circunstâncias, dias e locais absolutamente diferentes. Jamais foram encontradas em tal elevador. E no livro apresento todos estes dados, com dez possíveis nomes destas pessoas.

 
Você lidou com um tema muito pesado. Logo, essas pesquisas mexeram emocionalmente com você? 
Adriano Dolph - É impossível em todo o processo não se emocionar. Obviamente, trabalhando na apuração, checagem, entrevistando, escrevendo, procurei sempre me distanciar para ser o mais neutro e imparcial possível. Mas em diversos momentos me emocionei. A dor de quem passou por uma tragédia destas é gigantesca. E todo contexto de arquivos, fotos e relatos é muito doloroso.

 
O que a série documental derivada de "Fevereiro em Chamas" complementa o livro, e o que há no livro que não tem na série?
Adriano Dolph - A série contextualiza o livro. Traz imagens inéditas que foram garimpadas nas redes sociais e na internet. E está sempre em apuração e checagem de novas informações. Por isso, considero que seja a primeira websserie de cunho jornalístico, com apuração e checagem, sem o ranço do sensacionalismo e das lendas urbanas.



.: Karine Asth conta detalhes sobre a escrita de "Dentro do Nosso Silêncio"


"S
into que o romance não existe sem a complexidade do ser humano", afirma escritora Karine Ash sobre "Dentro do Nosso Silêncio". Romance publicado pela editora Bestiário mergulha nas emoções intensas de um casal em busca da maternidade e da superação do trauma. Foto: Lucas Soares

No emaranhado de desafios e expectativas que envolvem o caminho para a maternidade, o livro "Dentro do Nosso Silêncio" (compre o livro neste link), lançado pela editora Bestiário, emerge como uma obra marcante, conduzida pela sensibilidade da escritora Karine Asth. Vencedor do Prêmio Jabuti de 2023 na categoria Romance de Entretenimento, o seu primeiro livro narra, através da história de Ana e Samuel, os pormenores emocionais daqueles que se autodenominam tentantes, pessoas que estão em busca do sonho da maternidade. 

"Dentro do Nosso Silêncio" lança luz sobre a dolorosa jornada enfrentada por casais que anseiam pela chegada de um filho, explorando cada reviravolta do processo com uma sinceridade tocante. Desde o primeiro teste negativo até as técnicas mais avançadas para a concepção, os leitores são levados a uma montanha-russa de emoções, onde cada página revela uma nova camada da experiência humana. Nesta entrevista, Karine Asth nos conduz pelos bastidores de sua obra, compartilhando seu processo criativo e o impacto da escrita em sua vida. 


Se você pudesse resumir os temas centrais do livro, quais seriam?
Karine Asth - Os principais temas são o processo de tentar engravidar, o sonho da maternidade, a falta de controle sobre algumas escolhas, a frustração e os recomeços.


O que te motivou a escrever o livro?
Karine Asth - Eu havia passado recentemente pelo processo de tentante. Quando decidi escrever um livro, esse tema ainda estava muito forte na minha vida. Eu precisava falar sobre isso. O processo se deu por meio da escrita e reescrita. Sempre lapidando o texto. Em determinado momento, entendi que muitas vezes menos é mais e, por isso, exclui alguns capítulos inteiros. Por entender, que deixaria a minha narrativa mais forte. Criei uma rotina, e através dela procurei manter a disciplina e o foco, o que me ajudou muito. O processo de escrever o livro durou em torno de dois anos. Depois passei seis meses revisando meu texto. Só então o submeti à leitura crítica e revisão. 


Em sua análise, quais as principais mensagens que podem ser transmitidas pelo livro?
Karine Asth - Acho que o livro pode impactar de duas formas diferentes. Àqueles que nunca tiveram dificuldade para engravidar, gera uma reflexão sobre o quanto é errado e inconveniente a pressão da sociedade sobre os casais para que tenham filhos. Sem respeitar o tempo ou a vontade mesmo do casal. E àqueles que passaram por esse processo, gera uma identificação com a história. 


Por que escolher o gênero adotado? 
Karine Asth - Porque meu desejo era ser escritora de romances ou novelas. Escrevo contos também, mas o que mais me motiva são as histórias longas, cheias de complexidade. Não que o conto não possa ser complexo, mas sinto que o romance não existe sem a complexidade do ser humano. 


O que esse livro representa para você? Você acredita que a escrita do livro te transformou de alguma forma? 
Karine Asth - Esse livro representa a maior decisão na minha vida, que foi me dedicar à escrita e poder dizer que eu sou uma escritora. Não porque ganhei o prêmio ou porque tenho um livro publicado, mas porque foi a partir dele que tudo começou pra mim. Com certeza esse livro me transformou de alguma forma sim. Passei a me sentir mais completa e mais feliz com o que faço. 


Quais são as suas principais influências artísticas e literárias? Quais influenciaram diretamente a obra?
Karine Asth - Tenho grande admiração pela escrita da Carol Bensimon e a do Ian McEwan. Pelo tema que escolhi, não tive influência de nenhuma outra obra. Mas pela escrita em si, volta e meia eu recorria ao livro de ambos para reler algum trecho que se assemelhava com o que eu gostaria de fazer.


Como você definiria seu estilo de escrita? Que tipo de estrutura você adotou ao escrever a obra?
Karine Asth - Acho que meu estilo é de uma escrita mais simples e direta. A estrutura do livro foi através de capítulos alternados entre presente e passado com a narração essencialmente da Ana. Em dois ou três capítulos, dei voz ao Samuel. 


Você escreve desde quando? Como começou a escrever?
Karine Asth - Desde os meus 11 anos, eu costumava escrever cartas. Poucos anos depois, comecei a escrever em diários. A escrita de contos e do romance veio só há poucos anos, quando entrei pela primeira vez numa oficina de escrita com Raimundo Carrero. 


Você tem algum ritual de preparação para a escrita? 
Karine Asth - Posso dizer que meu único ritual é ouvir música enquanto escrevo. Geralmente escuto instrumental. Comecei a ouvir Ludovico Einaudi e ele passou a ser essencialmente minha playlist. Não costumo colocar metas. Posso escrever dois parágrafos ou um capítulo inteiro.


Quais são os seus projetos atuais de escrita? O que vem por aí?
Karine Asth - O projeto do meu segundo romance está pronto. Na verdade, estava definindo ainda alguns detalhes em torno de personagens e história. E agora pretendo me dedicar essencialmente a este projeto.

.: Giuliano Andreoli pela fantasia latino-americana: autor desconstrói narrativa


"Se J.R.R. Tolkien tivesse sido brasileiro, “O Senhor dos Anéis” não contaria com os elementos presentes no livro", afirma Giuliano Andreoli. Escritor de "Crônicas de Ruamu: O Destino de Eneim", Giuliano Andreoli debate sobre temas comuns à população da América do Sul, como escravidão, colonização e ditaduras. Foto: divulgação / Fabio Zambom


Talvez você esteja acostumado a livros de alta fantasia com reinos longínquos e brigas pelo trono porque, de fato, são temas importantes para a população europeia. Mas o que Giuliano Andreoli propõe em "Crônicas de Ruamu: o Destino de Eneim" (compre neste link) é a aproximação dos leitores latino-americanos de seus próprios contextos de vida. Na obra, não existem conflitos para definir quem vai ter a coroa, mas questões como escravidão, colonização, racismo, tensões políticas e ditaduras, - tudo isso em um continente multirracial -, são alguns dos assuntos abordados pelo autor entre as páginas do livro.

Para o escritor e professor universitário, o processo de colonização internalizou a ideia de que o hemisfério Sul, mais especificamente a América e a África, era lar de povos sem cultura antes da chegada dos europeus. “Eu creio que isso tem a ver com o fato de muitas vezes não olharmos para o nosso passado, a nossa mitologia e a nossa cultura como uma fonte também fértil para criarmos histórias de ficção”, explica o autor. 

Giuliano Andreoli é professor universitário, mestre em Educação e doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Especialista em Pedagogias do Corpo, tem uma formação multiartística nas áreas da dança, teatro, circo e artes marciais. É também pesquisador dessas artes em intersecção com a Educação, e possui diversas publicações de artigos em periódicos científicos na área dos estudos socioculturais.

Na literatura assina o livro “Dança, Gênero e Sexualidade: narrativas e Performances” (2019), pela editora Apris. Na área de ficção, publicou os contos “Os Espíritos do Deserto”, na Antologia “Guardião das Areias” (2023), e “Wendigo”, na Antologia “Sangue e Prata” (2024), ambos pela editora Medusa. Publicou ainda “Horror Noturno”, na Antologia “Chamado das Sombras” (2024), pela editora Dark Books. Nesta entrevista, confira mais reflexões sobre a importância da descentralização de narrativas e da busca por uma identidade latino-americana na literatura.


“Crônicas de Ruamu: O Destino de Eneim” constrói uma fantasia com elementos das mitologias de culturas latino-americanas. Que mitos você abordou com mais profundidade na obra?
Giuliano Andreoli - 
A história não é diretamente sobre os povos indígenas, mas sobre um continente multirracial (como o Brasil), com alguns povos de origem estrangeira e outros nativos, alguns vivendo em grandes cidades e outros em contato com a natureza. Mas a cultura indígena, sobretudo a tupi-guarani, foi a referência para alguns desses povos, com os quais os povos que vivem nas grandes cidades têm que lidar. Assim, primeiramente, o leitor perceberá referências aos mitos das cidades perdidas da Amazônia, que foram uma invenção dos colonizadores espanhóis e portugueses, vistas como fontes de grandes tesouros, mas que, nesta obra, são nações tecnologicamente avançadas que existiram no passado. Primeiramente, os nomes de algumas nações (Eneim, Manoa, Paititi, etc) foram inspirados nos nomes dados ao Eldorado, que eram nomes que os colonizadores tomaram de certas nações indígenas reais. Em segundo, a mitologia indígena aparece na figura dos Kurupis (derivado de Curupira), dos Quinametzins e dos Tupãs, que, na obra, são raças não-humanas, de grande sabedoria e poder, já dadas como extintas, mas cujos remanescentes ainda vivem nas florestas e nas matas.


Para você, qual a importância de aproximar a literatura fantástica dos aspectos culturais da América Meridional? Por que descentralizar essas narrativas eurocêntricas?
Giuliano Andreoli - 
A alta fantasia produzida por autores anglo-saxões bebe das fontes históricas e mitológicas de seus países. E nós, latino-americanos, consumimos muito esse tipo de histórias. Assim, temos o nosso imaginário povoado por elementos mitológicos ou históricos da Europa, mas muito pouco nas nossas próprias culturas e mitos.


Por que descentralizar essas narrativas eurocêntricas?
Giuliano Andreoli - 
Apesar de já haver algumas obras que fogem a essa regra, no geral, na América Latina, a alta fantasia me parece ainda muito referenciada nos autores canônicos europeus. Porém, isso não faz sentido, se pararmos para pensar bem, pois a função básica da fantasia é dar asas à imaginação. Então, por que ficar presa a um modelo? Eu creio que se J.R.R. Tolkien tivesse sido brasileiro, “O Senhor dos Anéis” não contaria com os elementos presentes no livro. Ele desenhou o seu universo dessa forma por ser europeu. Mas continuamos muito presos ao modelo de universo construído por ele. Uma questão que eu acho que influencia nisso é que a colonização impregnou em todos nós a falsa ideia de que, aqui no hemisfério sul (América e África), nós tivemos povos sem cultura e sem história, e que a história da Europa constituía a grande história universal da humanidade. Eu creio que isso tem a ver com o fato de muitas vezes não olharmos para o nosso passado, a nossa mitologia e a nossa cultura como uma fonte também fértil para criarmos histórias de ficção. Daí os Elfos, os Dragões, os Orcs e outros mitos europeus nos parecem sempre mais atrativos. Mas, através da ficção, eu acredito que é possível termos outro tipo de relação com o rico fundo cultural e mitológico latino-americano.


O que os leitores podem entender e aprender ao se aprofundarem nessas histórias que são mais próximas dos contextos em que vivem?
Giuliano Andreoli - 
Histórias de alta fantasia visam o lazer através do escape momentâneo da realidade concreta. Mas elas também representam em suas narrativas questões profundas sobre a vida, a natureza humana, a honra, a guerra etc. E a maneira como isso é feito, na narrativa, pode refletir aspectos do mundo social onde o autor e os leitores vivem. Por exemplo, na alta fantasia anglo-saxã um tema recorrente são as disputas entre linhagens de reis pelo direito ao trono. E isso acontece porque tem a ver com a história nacional dos países europeus. No Brasil, nós não temos uma história política ligada a isso, nem sequer a monarquia tem o mesmo peso para nós. No caso da minha história, eu abordo o tema da colonização, em sua articulação com o racismo, que me parece muito mais relacionado aos conflitos e tensões que constituíram alguns problemas da nossa sociedade atual. Outros temas que abordo são os conflitos políticos e a relação entre os povos que vivem nas cidades e os povos nômades (que são como os nossos indígenas) de Ruamu. E há também a questão da violência contra a mulher, que aparece no arco de uma das personagens secundárias. Essa personagem vive em uma nação que é representada com valores culturais mais retrógrados, e esse problema acaba aparecendo em sua vida. Esses são exemplos de temas bem próximos do contexto em que vivemos. Eles geram alguns dos conflitos que movimentam a trama. E os leitores podem refletir e aprender com os ensinamentos trazidos pelo destino a cada um dos personagens quando eles confrontam esses problemas.


Você utiliza o enredo para tratar sobre temas como violência, racismo e dogmatismo religioso. Como esses assuntos tão atuais podem ser encontrados entre as páginas?
Giuliano Andreoli - 
Nessa obra, eu procuro retomar algo que já foi feito por autores como Robert Howard ("Conan”) e J.R. Tolkien (“O Senhor dos Anéis”): criar mundos fictícios com grandiosas civilizações que existiram no passado longínquo. Assim, na minha obra, a América do Sul está povoada por imensas nações, com cidades e templos grandiosos, como em qualquer uma dessas obras de alta fantasia. E só isso já é importante para desfazer um imaginário que por muito tempo se fixou em nossas mentes: a ideia de que apenas o hemisfério norte teve a capacidade de desenvolver grandes civilizações. Na tradição dos mitos das civilizações perdidas, por exemplo, sempre foi muito comum elas serem representadas apenas como povos de raça branca. Isso aparece na literatura mundial nas histórias sobre Atlântida e outras. A minha história brinca um pouco com a subversão de tudo isso. A exemplo do nome da nação opressora estrangeira, Schwertha, retirada da obra Crônicas de Akakor, que compõe parte desse imaginário colonial que divulgou a ideia de povos de raça branca construindo civilizações avançadas no passado da América do Sul. Na história desse livro, Schwertha está ligada aos invasores do continente de Ruamu que pregam uma doutrina de superioridade racial – em referência ao nazismo. E eles procuram justamente tentar desacreditar que os povos ancestrais de Ruamu produziam tecnologias muito avançadas. O dogmatismo religioso, por outro lado, está ligado a outro eixo da história, que é uma instituição religiosa chamada susejismo, um dos ramos de uma religião milenar que existe no continente de Ruamu. Há muitos pontos de vista divergentes sobre a doutrina. E há debates entre os personagens susejistas mais fanáticos e os susejistas que seguem orientações mais progressistas ou pacifistas. Esses dois eixos constituem, por assim dizer, os principais antagonismos aos personagens centrais da trama e é o que gera os posicionamentos dos heróis e vilões.


Como as trajetórias dos personagens Lagnicté e Narsciti conseguem se aproximar dos contextos de vida dos leitores? O que é possível apreender da história deles?
Giuliano Andreoli - 
Cada personagem tem um arco que traz algum drama. A personagem central, Lagnicté, é uma figura política envolta no dilema de iniciar ou não iniciar uma guerra para tentar libertar o seu país. Dael é um dos melhores guerreiros do seu tempo, mas deseja viver uma vida de paz. Ambos vivem o dilema de terem que cumprir com aquilo que é colocado para eles como um dever, sem que eles tenham pedido ou desejado por essa demanda. Narsciti, por outro lado, é um personagem cujo arco está relacionado ao desejo por vingança. A morte de seus pais, na sua infância, justamente por aqueles contra quem ele agora luta, faz com que ele tenha que lidar com os limites entre a justiça e a vingança. Há personagens que são dotados de grandes poderes e precisam aprender a controlá-los. E há aqueles que são pessoas comuns, mas estão envoltas também em demandas de luta por justiça. Há uma reflexão permanente sobre o tema do poder, sobre como ser mais poderoso não torna alguém necessariamente melhor ou superior. Também há uma reflexão permanente sobre a guerra, de um ponto de vista humanístico.


Como foi o processo de pesquisa para a construção deste universo?
Giuliano Andreoli - 
A construção do universo contou com um amplo processo de pesquisa que envolveu a pesquisa sobre o contexto da pré-história sul-americana e dos mitos da América do Sul colonial. Contou também com a leitura de algumas fontes usualmente utilizadas por obras de ficção, como a teosofia de Helena Blavatsky, o mito tibetano de Agartha, o livro “O Continente de Mu”, de James Churchward, e “Crônicas da Akakor”, de Karl Bruguer, para criar o contexto cultural dos antagonistas. A religiosidade indígena (tupi-guarani), além de nomes indígenas e nomes de deuses compôs o universo dos povos nômades e das principais nações.Já para inspirar as reflexões espirituais e os debates políticos e religiosos entre os personagens, inspirei-me em autores como Gibran Khalil Gibran, Mikhail Naimy, Frantz Fanon, Friedrich Nietzsche e Piotr Kropotkin, além de referências ao cristianismo, budismo e taoísmo. Alguns acontecimentos verídicos serviram de inspiração para alguns acontecimentos do enredo: o incêndio da biblioteca de Alexandria, a perseguição aos heréticos cristãos, os Cavaleiros Templários e a Franco-Maçonaria, as revoluções camponesas na Alemanha, o nazismo e o surgimento da extrema-direita no Brasil. Para criar uma das personagens, eu me referenciei em Malala Yousafzai. Há, na obra, também uma referência a “Macunaíma”, de Oswald de Andrad e a “Crônicas de Atlântida: O Tabuleiro dos Deuses”, de Antônio Luiz M.C. Costa.

.: Escritor Luiz Gustavo Medeiros fala sobre dilemas, complexidades e tensões


"Espero conseguir colocar o leitor diante do contraditório, esticar os limites da sua percepção.", afirma o escritor Luiz Gustavo Medeiros. Foto: divulgação


Paulo é um rapaz de trinta e poucos anos lidando com tensões relacionadas ao emprego, ao passado familiar trágico, à herança negra e, sobretudo, aos impasses amorosos. Esse é o personagem principal do romance de duração “A União das Coreias” (compre neste link), escrito por Luiz Gustavo Medeiros e publicado pela editora Reformatório.

O  livro busca traçar um retrato das complexidades da vida e seus dilemas morais, embora temas como o amor, o sexo, a infidelidade, a política, os abismos sociais, ajudem a compor o cenário existencial por onde os personagem se movem. A obra, contemplada pelo Fundo de Arte e Cultura de Goiás em 2023, conta com orelha assinada por Noemi Jaffe e comentários na quarta capa de André Sant’Anna e Maria Fernanda Elias Maglio.

Luiz Gustavo nasceu no Rio de Janeiro, capital, passou a infância praticamente toda em Curitiba, no Paraná, e se mudou para Goiânia, em Goiás, no ano de 2002, onde vive desde então. Ele é graduado em Ciências Sociais e mestre e doutorando na área de Letras. O primeiro livro “O Corpo Útil” (compre neste link) foi vencedor do Prêmio Hugo de Carvalho Ramos de 2020 e publicado em 2021 pela editora Patuá.


Quais são os temas centrais de “A União das Coreias”?
Luiz Gustavo Medeiros - O romance se passa em um só dia e gira em torno de um personagem que, às vésperas do primeiro turno das eleições de 2018, retoma o passado enquanto avalia o presente e o futuro. À grosso modo, o livro trata de temas comuns como o amor, o sexo, a política, os costumes e os abismos sociais. O título surgiu a partir da leitura de uma tese de doutorado em psicologia chamada "Cartas sobre o Envelhecer", de Luciana de Oliveira Pires Franco. A tese é toda composta de cartas e, em uma delas, é citado um documentário chamado "A Vida em Um Dia", que registra um determinado dia na vida de várias pessoas pelo mundo. Um dos relatos é o de um homem que atravessa a Ásia de bicicleta sonhando com a união das Coreias. Gostei da imagem e achei que ela batizaria bem essa tentativa de captura, que é o livro, do percurso mental de um sujeito atormentado por forças contrárias em duelo constante.


Por que você escolheu esses temas?
Luiz Gustavo Medeiros - Não penso que a escolha dos temas, das tramas e subtramas, tenha uma motivação especial. Os conflitos do romance fazem parte da trajetória de muitas pessoas e podem servir como material pra boa literatura, onde mais importa como dizer do que o que dizer


O que motivou a escrita do livro?
Luiz Gustavo Medeiros - Lembro quando um estudante foi assassinado em Goiânia pelo próprio pai por participar das manifestações contra a PEC do teto de gastos durante o governo Temer. O pai se matou em seguida. Sou servidor do CREA e, pouco depois, acabei atendendo a mãe desse jovem, que foi lá apresentar a certidão de óbito do ex-marido, que era engenheiro, pra que o registro dele fosse cancelado. Lembro também de assistir a apuração das eleições de 2018 em um bar numa região de classe média alta de Goiânia e um homem sacar uma arma, depois que o resultado se confirmou, só pra exibi-la. E o livro começou a ser escrito quando a pandemia estourou e o país parecia ensaiar uma divisão entre os que queriam aderir às recomendações dos órgãos de saúde e os que não aceitavam qualquer mudança de comportamento. Quis examinar essa situação, esse afunilamento da tolerância, tentar me aproximar do convívio entre essas pessoas que não compactuam com as mesmas ideias, num momento em que elas ainda pareciam se suportar.


Como você chegou à escolha do formato narrativo da história?
Luiz Gustavo Medeiros - Eu queria uma narrativa que tentasse simular o ritmo da consciência, cheia de idas e vindas. Ao mesmo tempo, eu queria um narrador em terceira pessoa que fosse uma espécie de voz interior do personagem, exigente e debochada, e que fosse muito próxima dele a ponto dos dois se confundirem.


Como a bagagem do seu livro anterior ajudou na construção da obra?
Luiz Gustavo Medeiros - No meu primeiro livro, de contos, eu já vinha experimentando esse narrador em terceira pessoa muito colado no personagem, além dos diálogos diluídos no texto, em itálico. No mais, são livros bem diferentes.


O que você espera alcançar com a publicação de “A União das Coreias”?
Luiz Gustavo Medeiros - Espero alcançar leitores. Espero conseguir colocar o leitor diante do contraditório, esticar os limites da sua percepção.


E o que a obra significa para você? Ela te mudou de alguma maneira?
Luiz Gustavo Medeiros - É meu primeiro romance. Foi escrito ao longo de quatro anos, quatro anos e meio. Foi um desafio cujo resultado me agradou. Não vejo um poder de transformação imediato na escrita. Mas escrever - e ler - ajuda, pouco a pouco, a ampliar nosso horizonte de percepção, a ampliar o mundo e a fazer com que a gente se encaixe melhor dentro dele.


Quais são os seus projetos atuais?
Luiz Gustavo Medeiros - Tenho uma tese pra escrever, mas venho trabalhando devagar em um livro de contos e no esboço de um futuro romance.

segunda-feira, 15 de julho de 2024

.: 2ª edição do Festival Literário Arena da Palavra reúne 22 autores em 18 livrarias


Oswaldo de Camargo será o homenageado da 2ª edição do Festival Literário Arena da Palavra. Foto: Renato Parada

A literatura está em alta na cidade e os amantes desta área de expressão artística poderão desfrutar de um evento onde as estrelas são os autores e seus livros. O público terá a possibilidade de compartilhar trocas intelectuais e afetivas, além de circular entre escritores, leitores e livreiros, personagens do vasto mundo das ideias. A 2ª edição do Festival Literário Arena da Palavra, que homenageia o escritor Oswaldo Camargo, e movimenta São Paulo entre os dias 25 de julho e 4 de agosto, quando 18 livrarias de rua da cidade estarão de portas abertas para receber 22 autores durante os nove dias do projeto. A programação inspiradora inclui quatro lançamentos de livros, debates e shows.

A abertura (para convidados) acontece dia 25 de julho, quinta, às 19 horas, no MAM - Museu de Arte Moderna, no Parque Ibirapuera. com pocket show da cantora e compositora Fernanda Porto, quando  haverá a confraternização entre livreiros, autores participantes e homenageado, e os curadores apresentarão os destaques do evento, ressaltando o que norteou sua linha curatorial. Nesta segunda edição do Arena da Palavra, a curadoria segue com o formato de ter, em cada livraria, a figura do  autor-livreiro, que conduzirá um debate com o público a partir dos títulos e/ou obras que terá selecionado previamente.  Entre outras atrações, está a apresentação do Sarau do Capão (dia 30 de julho, terça-feira, às 19h00, na Livraria Megafauna) e o show do violeiro Paulo Freire (dia 4 de agosto, domingo, das 11h00 às 15h00, no Sebo Pura Poesia).

O evento homenageia Oswaldo Camargo, poeta, ficcionista, crítico, historiador da literatura e um dos mais destacados escritores negros das últimas décadas. O escritor estará na Livraria Megafauna dia 30 às 19h00, quando terá seus livros relançados - "O Carro do Êxito", "30 Poemas de Um Negro Brasileiro", "A Descoberta do Frio" (Companhia das Letras). Também estará domingo, 4 de agosto, no encerramento do projeto, na Pura Poesia. O Arena da Palavra também presta homenagem à Livraria Taverna, uma das afetadas pela tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul. Seu acervo e mobiliário foram danificados.

Entre os autores escolhidos pela curadoria, estão o jornalista e professor Eugênio Bucci,  a dramaturga e poeta "Ave Terrena", o autor Felipe Franco Munhoz, o quadrinista e ilustrador Alcimar Frazão e as escritoras Lilia Guerra e Aline Bei, entre outros. Para saber a programação completa, visite o site www.arenadapalavra.com.br  e acompanhe as redes do Polo Cultural. O evento tem idealização do produtor cultural Marcelo Sollero, diretor do Polo Cultural, que assina a curadoria ao lado do Claudiney Ferreira ("Certas Palavras"), o jornalista Ubiratan Brasil (crítico de Literatura da APCA) e a escritora Cidinha Silva. Com produção do Polo Cultural, o festival pretende aquecer o circuito/cenário das pequenas empresas do universo do livro. A ideia é fortalecer as livrarias independentes, principalmente as livrarias de rua, de pequeno porte. Busca-se valorizar a diversidade literária e promover o acesso à cultura, proporcionando aos leitores uma experiência enriquecedora e diferenciada. Para viabilizar esta programação, as livrarias receberão pequeno aporte de recursos proveniente de emenda parlamentar.


Lançamentos dos autores Cidinha da Silva, Oswaldo de Camargo, Cristino Wapichana e Felipe Franco Munhoz
O autor indígena Cristino Wapichana (Boa Vista, Roraima, 1971) - contador de histórias, escritor, músico, compositor - autografa o seu Terra Rio e Guerra da editora Moderna no sábado, dia 27, às 15h, na Livraria Miúda (R. Coronel Melo de Oliveira, 766, Pompeia). Contador de histórias, escritor, músico, compositor, produtor cultural, artista indígena, utiliza-se de sua familiaridade com as palavras e a música para disseminar histórias, saberes e heranças dos povos originários, reforçando a importância dessa população para a formação da sociedade brasileira. 

O homenageado Oswaldo de Camargo estará no dia 30 de julho, sexta-feira, às 19h00, na MegaFauna, com o relançamento de seus livros (Companhia das Letras) - "O Carro do Êxito", "30 Poemas de Um Negro Brasileiro", "Descoberta do Frio". Felipe Franco Munhoz, que estreou na literatura com o romance "Mentiras", em 2016, estará na Livraria Sentimento do Mundo no dia 30 de julho, terça-feira, às 19h00, autografando "Dissoluções e Lanternas Ao Nirvana' (audiolivro), lançado pela editora Moderna. A mineira Cidinha da Silva – que tem 22 livros publicados, distribuídos entre os gêneros crônica, conto, ensaio, dramaturgia e infantil/juvenil - assina o seu "Vamos Falar de Relações Raciais? Crônicas para Debater o Antirracismo" (Editoria Autêntica) no sábado, dia 3 de agosto, às 17h00, na Livraria Cabeceira (praça Alfredo Weiszflog, 38, Vila Romana).


Autor-livreiro
Sobre o conceito de autor-livreiro, Marcelo Sollero diz que “foram convidados autores de livros para visitar as livrarias e escolher dentro de seus acervos alguns livros de sua preferência E a partir daí abrir para debater. Esperamos que o festival tenha o poder de ajudar a impulsionar o crescimento do mercado editorial dos independentes, fomentando a cultura e incentivando a formação de leitores”, afirma Sollero.

Ubiratan Brasil conviveu durante anos com o homenageado. “Conheci o Oswaldo quando eu entrei no grupo Estado, em 1990, no Jornal da Tarde, quando ainda era repórter de Esporte. Naquela época, como não tinha internet, o acervo do jornal era importante fonte de pesquisa. Oswaldinho, como a gente o chamava, era um dos atendentes e sempre demonstrou ser uma pessoa culta, antenada com tudo o que acontecia no Brasil e no mundo - e não só na área de cultura. Era um homem muito divertido, com um jeito muito gracioso de falar. Eu gostava de conversar com ele, mesmo que esporadicamente”. Sobre a linha da curadoria, Ubiratan buscou nomes novos ou ainda pouco conhecidos no mercado editorial, mas cujo trabalho já chama atenção das editoras, independente do seu tamanho. “Há muita gente escrevendo hoje em dia, mas poucos com real qualidade. E os que escolhi me pareceram mais representativos desse momento”.

Como visitante ou a trabalho, há exatos 40 anos o curador Claudiney Ferreira frequenta festivais e feiras de livros no Brasil e no exterior. “No geral, os formatos dos eventos são um tanto semelhantes. Normalmente, interessantes. Arena da Palavra nos apresenta uma outra perspectiva de evento literário, principalmente na sua fase presencial. Não só a literatura, escritoras e escritores, editores são personagens importantes deste evento, mas a cidade é também essencial. A cidade e suas pequenas livrarias de rua, todas dotadas de distintas personalidades. Arena da Palavra nos provoca com fluxos e fruição pela urbanidade paulistana”, analisa.


Calendário de programação

Sexta-feira, 26 de julho
19h00 - Livraria Ponta de Lança. R. Aureliano Coutinho, 26, V Buarque
Autor-Livreiro: Felipe Franco Munhoz
Homenagem a Livraria Taverna - presença de Ederson Lopes, representante da livraria do Rio Grande do Sul


Sábado, 27 de julho
13h00 às 15h00 - Companhia Ilimitada. Av. Nova Cantareira, 3344, sala 18.
Autor-livreiro – Vanessa Merique

15h00 – Miúda. R. Coronel Melo de Oliveira, 766, Pompeia
Autor-livreiro: Cristino Wapichana. Lançamento do livro - "Terra Rio e Guerra"

18h00 às 20h00 - Eiffel -Praça da República, 183 – República.
Autor-livreiro: Alcimar Frazão.


Domingo, 28 de julho
15h00 - Sebo Pura Poesia - Rua Costa Aguiar, 1112- Ipiranga
Autor-livreiro: Jarid Arraes


Segunda-feira, 29 de julho
17h00 - Bibla - Pça Profa. Emília Barbosa Lima, 58 - Alto de Pinheiros
Autor-livreiro: Catita

19h00 - Ria  - R. Marinho Falcão, 58 - Sumarezinho
Autor-livreiro: Edson Natale


Terça-feira, 30 de julho
17h00 - Brooklin - Rua Hollywood, 275 – Brooklin
Autor-livreiro – Carol Rodrigues

19h00 - Megafauna  - Av. Ipiranga, 200 - loja 53 – República
Sarau do Capão e Oswaldo de Camargo - Relançamento de seus livros (Companhia das Letras). "O Carro do Êxito", "30 Poemas de Um Negro Brasileiro", "A Descoberta do Frio"

19h00 - Sentimento do Mundo
Felipe Franco Munhoz
Lançamento dos livros – "Dissolução" e "Lanternas ao Nirvana". Editora Record.


Quarta-feira, 31 de julho
19h00 - Ponta de Lança - R. Aureliano Coutinho, 26 - Vila Buarque
Autor-livreiro: Aline Bei. Cia das Letras

19h00 - Da Tarde - R. Cônego Eugênio Leite, 956
Autor-livreiro: Tatiana Nascimento


Quinta-feira, 1° de agosto
15h00 - Pura Poesia - Rua Costa Aguiar, 1112- Ipiranga
Autor-livreiro: Mariana Carrara

17h00 - Na Nuvem - Alameda Eduardo Prado, 493B - Campos Elíseos
Autor-livreiro: Zainne Lima

17h00 - Sebo Chama de uma Vela - R. Iquiririm, 277 - casa 2 - Vila Indiana
Autor-livreiro: Marcelo de Salete


Sexta-feira, 2 de agosto
19h00 - Sentimento do Mundo - R. Barão de Tatuí, 496 - Santa Cecília
Autor-livreiro: Lilia Guerra

19h00 - Patuscada - Rua Luís Murat, 40 - Pinheiros
Autor-livreiro: O Floresta


Sábado, 3 de agosto
14h00 - QueerLivros - Rua Joaquim Távora, 731 Vila Mariana
Autor-livreiro: Ave Terrena

14h00 - Tucambira - Rua Tucambira, 53 - Pinheiros
Autor –livreiro - Juliana Borges

15h00 - Pé de Livro – Rua Tucuna, 298, Pompeia
Autor-livreiro – Priscila Obaci

17h00 - Cabeceira – Praça Alfredo Weiszflog, 38, V Romana, Lapa.
Lançamento – Cidinha da Silva
Livro: "Vamos Falar de Relações Sociais? Crônicas para Debater o Antirracismo"


Domingo, 4 de agosto
11h00 às 16h00 - Pura Poesia - Rua Costa Aguiar, 1112- Ipiranga
Autor-livreiro:  Show com violeiro Paulo Freire
Presença do homenageado Oswaldo de Camargo, autografando seus livros.


Sobre o homenageado
Oswaldo de Camargo nasceu em Bragança Paulista (SP), em 1936. Estudou música e humanidades no Seminário Menor Nossa Senhora da Paz, mas, percebendo intimidade com as letras, decidiu dedicar-se à escrita. Foi revisor do jornal O Estado de S. Paulo, redator do Jornal da Tarde, diretor de cultura da Associação Cultural do Negro e um dos principais colaboradores de periódicos como Novo Horizonte, Niger e Cadernos Negros. Dele, a Companhia das Letras também publicou "O Carro do Êxito".


Curadores
Ubiratan Brasil
Formado em jornalismo pela USP, iniciou a carreira profissional na Editora Abril, como repórter da revista Placar. Seguiu para o Jornal da Tarde, Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo, onde passou a escrever sobre Cultura durante mais de duas décadas. Cobriu importantes eventos como Copa do Mundo, GPs de Fórmula 1, Feira do Livro de Frankfurt, Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), a cerimônia de entrega do Oscar (desde 2005)r, entre outros. Desde 2023, atua como jornalista freelancer, colaborando para Valor Econômico, Folha, Globo, Marie Claire e Estadão, nas áreas de Literatura, Teatro e Cinema, com especial apreço pelo teatro musical.  

Cidinha da Silva
Mineira de Belo Horizonte, a escritora e editora publicou 17 livros, alguns deles em vários idiomas: alemão, catalão, espanhol, francês, inglês e italiano. A autora passeia confortavelmente pelos gêneros: crônica, conto, ensaio, dramaturgia, infantil/juvenil, pelos quais já recebeu vários prêmios literários. Doutora em Difusão do Conhecimento e conselheira da Casa Sueli Carneiro, é autora dos premiados Um Exu em Nova York e O mar de Manu. Vários de seus livros integram políticas públicas de formação de acervo como o PNLD Literário (FNDE). Tem traduções em catalão, espanhol, francês, inglês e italiano. É cronista do jornal Rascunho (site). Sua publicação mais recente é Vamos falar de relações raciais? Crônicas para debater o antirracismo (Autêntica, 2024).

Claudiney Ferreira
Jornalista, radialista, curador e gestor cultural, trabalhou em rádios, revistas e tvs com jornalismo cultural, político e econômico. Criador do programa de rádio Certas Palavras - especializado em livros e ideias, no ar por 19 anos, ganhador de 15 prêmios. Gestor cultural do Itaú Cultura por 20 anos, coordenou as áreas de literatura, audiovisual (curadoria e produção, jornalismo cultural, leitura, HQ e culturas indígenas). Foi coordenador-geral da construção da plataforma Itaú Cultural Play. Recebeu 19 prêmios por suas atividades no jornalismo.


As 18 livrarias - https://www.arenadapalavra.com.br/livrarias/
1. Bibla
2. Cabeceira
3. Chama de uma Vela
4. Companhia Ilimitada
5. Eiffel
6. Livraria da Tarde
7. Livraria do Brooklin
8. Livraria na Nuvem
9. Megafauna
10. Miúda
11. Patuscada
12. Pé de Livro
13. Ponta de Lança
14. Queer Livros
15. Ria Livraria
16. Sebo Pura Poesia
17. Sebo Tucambira
18. Sentimento do Mundo


Sarau do Capão na Megafauna
A literatura circula na Periferia através de coletivos e slams e o Festival Literário Arena da Palavra dá voz a essas manifestações artísticas ao realizar o Sarau do Capão na Livraria Megafauna dia 30 de julho, às 19 horas. Trata-se de um coletivo que apresenta um sarau itinerante desde janeiro de 2017, fundado por Tawane Theodoro e Jéssica Campos - duas jovens mulheres pretas e poetas, nascidas e criadas no Capão Redondo, Zona Sul de São Paulo. Mescla de poesia, dança, música e diversas formas de arte, além de debate em torno de questões de gênero, raça e classe.


Fotos Oswaldo de Camargo - 


 


Todas as informações - https://arenadapalavra.com.br/livrarias/


 


Serviço


Arena da Palavra - Abertura para convidados no dia 25 de julho, quinta-feira, às 19h no MAM – Museu de Arte Moderna de São Paulo, no


Parque Ibirapuera, Av. Pedro Álvares Cabral - Vila Mariana. Presença dos curadores Cidinha da Silva, Claudiney Ferreira e Ubiratan Brasil.


Pocket show de Fernanda Porto ao piano.  Presença dos 22 autores e 18 livreiros.  Mais informações - https://arenadapalavra.com.br/livrarias/


 


Ficha técnica do Polo Cultural - https://arenadapalavra.com.br/livrarias/


domingo, 14 de julho de 2024

.: Elisa Marques: "Às vezes deixo de me expor como escritora para me expor"


"Eu às vezes deixo de me expor como escritora para me expor como pessoa". Em entrevista, a escritora Elisa Marques associa a escrita poética com os aprendizados de vivenciar o amor romântico. Foto: Wictor Cardoso


Formada em Jornalismo nos Estados Unidos, a escritora, roteirista e diretora audiovisual, Elisa Marques, acaba de lançar a autoficção "Minha Mão na Sua Boca e Um Verso sobre o Amor", que reúne 78 poemas sobre as complexidades do sentimento romântico na sociedade contemporânea. Nesta obra visceral, a autora imerge nas próprias emoções e resgata experiências amorosas para acolher todos aqueles que se identificam com a mesma forma intensa de amar.

Com referências da cultura do rock ao clássico, como inspirações na música “Mania de Você”, de Rita Lee, e as diferentes sensações evocadas pelas composições de Beethoven, este livro é uma ode ao amor sáfico, com declarações apaixonadas e desabafos às mulheres que a autora já se apaixonou. Mais que isso, é um resgate da poesia como forma de transbordar sentimentos universais, mas que muitas vezes passam despercebidos ou são silenciados com a rotina.

Elisa Marques é goiana, nascida em 1994, e cresceu em Goiânia. Estudou Jornalismo e Psicologia nos Estados Unidos e atualmente divide seu tempo entre literatura e cinema, sendo também roteirista e diretora. Elisa desenvolveu o gosto pela leitura e pela escrita inspirada pelas obras de seu falecido avô, a primeira referência que teve de escritor. “Até Minha Terapeuta Sente Falta de Você” é o primeiro livro da autora, que traz sentimentos profundos sobre fins de relacionamentos, e foi contemplado pela Lei Paulo Gustavo da Secretaria de Estado de Cultura de Goiás como “Melhor Obra Cultural”, no ano de 2023. Agora, lança a publicação poética "Minha Mão na Sua Boca e Um Verso sobre o Amor", que ganhará uma adaptação para o audiovisual no segundo semestre de 2024. Em entrevista, a Elisa Marques comenta detalhes sobre este lançamento e as referências para escrever a obra, com um breve spoiler do que se pode esperar da adaptação para o audiovisual. Compre o livro "Minha Mão na Sua Boca e Um Verso sobre o Amor", de Elisa Marques, neste link.


O livro é descrito como uma ode ao amor sáfico. Como você vê a importância da representação do amor entre mulheres na literatura atual e quais desafios você encontrou ao explorar esse tema?
Elisa Marques - A pergunta me faz lembrar da primeira escritora a tratar do tema de forma natural: Odete Rios, através de seu pseudônimo Cassandra Rios, no final da década de 1940. Censurada de todas as formas pela ousadia em plena ditadura militar, Cassandra deu voz a mulheres que existiram. O cenário hoje é diferente, mas manter essa representatividade na literatura contemporânea através de escritoras como Angélica Freitas, Natalia Borges Polesso, Elayne Baeta e muitas outras que me inspiraram, é como dizer: eu sempre vou existir. Da minha parte, não houve desafios ao escrever sobre o amor entre mulheres, pois a Elisa escritora existe através da voz daqueles com quem me relaciono. E nos últimos tempos, tem sido sim uma vida/escrita mais voltada para mulheres.


Você aborda aspectos do amor no mundo contemporâneo, como a espera por mensagens de celular e as ambiguidades dos relacionamentos hoje em dia. Na sua visão, por que essas nuances chamam atenção na poesia?
Elisa Marques - Poesia é também uma relação com quem te lê. Se escrevo a partir dos amores que vivo ou desejo viver e o amor é um sentimento universal, a poesia chama atenção porque se relaciona com os leitores.


O livro combina referências da cultura do rock e do clássico, de Rita Lee a Beethoven. Como essas diversas inspirações impactaram a criação dos seus poemas e a estrutura do livro?
Elisa Marques - Costumo dizer que escrever é prestar atenção. O que me rodeia são minhas maiores inspirações. Foi em uma aula de filosofia que conversei sobre o tema: “A música de Beethoven é ou não é triste?”. Em contrapartida, foi ouvindo “Mania de Você” deitada na rede de casa em um dia qualquer que surgiu o poema cujo primeiro verso é “hoje fiz amor por telepatia”. Escrever é observar.


 A obra também mistura ficção e autobiografia. Quais experiências pessoais mais influenciaram a sua escrita e como foi o processo de transformar vivências reais em poesia?
Elisa Marques - Os potenciais amores inspiraram muito esse segundo livro. No primeiro eu falei sobre o fim de um relacionamento romântico que existiu. Nesse eu falo sobre vários inícios que nunca vingaram de fato e que, por motivos diferentes, terminaram ainda muito vivos em mim justamente pelo que podia ter sido. A escrita a partir de si é muito difícil. Eu às vezes deixo de me expor como escritora para me expor como pessoa. O que é de verdade e o que é ficção é uma linha muito tênue, e quando eu escolho dizer que escrevi uma obra de autoficção eu abro margem para os leitores especularem. Minha escrita vai te encontrar onde você quiser que ela te encontre.


"Minha Mão na Sua Boca e Um Verso sobre o Amor" será adaptado para o audiovisual. O que os leitores podem esperar dessa adaptação e como você está se preparando para transpor a poesia para as telas?
Elisa Marques - Os leitores podem esperar um show de performance de cinco grandes atrizes goianas em ascensão. A entrega de todos os profissionais envolvidos ultrapassou toda e qualquer expectativa que eu tinha criado. A equipe de produção abraçou o projeto como se eles mesmos tivessem o escrito. Só posso dizer que tenho me preparado para ver esse filme nas telas no mesmo lugar onde faço todas minhas preparações: em terapia (risos).


Garanta o seu exemplar de "Minha Mão na Sua Boca e Um Verso sobre o Amor", escrito por Elisa Marques, neste link.

.: Entrevista com Carla Guerson: "Percebi que havia mais a ser dito"


“Todo Mundo Tem Mãe, Catarina”: uma conversa com a autora capixaba Carla Guerson sobre seu novo livro. Foto: divulgação


Catarina, a protagonista do novo romance da capixaba Carla Guerson, “Todo Mundo Tem Mãe, Catarina" (compre neste link), lançado pela editora Reformatório, é uma garota de 14 anos que começa a sua jornada pelas descobertas da adolescência após uma infância marcada pela lacuna deixada pelos pais. Criada pela avó, uma servente de condomínio de classe média no interior do Espírito Santo, a personagem precisa desvendar a história familiar complexa e cheia de segredos para crescer.

Assim como sua personagem, Carla Guerson é natural do Espírito Santo, tendo nascido e sido criada em Vitória, onde ainda vive. A autora é formada em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), porém sempre separou momentos para a escrita literária entre sua rotina cheia de minutas jurídicas e relatórios. Começou a carreira literária em 2021, quando publicou o seu primeiro livro de contos, “O Som do Tapa”, publicado pela editora Patuá, que teve uma ótima recepção entre os leitores por tratar temas complexos e personagens mulheres fora do padrão. Em “Fogo de Palha”, da editora Pedregulho, a autora seguiu abordando temas como autoaceitação, maternidade, solidão, relacionamentos familiares e morte e foi premiada pelo edital de Cultura da Secult/ES.

Carla idealizou o Coletivo Escreviventes, que hoje conta com 600 participantes espalhadas pelo Brasil, e também se dedica à leitura de autoras contemporâneas e à mediação de clubes de leitura com foco em obras produzidas por mulheres, como o Leia Mulheres Vitória e o Clube Casa das Poetas. Compre o livro “Todo Mundo Tem Mãe, Catarina”, de Carla Guerson, neste link.

Se você pudesse resumir os temas centrais do livro, quais seriam?
Carla Guerson - Sexo, religião, ancestralidade, prostituição, adolescência. O romance parte da premissa de que a personagem principal não sabe nada de sua mãe e de seu pai, e esta necessidade de saber mais sobre seu passado vai levar Catarina, a personagem principal, a fazer muitas descobertas sobre quem ela mesmo é ou quer ser. Ela transita em meio a diversas possibilidades, tentando traçar um caminho próprio e o leitor acompanha essa trajetória lembrando de sua própria caminhada e de como essa fase é importante na definição de quem somos ou seremos.

Por que você escolheu esses temas?
Carla Guerson Eu tenho um interesse grande pela infância e pela adolescência, acho que são fases definidoras, intensas. Investigar esses processos me instiga e eu tinha vontade de escrever uma personagem nesta faixa etária dos 14 para os 15 anos, que foi uma fase bem importante no meu desenvolvimento. Eu também tinha vontade de ambientar uma história no meu estado, especialmente no interior, acho que é um ambiente ainda pouco retratado na literatura. Escolhido o personagem e o local, a história foi se desenvolvendo. Os temas retratados surgiram naturalmente, a partir do exercício de pensar minha adolescência e também de observar e consumir outras referências que se relacionem a esta etapa da vida, especialmente na vida das meninas, já que minha personagem é uma menina.

Como foi o processo de escrita?
Carla Guerson A primeira faísca do livro veio em 2021, quando eu ainda estava finalizando a escrita do meu primeiro livro, “O Som do Tapa”. Em uma das oficinas que fiz com a Aline Bei, ela trouxe uma provocação com a palavra “abandono”. A provocação me levou pra infância, me fez ter contato com as primeiras sensações de abandono ou de solidão que experimentei e a partir daí surgiu essa personagem que era, antes de tudo, uma sensação. Eu sentia a falta que enlaça a vida de Catarina, mesmo sem saber nomeá-la. Escrevi uma espécie de conto com esta história, onde aparecia a questão da menina guardada na "Bíblia" da avó, essa era a primeira imagem: uma menina que não tem mãe, que foi criada pela avó e que, quando pergunta pra esta avó sobre sua mãe é apresentada a uma fotografia antiga, de uma menina “que não tinha cara de ser mãe de ninguém”. Esta personagem, que ganhou o nome de Catarina, ficou me habitando, e percebi que havia mais a ser dito, que a história não se resumiria a um conto. Assim, deixei o conto de lado e guardei o projeto para desenvolvimento futuro. Em 2022 voltei a pensar sobre ela e passei cerca de 1 ano escrevendo a versão inicial. Em 2023 eu já tinha uma primeira versão e foi o ano que passei lapidando, trocando, mudando, voltando atrás, mudando tudo novamente… E também, enquanto isso, pensando e buscando ativamente uma editora que topasse o projeto como eu tinha imaginado. 


Quais obras ou autores influenciaram diretamente a obra?
Carla Guerson A primeira influência clara pra mim é Lygia Bojunga. Quando comecei a pensar em Catarina estava no meio de um projeto pessoal de ler a obra completa da Lygia, uma escritora que conheci ainda na infância, mas que só mais tarde descobri que tinha uma extensa obra também para o público adulto. A escrita da Lygia, simples e ao mesmo tempo densa, com diálogos marcados pela oralidade, a conversa com o leitor no final da obra, são influências fortes na minha escrita e acho que estão de alguma forma presentes neste primeiro romance, mesmo que de forma indireta. Como a personagem é adolescente, também fiz uma pesquisa direcionada aos livros narrados por personagens crianças e adolescentes, para encontrar o registro de Catarina. Cito como livros que li (ou reli) durante esse período e que também me influenciaram neste sentido: “O Pássaro Secreto”, da Marilia Arnaud; “A Vida Mentirosa dos Adultos”, da Elena Ferrante; “Pança de Burro”, da Andrea Abreu; “Se Deus Me Chamar Não Vou”, da Mariana Salomão; “Os Tais Caquinhos”, da Natércia Pontes e “Corpo Desfeito”, da Jarid Arraes. Além disso, especificamente na questão da falta, da ausência, que é um sentimento forte, uma sensação que parece permear a narrativa, cito como influências: os dois romances da Marcela Dantes (“Nem Sinal de Asas” e “João Maria Matilde”), os romances da Aline Bei (“O Peso do Pássaro Morto” e a “Pequena Coreografia do Adeus”), “Ponciá Vicêncio”, da Conceição Evaristo, entre outros.

Quais são os seus projetos atuais de escrita?
Carla Guerson Costumo me definir como uma pessoa inquieta e isso resulta, obviamente, numa espécie de explosão de projetos, ideias, vontades. Com relação ao que farei em seguida, dentre meus 157 projetos paralelos, tenho dois bem adiantados. O primeiro é um novo livro de poesia, que acabou de ficar em primeiro lugar no edital de seleção de projetos literários do meu estado. Ainda estamos esperando a homologação e demais etapas, mas tudo indica que vem aí, algum dia, é um projeto já bem adiantado. O segundo projeto é um novo romance, em que eu investigo questões relacionadas ao corpo, pressão estética, transtornos alimentares e gordofobia. Este tem a primeira versão pronta, mas ainda estou num processo de entender melhor para onde vai, se é que vai. Acho que são meus dois projetos atuais, digamos assim.

Garanta o seu exemplar de “Todo Mundo Tem Mãe, Catarina”, escrito por Carla Guerson, neste link.

.: Lucas Pagani: "Suspenses instigam a própria natureza humana"


"Baile de Máscaras" é o romance de estreia de Lucas Pagani. Em entrevista, ele comenta detalhes sobre o lançamento e destaca a importância do gênero de suspense na literatura nacional. Foto: divulgação


Após um brutal assassinato repercutir nos noticiários na pacata e fictícia cidade de São Filipe, os moradores ficam em estado de alerta. Afinal, quem é o assassino? E quais as motivações? Agora, cabe à detetive Diana desvendar esse mistério e juntar as peças do quebra-cabeça. É neste contexto que surge o enredo de "Baile de Máscaras" (compre neste link), romance de Lucas Pagani

Muito além de um thriller com mentiras e mortes misteriosas, esse suspense aborda as nuances da existência humana. Por meio de uma narrativa visceral, que concilia investigação criminal, questões psicológicas intrínsecas e protagonistas da terceira idade, o autor apresenta a história de Rui Córdova, que durante 50 anos nutria um amor por Vânia. Mas, antes que a mulher pudesse lhe contar um segredo do passado, ela é brutalmente assassinada.

Lucas Pagani nasceu em Lages (Santa Catarina). Formou-se em Jornalismo pela Universidade do Planalto Catarinense e trabalhou como repórter no Correio Lageano até 2017. Atuou na redação do jornal impresso e on-line, além de rádio e redes sociais. Depois, concluiu o curso de Direito e duas pós-graduações na área. Atualmente, concilia a carreira de escritor com o cargo de servidor público no Tribunal de Justiça de Santa Catarina. "Baile de Máscaras" é o romance de estreia do escritor. Em entrevista, ele comenta detalhes sobre o lançamento e as referências para a narrativa, destacando a importância do gênero de suspense na literatura nacional. Compre o livro "Baile de Máscaras", de Lucas Pagani, neste link.


Qual foi a sua principal inspiração por trás da produção de "Baile de Máscaras"?
Lucas Pagani - Costumo dizer que meus personagens nasceram antes do enredo, pois fui construindo-os ao longo dos anos até amarrar as subtramas numa história maior. As primeiras ideias surgiram ainda entre 2010 e 2011, nas aulas de redação do ensino médio.


Por que decidiu enveredar pelo suspense e o que mais te atrai neste gênero? 
Lucas Pagani - Sempre gostei muito de mistérios e o clássico "Whodunnit". Então foi uma escolha natural que meu primeiro romance trouxesse elementos de investigação. Desde muito novo, lia autores americanos como Dan Brown e Harlan Coben e imaginava escrever um livro que fizesse o leitor virar uma página atrás da outra, com cada capítulo terminando num gancho de curiosidade.  

Nos últimos anos, temos visto um crescimento significativo do gênero de suspense na literatura nacional. Como você vê essa tendência e de que maneira "Baile de Máscaras" se insere nesse movimento?  
Lucas Pagani - Suspenses sempre despertaram interesse, pois a busca pela solução de um enigma costuma instigar a própria natureza humana. Com o avanço do audiovisual, acredito que as produções do gênero tendem a engajar o público, que consome horas a fio desse conteúdo, além, é claro, da febre dos documentários sobre crimes reais. De modo geral, esta temática e os arquétipos do detetive e do assassino prendem a atenção das pessoas.  

No livro, você aborda temas complexos como abortos clandestinos e fraudes médicas. O que o motivou a incluir esses tópicos na trama e qual foi o processo de pesquisa para tratar desses assuntos de maneira próxima da realidade brasileira?  
Lucas Pagani - Não tive a intenção de trazer essa temática como a principal, mas sim como um elemento a mais que contribuiria para a revelação preparada para o desfecho da trama, que na verdade pretende gerar reflexões sobre a natureza humana, os dramas e traumas familiares, as mentiras, o luto, as amizades, os amores não correspondidos. A solução dos segredos guardados pelos personagens passa pelo tema do aborto (que no início é abordado de forma leve e só volta à tona nas últimas páginas) não como um julgamento moral da parte do autor, mas como um fato que na vida desses personagens foi definidor e trouxe consequências. Não se ignoram os muitos lados desse assunto na realidade, mas, na mentalidade e nas peculiaridades dos meus personagens, fazia sentido que essa ferida mudasse o rumo de suas vidas. Portando, eu a usei como catalisador dos acontecimentos que eu precisava que se desenrolassem na história, mas sempre com a intenção de explorar os sentimentos humanos, as dores, perdas, arrependimentos e o peso das escolhas, sejam elas quais forem.  


Os protagonistas do livro são majoritariamente idosos, que entrelaçam as vivências do momento atual da narrativa com o passado deles. Na sua perspectiva, qual a importância dessa visibilidade para pessoas da terceira idade, principalmente, em gêneros comumente consumidos pelo público jovem?  
Lucas Pagani - Sempre tive muito apreço pelos idosos. A cena de abertura do prólogo, por exemplo, brotou pronta na minha imaginação, e gosto do ar que ela transmite: o pátio de um asilo, idosos recebendo visitantes e tudo isso deixando um ponto de interrogação na mente do leitor - quando se vai ler sobre um assassinato num baile de máscaras, a última coisa que se espera é que essa história comece num asilo. Além do inusitado, o destaque de personagens idosos enriquece a trama por permitir as idas e vindas no tempo e por explorar como mudamos ao longo da vida, como resultado de nossas escolhas e dos outros. As irmãs octogenárias Josefa e Quieta, por exemplo, são muito queridas pelos leitores e funcionam como dois lados de uma moeda: a velhinha senil institucionalizada e a senhora cheia de vitalidade que pinta os cabelos de verde e joga pôquer.  

A narrativa entrelaça eventos passados e presentes. Quais os desafios do escritor em equilibrar essas duas linhas do tempo e garantir que ambas se complementassem, para garantir clareza e a sustentação do mistério até o fim?  
Lucas Pagani - Isso exige muito zelo. Um livro de 300 páginas tem muito mais que ficam de fora da versão final, incluindo as biografias de cada personagem e a linha do tempo, que no meu caso foi bem minuciosa. Como leitor, sempre torci o nariz para contradições e quebras de coerência, então cuidei para que até os dias da semana fossem fieis à realidade. A cena mais distante no tempo na minha narrativa é de algo entre seis e sete décadas antes da atualidade, por isso, é preciso planejar muito bem de onde se parte e quer chegar para que tudo se encaixe. Orgulho-me ao afirmar que não há furos nas marcações temporais da trama. 


Você se inspirou em grandes nomes da literatura de suspense para compor a sua obra de estreia, como Agatha Christie e o brasileiro Raphael Montes. O que você diria que tem de melhor desses autores na trama de "Baile de Máscaras"? E o que você tentou trazer de particularidade sua?  
Lucas Pagani - Eu mencionaria a possibilidade de a releitura ser uma experiência sempre nova. "Baile de Máscaras" é um livro de suspense, sim, mas a busca pela identidade do assassino e pela motivação do crime são ingredientes no meio de vários outros. Quem relê o livro fica surpreso com a quantidade de pistas que estavam plantadas desde o começo e a forma como tudo se encaixa, até os acontecimentos mais aleatórios. Raphael Montes, por exemplo, tem momentos mais excêntricos como os de "Jantar Secreto", mas também retrata traumas psicológicos com muita força, como no caso da Eva de "Uma Família Feliz".  Acredito que meu livro combina esses elementos, ou seja, as soluções criativas necessárias para mover a trama e os mergulhos na cabeça e nas emoções dos personagens que fazem a história acontecer.


Garanta o seu exemplar de "Baile de Máscaras", escrito por Lucas Pagani, neste link.


sexta-feira, 12 de julho de 2024

.: “O Autinho da Compadecida” nesta sexta no Festival de Férias do Teatro Uol


Adaptado do clássico de Ariano Suassuna, traz um retrato do sertão nordestino com duas personagens que já fazem parte de nossa cultura:  João Grilo e Chicó. Foto: divulgação


O Festival de Férias do Teatro Uol é o endereço certo para a diversão nas férias de julho. Tradição cultural da cidade de São Paulo, chega a 39ª edição. Este sucesso é fruto de uma programação de qualidade e diversa, em que o público se encanta tanto com clássicos como com espetáculos que abordam o universo infantil de forma criativa e lúdica. São seis espetáculos, que se revezam em apresentações que acontecem todos os dias da semana, até dia 28 de julho, sempre às 15h00. O Teatro Uol conta com toda a estrutura e segurança do Shopping Pátio Higienópolis para que a família aproveite cada minuto do passeio.

Às sextas-feiras acontecem as apresentações do espetáculo “O Autinho da Compadecida”, adaptado do clássico de Ariano Suassuna, traz um retrato do sertão nordestino com duas personagens que já fazem parte de nossa cultura:  João Grilo e Chicó. A plateia acompanha as aventuras e confusões de dois espertos sertanejos que recebem uma missão de seus patrões - Dona Dorinha e Seu Eurico - para que encontrem sua cachorra que desapareceu. A confusão aumenta quando os cangaceiros atacam a cidade, causando um alvoroço danado. Diante da bagunça geral, somente "A Compadecida" poderá intervir por eles. A peça foi avaliada com 4 estrelas pelo jornal Folha de S.Paulo.

No elenco, Annah Barros, Breno Borges, Danilo Rezende, Denis Felix, Diogo Lipoam, Ingrid Chaves, Lucas Duca, Måy Crepáldi, Micaela Rodrigues, Rafael Fontes, Robson Guedes, Ronaldo Saad, Santiago Oliveira e Vitor Hugo. Texto original: Ariano Suassuna. Direção, concepção e adaptação: Ronaldo Saad. Produção: CPA - Centro de Pesquisa em Artes. Dias12,19 e 26 de julho, sextas-feiras, às 15h00. Duração 70 minutos. Classificação: livre - indicado para maiores de 3 anos.


Serviço
Dentro da programação do 39º Festival de Férias do Teatro Uol, até dia 28 de julho de 2024, spetáculos infantis com classificação livre acontecem de segunda a sexta-feira, às 15h00. Às segundas-feiras, "É como Diz o Ditado". Às terças-feiras, "Alice no País das Maravilhas". Às quartas-feiras, "Era Uma Vez...A Cigarra e a Formiga". Às quintas-feiras, "Chapeuzinho Vermelho". Às sextas-feiras, "O Autinho da Compadecida". Aos sábados e domingos, "João e Maria - A Casa de Doces". 

Ingressos: R$ 80,00. Televendas: (11) / 3823-2423 / 3823-2737 / 3823-2323. Vendas on-linewww.teatrouol.com.br. Horário de funcionamento da bilheteria em julho: segundas e terças das 13h00 às 15h00; quartas, quintas e sextas das 13h00 às 20h00; sábados das 13h00 às 22h00, e domingos das 13h00 às 20h00; não aceita cheques / Aceita os cartões de crédito: todos da Mastercard, Redecard, Visa, Visa Electron e Amex / Estudantes e pessoas com 60 anos ou mais têm os descontos legais / Clube Uol e Clube Folha 50% desconto.


Teatro Uol
Shopping Pátio Higienópolis - Av. Higienópolis, 618 / Terraço / tel.: (11) 3823-2323
Acesso para cadeirantes / Ar-condicionado / Estacionamento do Shopping: consultar valor pelo tel: 4040-2004 / Venda de espetáculos para grupos e escolas: (11) 3661-5896, (11) 99605-3094 / Patrocínio do Teatro Uol: UolL, Folha de S.Paulo, Bain Company, Banco Luso Brasileiro, Germed, Genesys e MetLife.

domingo, 7 de julho de 2024

.: Thiago Arantes ensina a como usar o realismo fantástico para se reencantar


"O contexto 'fantástico' é apenas um pano de fundo para refletir sobre a vida''
, Thiago Arantes.

Thiago Arantes é advogado, professor universitário e celebrante de casamentos, mas o que gosta mesmo é de escrever. Apaixonado pela literatura desde a infância, ele lê livros como uma maneira de continuar reencontrando o amor pela vida e agora busca transmitir esta relação para outras pessoas a partir do livro "A Terceira Margem da Folha" (compre neste link).

Em 12 contos, ele se inspira em autores clássicos como Gabriel García Márquez, Jorge Luis Borges, Murilo Rubião e Júlio Cortázar para refletir sobre temas como entraves pessoais, arrependimentos do passado, desilusão, compreensão sobre a morte e julgamentos. "Eu espero, com toda força possível, que, ao final de cada conto, o leitor possa ter a sensação nítida de que a história narrada é crível, por mais incrível que soe. Explico-me: cada narrativa traz consigo pretensas reflexões", afirma o autor.

Na entrevista abaixo, Thiago Arantes detalha mais informações sobre o lançamento, reflete sobre o poder do conto para narrar histórias e recorda o início como escritor. Compre o livro "A Terceira Margem da Folha", de Thiago Arantes, neste link.

O realismo fantástico tem raízes na literatura latino-americana. Como essa tradição literária influenciou sua escrita?
Thiago Arantes - 
Cortázar, Jorge Luis Borges, Murilo Rubião, Gabriel Garcia Márquez, Ruan Rulfo... Eu tenho muito orgulho destes escritores serem latino-americanos, porque é o que são: grandes escritores. Exemplifico: Cortázar tem um dos textos mais envolventes que conheço - não deixamos um conto até que o finalizamos. Já Borges ampliou meus horizontes da escrita de uma forma impensável - realidade, ficção e disfarçadas (falsas) informações abraçadas em suas linhas. Eu acredito que minha escrita caminhe mais pela prosa poética, porque o poeta nasceu antes e vive continuamente. Seja o que quer que escreva, em qualquer gênero, a poética, acredito, será a tônica.

Seu livro mistura elementos de realismo fantástico com o cotidiano. Como essa combinação pode afetar a percepção do leitor sobre a vida?
Thiago Arantes - 
Eu espero, com toda força possível, que, ao final de cada conto, o leitor possa ter a sensação nítida de que a estória narrada é crível, por mais incrível que soe. Explico-me: cada narrativa traz consigo pretensas reflexões e, no meu sentir, perceptíveis. Assim, o que “sobra na língua para degustar” são as meditações sobre o que conto. “Engasgo”, por exemplo, é uma mensagem bastante direta: diga o que quer ou isso vai te sufocar em algum momento. A aplicação da alegoria do texto à vida cotidiana é direta. Portanto, o contexto “fantástico” é apenas um pano de fundo para refletir sobre a vida.

Seus contos lidam com questões filosóficas e metafísicas profundas. Como você equilibra a profundidade desses temas com a necessidade de manter a narrativa envolvente e acessível para o leitor?
Thiago Arantes - Acredito que o conto, por si só, seja um elemento que agrega nesse sentido. Os contos são curtos e, na prescrição de Jorge Luis Borges, mantém aquilo que é essencial. Poderia dizer que a prosa poética é um diferencial, mas aqui podemos encontrar refratários ao estilo preferindo uma descrição mais objetiva como Hemingway. Cortázar também tem uma frase emblemática: “o romance ganha por pontos, mas o conto deve ganhar por nocaute”. Portanto, muito embora os temas caminhem, sim, por estas questões de alta indagação e reflexão, a narrativa há de ser envolvente para não enfadar um leitor. O texto deve ser lido em um fôlego só. Espero que meus contos tenham esta qualidade.

Além do realismo fantástico, que outras características literárias o leitor pode encontrar na sua obra?
Thiago Arantes - Muito embora tenha narrativas essencialmente literárias, no sentido de serem estórias, a maior parte dos contos aborda um aspecto metafísico e filosófico. Também passa temas naturais e essenciais ao ser humano, como vida, morte, destino, nossos entraves pessoais, julgamento, arrependimento, desilusão... Uma curiosidade não proposital é que, à exceção de um conto, meus personagens não têm nome. Eles nascem assim, e quem sou eu para querer modificá-los? Pensando sobre isso recentemente, acredito que, talvez, por alguns contos tratarem de temas elementares a todas as pessoas, o leitor pode se sentir como a personagem do conto. Outra condição que posso destacar também é que os lugares onde se passam os contos são bastante variados e, na maior parte, também não identificados. As estórias, portanto, podem se passar no imaginário dos leitores, em algum lugar que a memória (de um rio, de uma rua, de um bairro) lhes faça referência.

Você já publicou um livro de poesia e agora estreia na literatura de ficção, com os contos de “A terceira margem da folha”. Como surgiu esta veia literária?
Thiago Arantes - Aos doze anos de idade, em uma aula de redação particular que tinha após o colégio, enquanto todos reclamavam à minha volta, eu segurei uma página em branco e disse a mim mesmo: “Não sei o que vou ser nesta vida, mas serei um escritor”. Lembrei dessa cena, adormecida, em um momento muito delicado de minha vida. A partir dali, voltei a escrever, embora meu tempo seja escasso, e isso culminou no livro. Fato é que eu sempre li muito. Tenho uma medalha, de 1993, que recebi por ser a pessoa que mais leu na escola. Comecei a escrever, primeiro, textos esparsos, poemas e, a partir dos anos 2000, em diversos sites e revistas da região, com crônicas principalmente. A literatura sempre foi uma tábua de salvação na minha vida, e esse desejo-profecia aconteceu bem cedo em minha vida. Escrevo porque preciso, sem ter que ter um “porquê". Mecânica da alma é coisa injustificável. Com toda sinceridade do mundo: não estou querendo “mistificar” a coisa. Foi assim. É assim.


Sobre o autor:
Thiago Arantes nasceu em Patos de Minas, Minas Gerais. Escreveu poesias, contos e crônicas para diversos jornais e sites da região. Além de autor e compositor, é professor universitário, advogado e celebrante de casamentos. Pai do Bernardo e do Gabriel, tem na literatura e na música suas maiores paixões. Publicou o livro de poesias Lágrimas Latinas, Lacívias Linguísticas e teve um poema incluído na Antologia Sarau Brasil 2021. A terceira margem da folha é sua estreia no gênero da ficção e contos. Garanta o seu exemplar de "A Terceira Margem da Folha", escrito por Fhiago Arantes, neste link.

.: "A dor ensina com mais eficácia", afirma o escritor Fauno Mendonça

Em entrevista, Fauno Mendonça explica as referências do livro "Bragof", que mistura o real ao onírico em uma narrativa sobre um homem em busca dos sentimentos perdidos ao longo da vida. Foto: Fernando Pires

"Nem todos aprendem sorrindo; a dor ensina com mais eficácia", Fauno Mendonça

O livro "Bragof" (compre neste link), lançamento de Fauno Mendonça, não é uma leitura que entrega respostas mastigadas: ao contrário disso, a obra instiga os leitores a questionarem a si próprios. Quem somos? Para onde vamos? É possível mudar as decisões que tomamos no passado? Como escolher o melhor caminho? Essas perguntas permeiam o enredo protagonizado por um homem que embarca em uma viagem de trem rumo a Bragof, um lugar onde poderá reencontrar os sentimentos perdidos durante a vida.

Ao fazer um paralelo com questões existenciais, a narrativa fantástica serve como uma metáfora para a jornada interior que todos enfrentam quando tentam entender e reencontrar aspectos esquecidos ou reprimidos de si. Em um mundo onde a pressa e a superficialidade dominam, o livro usa a ficção para convidar a pausar, refletir e procurar um significado mais profundo na essência humana, enfatizando a importância de lidar com os desafios emocionais que muitas vezes são evitados na correria do dia a dia. 

Nesta entrevista, o autor explica as simbologias por trás da obra, as relações da história com elementos kafkanianos e a importância do desconforto ao longo da leitura – sentimento que também é responsável por movimentar a vida. Compre o livro "Bragof", de Fauno Mendonça, neste link.

No seu mais novo romance, você traz um enredo profundo em relação à exploração dos sentimentos humanos. O protagonista embarca em um trem rumo a Bragof e, em meio ao percurso, é confrontado com as escolhas que fez na vida. O que seria “Bragof” e como chegar a ele pode ser determinante na vida do protagonista?
Fauno Mendonça - "Bragof" pode ser um medo, um sonho ou um lugar. Cada pessoa define seu destino, e Bragof representa a busca incessante para fugir de si mesmo e das intempéries do mundo ou a busca para alcançar a glória existente no curso da vida.  Não há uma definição plena para o título do livro, isso dependerá de cada um. Se o leitor prestar atenção, poderá abstrair o verdadeiro sentido de "Bragof. Cabe a ele essa escolha de descobrir a sua compreensão, e isso também vale para o protagonista da obra.

De que forma você utiliza elementos kafkanianos na trama para explorar temas como culpa, absurdidade e a fugacidade da vida?
Fauno Mendonça - Kafka realmente demonstrava a realidade usando ferramentas linguísticas no plano do absurdo. Penso que a culpa, o próprio absurdo e a fugacidade da vida encontram-se absortos no cotidiano, porém, poucas pessoas têm consciência disso. De modo que, no âmbito do nosso tempo de cegueira coletiva, busco aclarar esses elementos para desmascarar os falsos sentimentos no desiderato de as pessoas vislumbrarem os melhores caminhos no momento de decidir seus rumos.

A narrativa de "Bragof” desafia a racionalidade ao misturar o real com o onírico. Como acredita que esta abordagem literária possa despertar a percepção do leitor sobre a realidade e a natureza humana?
Fauno Mendonça - Temos dois mundos muito nítidos, o físico e o introspectivo. Ambos são reais, pois a realidade, grosso modo, é aquilo que se acredita. Também é preciso ter claro que não temos conhecimento da exatidão da realidade. Partindo dessas premissas, busquei na narrativa apontar todas essas gradações. Acredito que o leitor poderá perceber essas nuances e compreender com mais nitidez sua própria jornada.

De que forma você usa o desconforto e a frustração do leitor com as decisões tomadas pelo protagonista como ferramentas para provocar uma reflexão sobre as próprias vidas e escolhas?
Fauno Mendonça - Nem todos aprendem sorrindo, normalmente a dor ensina com mais eficácia. Quando há sofrimento próprio ou alheio, os sentimentos ficam mais alertas para fugir do erro. O protagonista erra como qualquer pessoa, e isso causa desconforto. Contudo, vale ressaltar que esses erros são cometidos comumente por todos a todo momento, então, a frustração do erro poderá acender a luz vermelha para que esses erros não mais sejam cometidos.

Considerando que o personagem principal não tem um nome citado na narrativa, qual você acha que é o impacto desse anonimato na identificação do leitor? 
Fauno Mendonça - Quando escrevi o livro “A Busca dos Loucos” também não indiquei nome ao protagonista. Fiz uso desse anonimato novamente na obra "Bragof" para lhe dar mais universalidade.


E como isso serve para universalizar a experiência de busca por significado e enfrentamento de conflitos internos?
Fauno Mendonça - A ausência de seu nome, penso, salvo melhor juízo, aproxima o leitor aos sentimentos vividos na narrativa. Sempre busco chamar o leitor para o lugar do protagonista para que haja mais identificação. Um autoconhecimento ao ver a si mesmo no próprio personagem principal.

Sobre o autor
Fauno Mendonça nasceu em Goiânia, em 1968, e formou-se em Direito na década de 1990. Trabalhou por anos como advogado e atualmente atua no Poder Judiciário, em Brasília. Como escritor, publicou cinco livros: “A Busca dos Loucos”, “Ao Norte do Silêncio”, “Encontre-se”, "D. e o Procurador” e "Bragof". A publicação “Encontre-se” também está disponível no formato de audiolivro. Garanta o seu exemplar de "Bragof", escrito por Fauno Mendonça, neste link.

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