Criador de clássicos como "Tieta" e "Senhora do Destino", Aguinaldo Silva está de volta com "Três Graças", nova aposta da TV Globo para o horário nobre. Foto: Globo/Edu Lopes
Dramaturgo e escritor, Aguinaldo Silva retorna à teledramaturgia da TV Globo seis anos após "O Sétimo Guardião" (2019) com a nova novela das nove, "Três Graças". Jornalista de formação e apaixonado por literatura, o autor consolidou uma das carreiras mais marcantes da televisão brasileira, com títulos que definiram épocas. Ao lado de nomes como Dias Gomes, Gilberto Braga, Leonor Bassères e Ricardo Linhares, assinou sucessos como "Roque Santeiro" (1985), "Vale Tudo" (1988), "Tieta" (1989), "Pedra Sobre Pedra" (1992), "Fera Ferida" (1993), "A Indomada" (1997), "Senhora do Destino" (2004), "Fina Estampa" (2011) e "Império" (2014) - essa última vencedora do Emmy Internacional de melhor novela.
Agora, em parceria com Virgílio Silva e Zé Dassilva, Aguinaldo apresenta uma trama contemporânea ambientada em São Paulo, que reflete o Brasil real por meio de três mulheres unidas por um mesmo destino: tornaram-se mães na adolescência e precisaram enfrentar sozinhas as desigualdades de uma sociedade que insiste em puni-las por existir. "Três Graças" mistura crítica social e folhetim clássico - marcas registradas do autor -, e promete revisitar a força feminina, a ironia e os dilemas morais que sempre fizeram parte das grandes histórias elaboradas por ele. Compre os livros de Aguinaldo Silva neste link.
Do que trata "Três Graças", a nova novela das nove?
Aguinaldo Silva - "Três Graças" fala de três mulheres que foram mães muito cedo, aos 15 anos, que não tiveram o apoio dos pais das crianças e foram à luta, passaram por situações extremas. Elas levam uma vida muito parecida com a vida dos nossos espectadores. Ou seja, elas batalham, são otimistas, têm fé no futuro e se envolvem com histórias típicas de um folhetim. É uma ficção que tem o privilégio de poder se inspirar na realidade. Nossa protagonista, a Gerluce (Sophie Charlotte), é uma mulher inconformada com a injustiça, com as maldades que assolam sua comunidade e sua família, numa São Paulo que abriga milhões de brasileiras como ela. Ela repetiu o destino da mãe Lígia (Dira Paes): engravidou de Joélly (Alana Cabral) na adolescência. Mas, quando a gestação precoce da filha se confirma, ela vai fazer de tudo para impedir que Joélly renuncie a seus projetos e ambições, assim como ela e a mãe foram obrigadas a fazer. Ao mesmo tempo, ao se ver diante de corruptos que prejudicam uma multidão de doentes em benefício próprio e com a mãe entre a vida e a morte, Gerluce encara um dilema. Até onde ir quando se precisa batalhar pela sobrevivência?
A novela vai trazer uma história contemporânea, que se passa na maior metrópole da América Latina, São Paulo. Que assuntos da atualidade são abordados na trama?
Aguinaldo Silva - A novela se passa em dois ambientes: a comunidade fictícia Chacrinha, onde vivem os personagens mais carentes, e os bairros nobres de São Paulo, onde estão os responsáveis pelo crime dos remédios falsos. Esses mundos se cruzam porque Gerluce (Sophie Charlotte) trabalha na casa de Arminda (Grazi Massafera), uma das vilãs da história. Estamos criando uma novela com uma linguagem bastante popular e abrangente, que fala do dia a dia das pessoas, dos desafios que se encontram em uma grande metrópole, de quem sai às 5h da manhã e pega três ônibus para ir trabalhar. Ao mesmo tempo, a novela também fala sobre os dramas pessoais de cada um e de como é possível ser otimista e positivo diante das desigualdades e injustiças. É uma obra da atualidade, do ônibus, do metrô, do trem, mas não será uma novela naturalista: a ficção é a base para a nossa criação. Ainda assim, a trama propõe reflexões importantes a partir de temas hoje discutidos. Teremos, no núcleo das protagonistas, a questão da gravidez na adolescência; falaremos de corrupção e falsificação de remédios. Também vamos abordar aspectos da nossa sociedade. Tudo isso num contexto ficcional.
A gravidez na adolescência é um tema de destaque na novela. Como surgiu a ideia de retratá-lo na obra?
Aguinaldo Silva - Quando eu estava escrevendo "Duas Caras", por uma razão que tinha a ver com a trama da novela, fui fazer uma pesquisa na maternidade Leila Diniz, no Rio de Janeiro. Quando cheguei lá, logo cedo, tinha uma fila enorme de mulheres esperando para serem atendidas, e eu percebi que a maioria dessas mulheres eram meninas. Isso me chocou profundamente, porque eram adolescentes grávidas, de 15, 16 anos. Algumas ainda com jeito meio infantil. Um amigo que foi comigo na ocasião falou uma frase que me marcou: “Você está vendo algum homem aqui?”. Ou seja, eram mães solo, o que me tocou demais. Isso foi lá em 2007, mas eu fiquei com aquela ideia da fila de meninas grávidas à espera de atendimento da maternidade. Achei que um dia eu teria de escrever sobre elas, e foi, na verdade, desse meu compromisso que surgiram essas três Graças: três mulheres que foram mães muito precocemente, sem que houvesse nenhum homem na família que as apoiasse nesse processo.
A novela também trata de um esquema criminoso de falsificação de remédios. Você se baseou em algum episódio verídico para trazer esse assunto para a história?
Aguinaldo Silva - Esse é mais um tema que parte da realidade para a ficção, muito embora a novela não seja um retrato fiel, porque a linguagem da dramaturgia é outra. Mas o noticiário fala de casos assim, de remédios falsificados, de apreensão, de ação policial contra fábricas clandestinas. É um assunto grave. Já houve casos no Brasil em que pessoas foram enganadas ao tomar medicamentos placebo, que não fazem efeito. Lembro do caso de mulheres que engravidaram por causa de pílulas anticoncepcionais feitas de farinha, isso em 1998, e ficaram anos buscando reparação. Nessa novela, a fábrica chama-se “casa de farinha”, porque os "medicamentos” são feitos dessa matéria-prima. A mensagem que queremos passar com essa trama é a confrontação que existe na sociedade brasileira entre as pessoas que trabalham e dão tudo de si, e pessoas muito egoístas que só visam o dinheiro e pouco se importam com quem está sendo prejudicado pelo mal que praticam.
De que forma a escultura das "Três Graças" aparece na história?
Aguinaldo Silva - A novela se chama "Três Graças" porque é o sobrenome das três protagonistas, mas também porque existe na casa da Arminda (Grazi Massafera) uma escultura neoclássica que se chama "Três Graças". Nós criamos um escultor chamado Giovanni Aranha, que é italiano, e que fez aquela obra especificamente. Arminda e Ferette (Murilo Benício) usam essa estátua de uma maneira bastante ilegal. Ela é mantida no quarto, na casa dela, e nunca é exposta. Ninguém sabe mais que essa estátua está com eles, é um mistério, porque ela guarda um segredo que vai ser revelado. Gerluce (Sophie Charlotte) será a primeira a desconfiar de seu verdadeiro valor.
Suas novelas anteriores foram marcadas por grandes personagens, como as vilãs Perpétua, de "Tieta", Nazaré Tedesco, de "Senhora do Destino", e mulheres fortes, como Tieta, da novela homônima, e Maria do Carmo, também de "Senhora do Destino", além dos carismáticos Crô de "Fina Estampa" e o comendador Zé Alfredo, de "Império". Em que personagens está apostando em "Três Graças"?
Aguinaldo Silva - Estamos apostando muito na protagonista, a Gerluce, que tem um caráter multifacetado e é sempre altamente positiva. Mas tem personagens muito interessantes, como a Josefa (Arlete Salles), a mãe da Arminda (Grazi Massafera). Ela sabe que a filha é uma bandida e faz o possível para infernizar a vida dela. Eu uso inclusive a suposta falta de memória, que ela realmente tem, para atrapalhar a vida da filha e castigá-la. Ela não é uma velhinha doce, ela é terrível. Tem a Arminda, que é uma daquelas minhas vilãs completamente ensandecidas, que são capazes de fazer as coisas mais absurdas e, ao mesmo tempo, parecer que são engraçadas, mas não são; são cruéis. Eu tenho toda uma linhagem de mulheres vilãs, além das heroínas, que causaram muito rumor. Foi o caso da Nazaré (Renata Sorrah em "Senhora do Destino"), que até hoje continua viva andando aí pelas ruas do Rio de Janeiro (risos).
Como tem sido criar e escrever essa história ao lado do Virgílio Silva e do Zé Dassilva?
Aguinaldo Silva - Tem sido muito legal, com a gente não tem tempo ruim. Começamos a trabalhar eu e o Virgílio, e então chamamos o Zé. Formamos o trio dos Silvas. É um trabalho que funciona como uma fábrica de montagem, somos três autores. Eu me acostumei a trabalhar em equipe no jornalismo. Na minha época, você tinha a obrigação de diariamente botar um jornal nas bancas, então todos trabalhavam para isso.
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