quarta-feira, 2 de fevereiro de 2005

.: Entrevista com Orlando Paes Filho, escritor

"Sempre gostei muito de ler e essa paixão se estendeu, também, ao hábito de escrever." - Orlando Paes Filho

Por: Gustavo Klein e Helder Moraes Miranda

Em fevereiro de 2005



Considerado o Tolkien brasileiro, o autor do livro mais vendido na última edição da Bienal do Livro do Rio - Angus, que em breve será adaptado para o cinema - fala sobre sua infância pobre, literatura, sétima arte e do fato de se considerar um nerd.



RESENHANDO - Você estava preparado ou podia imaginar que Angus faria o sucesso que está fazendo, a ponto de despertar o interesse de estúdios de Hollywood para uma possível adaptação para o cinema e de ser um dos maiores sucessos da Bienal do Livro do Rio?
ORLANDO - Eu esperava que o livro fosse, sim, fazer sucesso. Mas não achava que estaria vivo para ver isso. 


RESENHANDO - Você lia muito quando era criança?
ORLANDO - Lia bastante, sempre fui fascinado por literatura. Mais quando era jovem do que na infância. 


RESENHANDO - Que tipo de leitura? Já era fã de Fantasia? Quais eram seus autores preferidos?
ORLANDO - Especialmente Ficção Científica. Gostava muito de autores como Ray Bradbury, Júlio Verne e Isac Asimov. Não era fã de Fantasia, acho que o mais incrível que li nesse campo foi A Terra Oca, uma teoria interessantíssima de um cientista. Me interessava muito por livros que tivessem idéias extraordinárias, que fugissem do comum. Também me lembro de Eram Os Deuses Astronautas?, que era leitura comum nas escolas, na época. 


RESENHANDO - Como nasceu Angus?
ORLANDO - Sempre gostei muito de ler e essa paixão se estendeu, também, ao hábito de escrever. Escrevia todas as noites, isso passou a ser um hábito, se tornou rotina. 


RESENHANDO - O que escrevia?
ORLANDO - Contos de Ficção Científica, principalmente. Quanto ao Angus, foi interessante, porque ele veio de uma vez, a idéia nasceu completa na minha cabeça: o conceito, o visual, as características, a personalidade. Tudo. Desenvolvi a espinha dorsal da história em três meses, escrevi o argumento em uma máquina de escrever, daquelas bem velhas, e o registrei na Embrafilme no mesmo ano. 


RESENHANDO - Na Embrafilme? Nessa época, antes de escrever o livro, já pensava em transformá-lo em filme?
ORLANDO - Sempre fui muito pobre. Nunca tive grana pra nada. Mas sempre acreditei nos meus sonhos. Sonhar não custa dinheiro. Sonhei bem alto. Imaginei meus personagens em jogos de computador, card games e RPGs. Meu livro sendo vendido acompanhado de um CD com a trilha sonora. Bonequinhos, camisetas. Igual a qualquer blockbuster americano, como Star Wars ou O Senhor dos Anéis. 


RESENHANDO - Você enfrentou muitas dificuldades nesse período?
ORLANDO - Como eu disse, nunca tive grana. Tive que trabalhar muito, em tudo o que você puder imaginar. Trabalhei, por um bom tempo da minha vida, de dia e de noite. Às vezes dormia duas horas por noite. Trabalhei como cobrador, como segurança de boate. Mas sempre achei que essa experiência foi muito rica. Talvez uma vida fácil não me daria a bagagem que eu preciso, agora, para desenvolver minhas histórias. 


RESENHANDO - De onde você recebe influências? Muita coisa de tevê, cinema, quadrinhos, livros?
ORLANDO - Não curto quadrinhos, embora adore Frank Miller e, claro, Conan, que é fantástico. Televisão, na minha casa, pode ficar desligada por meses que nem vou perceber. Agora, filmes e livros me dominam por completo. Leio muito, vejo muitos filmes. Ray Bradbury e Edgar Allan Poe são minhas leituras favoritas. 


RESENHANDO - Esses 25 anos entre a idéia e a concretização do livro como foram? Passou esse tempo reunindo elementos até decidir escrever ou a obra foi sendo criada, aos poucos, ao longo de todo esse tempo?
ORLANDO - Quando registrei a história, em 1981, tinha 19 anos. Desde então, fiz muita coisa. Precisava aprender como funcionava esse mercado, como as coisas aconteciam, ter uma boa idéia de todo o processo. Pedi emprego em empresas de entretenimento. Me especializei na área técnica e jurídica, de direitos autorais e licenciamento. Isso, claro, sem perder o foco na criação. 


RESENHANDO - Como você, vários bons autores brasileiros, conhecidos ou não, têm lançado obras na área de Fantasia e até de Terror. É um mercado, portanto, em expansão. Você acha que ainda existe, por parte do mercado mais do que do público leitor, preconceito contra quem escreve nesse gênero?
ORLANDO - Passei por situações muito ruins quando apresentei o projeto às editoras brasileiras. Enfrentei deboche, olhares superiores. Fui até ridicularizado. Isso é difícil, muito difícil. Sentia que os editores não estavam interessados, que queriam sei lá o quê. Enfim: a experiência, aqui, foi horrorosa, com exceção dos meus parceiros atuais (a editora Arx Jovem, do grupo Siciliano). Acho que o mercado não estava preparado para o fantástico ou o épico. Por outro lado, houve um gasto violento da minha parte, eu acreditava na minha idéia. Investi tudo o que tinha em uma feira de licenciamentos nos Estados Unidos, montei um estande ao lado do estande de O Senhor dos Anéis. Vi que, ao contrário daqui, houve um entusiasmo muito grande por parte de executivos de fora, das grandes empresas de entretenimento. Entusiasmo a ponto de o vice-presidente de um dos grandes estúdios marcar almoço comigo e se demonstrar realmente interessado.


RESENHANDO - Foi o impulso que faltava para que você decidisse, finalmente, lançar sua obra?
ORLANDO - Isso me contagiou, me fez ver que eu não devia levar em consideração opinião de quem não entende nada. Fiz de tudo pelo personagem, pelo meu sonho. Todos os sacrifícios. Inclusive de falta de conforto, de abrir mão de muita coisa em nome desse sonho maior. A sorte é que minha esposa, que viveu isso tudo comigo, também acreditou em Angus. 


RESENHANDO - Até que O Senhor dos Anéis chegou e os editores que o deixaram de lado começaram a chorar lágrimas de sangue...
ORLANDO - O Senhor dos Anéis abriu portas para muita gente, foi importante. Mas, para ser sincero, não acho que Angus seja um livro de Fantasia. O visual é, mas há muito mais de realidade do que de fantasia na história. É um livro que fala muito de mística cristã, de um período histórico. 


RESENHANDO - A editora pretende lançar um livro da série por semestre. Você levou 25 anos para lançar o primeiro. Será possível cumprir esse cronograma?
ORLANDO - A idéia de toda a obra, toda a saga, está pronta. Tenho 1.400 páginas manuscritas, que incluem todas as histórias que quero contar nesses sete livros. O primeiro livro eu comecei a escrever no ano passado e terminei em fevereiro último. Depois de toda a idéia concebida, fica bem mais fácil desenvolver. Mesmo assim, será um livro por ano. Tenho muito o que aprender, ainda. Vou passar um mês na Universidade da Catalunha, estudando História. Estudarei os templários. Os verdadeiros templários, não essa versão romantizada que é muito comum hoje em dia.
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