sexta-feira, 21 de agosto de 2020

.: Entrevista exclusiva: livro conta os bastidores do disco Clube da Esquina

Por Luiz Gomes Otero, jornalista e crítico musical. 

Já se imaginou ficar frente a frente com seus ídolos da música brasileira  e poder organizar e elaborar um trabalho literário voltado para preservar a memória de seu trabalho? Pois foi isso que aconteceu com Andréa Estanislau. Ela organizou a elaboração do livro "Coração Americano", que conta os bastidores da gravação do álbum "Clube da Esquina", capitaneado por Milton Nascimento e Lô Borges e que se tornou um marco na nossa cultura musical popular. 

Andréa é mestre em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais onde desenvolveu como recurso educativo o curso de extensão Clube da Esquina: Patrimônio Cultural de Belo Horizonte. O livro chega em 2020 na sua segunda edição com textos escritos pelo personagens do chamado movimento musical mineiro, que na verdade sempre foi e será universal por natureza. Milton Nascimento, Márcio Borges, Ronaldo Bastos, Lô Borges, Toninho Horta e outros que faleceram mais recentemente, como Fernando Brandt e Tavito.

A obra funciona como uma viagem no tempo, mostrando um grupo de músicos amigos que se uniram em torno de Milton e Lô e contribuíram, cada um do seu jeito, na elaboração e concepção dos arranjos e ideias de produção musical. Em entrevista para o Resenhando, Andréa conta como foi a experiência de organizar um trabalho de tamanha importância cultural, hoje em dia contribui para a formação de educadores e inspira músicos de várias gerações. “Para mim o Clube da Esquina é a síntese de uma amizade sincera e da união feliz de talentos natos da nossa música”.

Resenhando - Como foi que você, que não era do meio artístico, conseguiu estabelecer esse contato com tantos músicos e compositores diferentes?
Andréa Estanislau - Foi realmente um desafio. Nos anos 80, eu passei a ouvir com atenção essa música, que surgiu na minha terra natal. E percebi que havia pessoas da minha geração que não conheciam essas músicas. Mais adiante, desenvolvi um trabalho de conclusão de curso na Faculdade. Esse trabalho acabou crescendo com o incentivo de amigos. Passei a buscar como estabelecer contato com esses personagens, que também eram e ainda são meus ídolos. O primeiro foi Beto Guedes. A esposa dele ficou entusiasmada com o projeto e me deu os contatos dos demais. Claro que, com o apoio do Beto, as portas acabaram se abrindo mais facilmente. Mas o que senti é que todos acabaram gostando do projeto do livro e me mostraram as fotos que ilustram a publicação, além de contribuírem com textos. A capa mostra quase todos no estúdio e dá uma ideia do nível de amizade e de comprometimento com as canções que eles estavam produzindo para o álbum.

Resenhando - Parte dos textos foi escrita pelos próprios personagens. O Fernando Brandt, por exemplo, deixou ali um importante registro de como surgiu a parceria dele com Milton, que começou ainda nos anos 60, com "Travessia". Foi difícil fazer eles relatarem isso?
Andréa Estanislau - Pelo contrário. A coisa fluiu naturalmente porque todos meio que compraram a ideia. E esse episódio que o Fernando conta é da época dos Festivais, quando Milton ganhou o prêmio de melhor intérprete com a canção "Travessia". O Brandt conta que ali, ao ver o Milton ganhar o prêmio com uma canção feita em parceria, ele percebeu a profissão que ele iria escolher para trabalhar. É algo muito emocionante ver como as coisas se consolidaram nos anos seguintes até chegar no Clube da Esquina.

Resenhando - Nessa época, em 1972, o Milton já era um nome conhecido. Ele funcionava como uma liderança nesse grupo?
Andréa Estanislau - Com certeza. Milton já tinha até canção gravada pela Elis Regina naquela época. Os demais estavam ainda iniciando a sua caminhada na música, buscando conquistar o seu espaço. Lô tinha apenas 19 anos! Ele contou que foi difícil convencer a família a deixar ele ir para o Rio de Janeiro para gravar o disco. Mas podemos dizer que o MIlton foi uma espécie de líder natural. Todos contribuíram para que o projeto do disco desse certo e acho que o resultado dele fala por si só. É a prova da amizade sincera e da união feliz de talentos natos de nossa música.


Andréa Estanislau organizou a elaborou o livro "Coração Americano", que conta os bastidores da gravação do álbum "Clube da Esquina". Foto: Nina Estanislau. A foto da capa de "Coração Americano" é de Mário Thompson. Esta é a única foto que tem três letristas (Márcio Borges, Fernando Brant e Ronaldo Bastos), além Milton Nascimento, Lô Borges, Beto Guedes, Wagner Tiso. 

Resenhando - É possível chamar o Clube da Esquina de um movimento, como foi a Tropicália nos anos 60?
Andréa Estanislau - Eu não considero um movimento. Porque todos estavam ali para a música e pela música. Não havia barreiras ou tabus a serem quebrados. Apenas produziram canções que hoje, mais de 40 anos depois, ainda servem como referência e fonte de inspiração para músicos das mais variadas gerações. E por isso merece ter contada a história em livro.

Resenhando - Fale sobre o curso de extensão ministrado em Minas Gerais sobre o Clube da Esquina.
Andréa Estanislau - O curso de extensão Clube da Esquina: Patrimônio Cultural de Belo Horizonte foi realizado no Espaço do Conhecimento da Universidade Federal de Minas Gerais, em outubro e novembro de 2019. O curso foi pensado em dois módulos sequenciais, o primeiro mais teórico com a contextualização dos conceitos e o segundo, um módulo prático, com os participantes desenvolvendo  atividades didáticas que relacionam a música com a cidade. Foi voltado para professores e estudantes de licenciatura, tendo como objetivo preparar o professor para promover a Educação Patrimonial nas escolas a partir das canções do Clube da Esquina. Esse ano, em função da pandemia, ainda não foi possível realizar isso. Mas iremos fazer com certeza mais adiante.

Resenhando - Como as pessoas podem ter acesso aos seus projetos? O livro pode ser adquirido?
Andréa Estanislau - Essa obra literária foi realizada com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura da Prefeitura de Belo Horizonte. Com tiragem de mil exemplares, “Coração Americano” será distribuído a centros culturais, bibliotecas, escolas e museus. Vou gravar uma entrevista para ficar no site da prefeitura. E mantenho um site onde coloco as minhas ações ligadas ao livro e ao curso de extensão. O endereço é www.coracaoamericano.com.br

"Cais"

"Trem Azul"

"San Vicente"

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