terça-feira, 9 de novembro de 2004

.: Navalha plástica ou as gracinhas sem graça de um diretor

Por: Luiz Horácio
Em novembro de 2004


Que as artes andam promiscuas estamos todos cansados de saber. Com boa vontade muitas vezes até encontramos justificativas relevantes para tal acontecimento. Mesmo assim algumas iniciativas deixam o bem intencionado espectador com a pulga atrás da orelha. Que mania boba que nós temos de querer saber os por quês das coisas.

A montagem de Navalha na Carne pelo grupo paulista Caixa Preta atinge em parte seus objetivos mas também deixa a desejar com equívocos dignos de iniciantes. Plínio Marcos não merece.

Assim como Nelson Rodrigues, Plínio Marcos já foi vítima dos grandes e dos falsos encenadores que dominam a cena teatral em nosso país. Joaquim Goulart não pode ser incluído na lista dos falsos mas também deve guardar distância dos grandes. Sua experiência em teatro, no entanto, o credencia a realizações menos equivocadas que esta montagem de Navalha na Carne que esteve em cartaz no Teatro Café Pequeno, no Leblon-Rio de Janeiro.

A ação transcorre no submundo com três personagens, fiel retrato da degradação humana, numa relação patética de interdependência: uma prostituta (Neusa Sueli), um cafetão(Vado) e um homossexual (Veludo). Prato cheio para a caricatura não fosse o olhar talentoso e raro de Plínio Marcos, sentinela atenta e zelosa de nossas misérias.Trata-se de missão quase impossível a tentativa de estragar uma peça de Plínio Marcos, na escola de teatro da UNI-RIO o crime é executado semestre sim semestre também graças a ausência de habilidade óbvia, visto que seu texto não exige nada além de talento, esqueçam cenários sofisticados, trilhas sonoras pomposas ou figurinos assinados por grandes estilistas. Montar texto de Plínio requer excelência em todas as instâncias, já era para terem aprendido que o importante é o texto depois uma encenação fiel ao mesmo.

No caso em questão a fidelidade foi maculada. Estou tentando não acreditar que Joaquim Goulart seja mais um entre tantos diretores que se criaram acreditando no engano que o “dedo do diretor” tem que aparecer de forma evidente. Estou tentando mas também já estou desistindo pois o rapaz conviveu durante longo período com Gerald Thomas e ainda estou por ver outro, se bem que aqui no Rio está cheio desses anônimos babacas, mais afeitos a uma gracinha no palco. E o pior, os atores, por vezes calejados, se sujeitam.

Voltando ao fio da Navalha. Comecemos pela cenografia: não há justificativa para tanta porta. Trilha Sonora: trivial.Figurino: Adequado em Vado e Neusa Sueli, caricato em Veludo.
Quanto a cena propriamente dita , os grandes equívocos. Aqui entra em cena a necessidade do diretor em mostrar que ele existe e precisa que um critico qualquer, por mais obscuro que seja, perceba e comente “a sua versão dos fatos.”

O espetáculo é exageradamente preso às marcações, coreografado da forma mais “grupo escolar” possível e com algumas conclusões inexplicáveis, Veludo, conforme assinalarei na seqüência .
Cácia Goulart compõem sua Neusa Sueli com exageros além do solicitado no texto mas devido a concepção da direção caso não procedesse dessa forma é bem provável que a montagem caísse num tédio profundo pois Genésio Guerra-Vado- é muito fraco, monocórdio, inexpressivo, dono de uma dicção sofrível e pelas pistas que deixou faz pensar se não estaria melhor num espetáculo de dança.Por sua vez Edmilson Cordeiro conseguiu compor um Veludo cujos estigmas ficavam à flor da pele, viado, ladrão, pobre, frágil.

Reside em Veludo uma solução inexplicável anunciada acima. Que a participação do ator é marcante isso é indiscutível embora tais personagens não sejam das mais difíceis de construir.Pode perguntar a qualquer estudante de teatro. No entanto uma pergunta se faz necessária: o que levou o diretor a manter em cena Veludo, voltado pra parede, estático e sem nenhuma participação na cena? Chamar atenção, desviar atenção, gracinha de diretor? Aposto na última. E se tem algo que não combina de maneira nenhuma com Plínio Marcos são exatamente essas tais gracinhas. A Navalha de Joaquim Goulart tem muito mais plástica que prática. Lamentável.



FICHA TÉCNICA
Texto: PLINIO MARCOS
Direção: JOAQUIM GOULART
Elenco: CÁCIA GOULART, EDMILSON CORDEIRO, GENÉSIO GUERRA
Preparação de ator: INÊS ARANHA
Cenografia e Figurino: ANDRÉ CORTEZ
Iluminação: GUILHERME BONFANTE
Trilha Sonora: JOAQUIM GOULART
Preparação Física e Coreografia de Luta: LUIS PELEGRINI
Maquiagem: ADRIANA VAZ
Fotografia: LENISE PINHEIRO
Operadora de Som: TATIANA BUENO
Operador de Som: VEX
Produção: MARIA SIMAN
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