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sexta-feira, 19 de julho de 2024

.: Entrevista com Claudio Leal e Rodrigo Sombra, organizadores de "Cine Subaé"


Por 
Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. Fotos: Erick Schons e Raphael Urjais

Claudio Leal e Rodrigo Sombra são os organizadores de "Cine Subaé - Escritos sobre Cinema (1960 –2023)", o novo livro de Caetano Veloso, publicado pela Companhia das Letras. O lançamento reúne críticas da década de 1960, publicadas no santamarense Archote e em periódicos da capital baiana, onde Caetano atuou na juventude como crítico e sonhava em dedicar sua vida à direção de filmes. Nesta entrevista exclusiva, eles falam sobre o livro, um poderoso testemunho que atesta o impacto que o Cinema Novo, as películas exuberantes norte-americanas, o neorrealismo italiano e o existencialismo das fitas francesas impactaram a formação cultural de Caetano Veloso. 


Resenhando.com - Como você poderia definir a relação do Caetano com cinema na época em que os textos foram escritos?
Claudio Leal - O livro abrange mais de 60 anos de produção crítica de Caetano. Nesse arco temporal, a relação dele com o cinema sofreu transformações, mas foi inalterável o interesse em acompanhar o meio cinematográfico. Numa síntese, posso dizer que ele partiu da posição de crítico, na juventude, para a de colaborador e interlocutor de cineastas, nos anos 1960 e 1970, quando realizou trilhas musicais, dentre as quais se destaca a de "São Bernardo" (1972), que repercute em seu disco experimental "Araçá Azul" (1973). Nessa fase, o imaginário do cinema também esteve presente em suas canções. A partir dos anos 80, essa relação tende a se aproximar de seu antigo desejo de ser cineasta. Ele dirige clipes e seu único longa, "O Cinema Falado", de 1986. Nos últimos anos seu vínculo tem sido semelhante ao dos anos 1960 e 1970, com a composição de trilhas e canções originais, além de dialogar mais frequentemente com cineastas como Cacá Diegues, Mauro Lima, Jorge Furtado e Guel Arraes. E houve o documentário "Narciso em Férias" com os diretores Renato Terra e Ricardo Calil.


Resenhando.com - É possível afirmar, hoje, que o artista suprimiu o crítico de cinema?
Claudio Leal - O artista nunca suprimiu o crítico em nenhuma fase de sua trajetória. O Caetano cancionista praticou o ensaísmo em seus discos e jamais abandonou o gesto de revisão crítica da cultura brasileira em canções, textos e entrevistas. "Cinema Novo", parceria com Gilberto Gil no álbum "Tropicália 2", de 1993, é um desses momentos em que o ensaísta dá as caras - e, neste caso, o crítico de cinema. 


Resenhando.com - Se pudessem fazer um filme sobre Caetano Veloso e fosse preciso escolher um recorte sobre a vida dele, qual seria?
Rodrigo Sombra - Eu faria um filme sobre sua adolescência em Santo Amaro. Em mais de uma ocasião, Caetano declarou que, não importasse a idade, continuava a se sentir um adolescente. Quando fez 70 anos, disse ainda sentir-se como um rapaz de 14.  Enquanto desvaloriza a infância, para ele uma experiência limitante, marcada por inúmeras restrições, mas que tendemos a idealizar, a adolescência revelou-se um território rico em possibilidades e maravilhamentos. A descoberta da sexualidade, o esboço de aspirações artísticas e intelectuais, as tensões entre um senso de pertencimento à origem interiorana, a Santo Amaro, e as seduções de um mundo transbordante que se anunciava nas imagens do cinema, nas canções no rádio, na literatura. Tudo isso permeia esse período de sua vida. Mais que um momento formativo distante no tempo, preso ao passado, a adolescência tem repercussões perenes em sua personalidade.


Resenhando.com - Quem seria o diretor ideal para dirigir esse filme idealizado por você?
Rodrigo Sombra - Escolheria a francesa Claire Denis. É na adolescência que testemunhamos as mais radicais mutações do corpo, e ninguém filma as nuances da carne como ela. Ninguém senão Denis olha as relações entre os corpos, e o lugar destes nos espaços, de modo a dotar cada imagem de igual naturalidade, erotismo e mistério. E ser adolescente é viver o mistério de descobrir-se outro, adulto, que essa fase da vida precipita.


Resenhando.com - Por que as pessoas precisam ler "Cine Subaé"?
Claudio Leal - Com o livro, pretendemos iluminar uma produção crítica que influenciou seu tempo, moveu as artes, produziu um diálogo fecundo entre música, poesia e cinema. Além disso, em vários momentos, Caetano entrelaça história e linguagem. Nas críticas e ensaios, ele observa a tradição e as ondas novas, sem temer a apreciação dos modismos. Tudo isso pode trazer ao leitor um percurso do desenvolvimento das artes nas últimas seis décadas, no Brasil e no mundo, da "nouvelle vague" ao cinema pernambucano de hoje. 


Resenhando.com - Há alguma faceta de Caetano Veloso, no livro, que o público não conhece?
Rodrigo Sombra - Caetano dirigiu um único longa, "O Cinema Falado", de 1986. O filme dividiu o público e a crítica, mas prevaleceram na memória social as reações negativas, sobretudo pela estridência dos ataques de alguns cineastas brasileiros inconformados em ver Caetano arriscar-se no ofício de diretor. O "Cinema Falado" conviveu assim, e desde a noite de estreia, com uma aura de filme “maldito”. Em textos e em entrevistas reunidos no "Cine Subaé", Caetano comenta extensamente as intenções estéticas por trás do seu único filme. Rememora a experiência no set e rebate um a um os ataques ao filme. Creio que a leitura do livro ajuda a dissipar a bruma de incompreensão que há anos envolve "O Cinema Falado". No mais, depoimentos reunidos no livro oferecem um vislumbre do cineasta que Caetano imaginou ser ao revelar detalhes de roteiros que ele rascunhou, mas jamais viria a filmar.


Resenhando.com - Como você definiria Caetano Veloso como crítico de cinema?
Rodrigo Sombra - Difícil dar uma definição estanque. O pensamento cinematográfico de Caetano passa por seguidas rupturas e transformações. Na juventude, temos um crítico algo sectário, interessado em “catequizar” as plateias santamarenses, exigindo-lhes que abandonassem o culto aos melodramas importados de Hollywood em favor do refinamento artístico do cinema de autor europeu. Mais adiante, seus textos revelam notável ecletismo, articulam o olhar sobre o cinema a questões envolvendo política, raça, identidade nacional, urbanismo. Na maturidade, sua mirada é mais abrangente e tolerante. Nas colunas publicadas no jornal O Globo na última década, blockbusters como "Rio" ou "Avatar" são merecedores da atenção crítica de Caetano.  


Resenhando.com - Em que os textos de "Cine Subaé" continuam atuais?
Claudio Leal - Nem todos os textos de "Cine Subaé" podem ser entendidos como atuais. Alguns deles são intervenções de época, sobretudo os escritos de juventude, publicados entre 1960 e 1963. A maioria dos textos do livro é de sua fase madura e pode atender a um desejo de atualidade porque essas críticas discutem filmes recentes ou de décadas mais próximas. O livro tem ainda fragmentos de entrevistas muito vivazes. Mas acredito que a questão da atualidade não importe tanto. Com o tempo, Caetano assumiu uma dimensão cultural que atrai leitores variados, desde os críticos e cinéfilos aos seus admiradores e não-admiradores curiosos, sem falar de estudiosos da história brasileira posterior aos anos 1960. Caetano tem um olhar livre diante de obras de arte e isso traz um interesse atual a textos à primeira vista atrelados a uma circunstância histórica. "Cine Subaé" incorpora ainda elementos novos à fortuna crítica de filmes como "Hiroshima, Mon Amour", "A Grande Feira", "O Bandido da Luz Vermelha", "Central do Brasil" e o próprio "O Cinema Falado", dirigido por Caetano.


Ficha técnica
Cine Subaé – escritos sobre cinema (1960 –2023), de Caetano Veloso
Claudio LealRodrigo Sombra (org.)
Lançamento: 28 de maio de 24
Páginas: 440
Compre o livro neste link.

segunda-feira, 15 de julho de 2024

.: "Twisters" coloca o espectador dentro da tragédia sem que ele se arrisque


Por 
Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

Tudo o que está em "Twisters", em cartaz na rede rede Cineflix Cinemas, remete aos anos 90. Desde a estética do filme, passando por personagens despretensiosos, até à história de amor levinha protagonizada por personagens agradáveis, mas não surpreendentes. Parece uma obra pensada para se tornar um clássico ao longo do tempo. O interessante do filme é a intensidade com que ele proporciona vivenciar os desastres ambientais dentro do cinema, sem que o público necessite de fato passar por eles. É uma aventura e tanto, com mais tecnologia que o filme de 1996 e as sequências que a produção já proporcionou. 

Glen Powell como o cowboy-influencer-ambientalista-estereotipado entrega o personagem com uma ironia recorrente, que ele também fez em "Assassino Por Acaso" e se sai bem, o problema é começar a se repetir. Daisy Edgar-Jones, inesquecível como "a garota do lago" de "Um Lugar Bem Longe Daqui" apresenta uma personagem relevante um bom tempo depois daquele longa-metragem e, pasmem, o filme é dela. Mais do que de Glen Power, apontado como o grande protagonista. Não é. 

Entre os "pombinhos do filme" há um drama no meio, a protagonista é traumatizada e se fecha até percorrer todo aquele caminho de se reinventar a partir de uma vitória e, de quebra, um novo amor. Até aí, mais do mesmo. Mas o forte de "Twisters" decididamente não é a história, mas os efeitos. "Twisters" coloca o espectador dentro da tragédia sem que ele se arrisque... e dar essa experiência a ele. É algo que no streaming não vai rolar com a mesma intensidade. É um filme para ver no cinema e sentir tudo, caso contrário é mais um que ao longo dos anos terá uma "pegada de clássico" com pouco ou nadaa acrescentar. É possível perceber a assinatura de Steven Spielberg, que está por trás da produção. 

Daryl McCormack, o "Leo Grande" do filme com Emma Thompson, faz uma participação pequena, mas marcante. Outra curiosidade de "Twisters" é contar uma história de amor sem mostrar sequer um beijo. É uma perspectiva diferente, que também se conecta às novas gerações e as relações humanas que se consolidam a partir da internet.


Assista na Cineflix
Filmes de sucesso como "Twisters" são exibidos na rede Cineflix CinemasPara acompanhar as novidades da Cineflix mais perto de você, acesse a programação completa da sua cidade no app ou site a partir deste link. No litoral de São Paulo, as estreias dos filmes acontecem no Cineflix Santos, que fica Miramar Shopping, à rua Euclides da Cunha, 21, no Gonzaga. Consulta de programação e compra de ingressos neste link: https://vendaonline.cineflix.com.br/cinema/SANO Resenhando.com é parceiro da rede Cineflix Cinemas desde 2021.

sábado, 22 de junho de 2024

.: Crítica: "Ainda Dá Tempo" surpreende porque pode transformar o público


Por 
Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

Divertida e reflexiva ao mesmo tempo, a peça teatral "Ainda Dá Tempo", em cartaz até dia 28 de julho no Teatro Uol, em São Paulo, faz o público pensar na vida. Seriam as escolhas corretas as que tomamos ao longo do caminho? No espetáculo, que vem lotando todas as sessões, três casais de diferentes gerações se encontram em uma casa que está à venda. Os talentosos Bia Arantes e Igor Cosso fazem os jovens que querem comprar a casa. Bruna Thedy e Ricardo Tozzi, um casal de meia-idade, pais de um adolescente, que querem vender o local. Eliete Cigaarini e Norival Rizzo, um casal experiente que já morou naquele ambiente e quer matar a saudade.

Com atuações doces e complementares, por ora engraçadas e por outras emocionantes, os atores fazem a festa no texto escrito por Jeff Gould e dirigido com muita sensibilidade por Isser Korik, que já demonstrou que espetáculos sobre as relações humanas são o forte dele, que já dividiu o palco com Eliete Cigaarini em "Divórcio!", outra história que trata do mesmo tema, com uma abordagem diferente. 

Klayton Pavesi, o adolescente que tem papel fundamental para a história girar, merece menção especial, pois não é fácil brilhar entre um elenco de feras - algo que ele faz com muita naturalidade. "Ainda Dá Tempo" é uma delícia e não vai pelo caminho mais fácil da "risada pela risada". É riso e reflexão. Discute escolas. Faz pensar. 

Todos os atores brilham em um exercício de generosidade raro de se ver em um palco e - sobretudo - no ambiente artístico, repleto de competitividade. Cada um tem o seu momento e absolutamente todos ali estão com o objetivo de contar uma boa história e, de uma maneira surpreendente, fazer pensar. Conseguem mais. O público sai com a esperança de que existe um mundo melhor e com a intenção de consertar as coisas ou simplesmente fazer diferente. Um mérito e tanto para uma peça teatral tão despretensiosa e afetiva.


Parceria de sucesso
A comédia “Ainda Dá Tempo” é o mais recente texto assinado pelo americano Jeff Gould. Durante vinte e cinco anos, o dramaturgo tem feito o público rir ao explorar os territórios do amor, do sexo e do casamento com seu olhar atento sobre aos relacionamentos. “Definitivamente meus textos têm pitadas autobiográficas. Muitos diálogos são baseados no meu relacionamento com minha ex-mulher. Mas não é só isso. Se você quer ser escritor, tenho duas sugestões: seja um pouco louco e seja amigo de alguns deles”, fala o autor sobre o seu trabalho.

“Jogo Aberto”, um dos sucessos anteriores do autor já foi montado em vários países, incluindo o Brasil (2016), traduzido e dirigido por Isser Korik e protagonizado por Ricardo Tozzi. “Eu gosto de repetir parcerias que dão certo. Alguns autores são recorrentes no meu trabalho: João Bethencourt já fiz dois textos, Jeff Gould já é o terceiro que traduzo e enceno. Retomar a parceria com o Tozzi, com a Bruna e com a Eliete, nesse elenco que é um 'dream team' é muito gratificante para mim”. O espetáculo é apresentado pela empresa Metlife e patrocínio do Banco Luso e Consigaz pela Lei Nacional de Incentivo à Cultura.

Ficha técnica
Espetáculo "Ainda Dá Tempo".
Comédia de Jeff Gould.
Tradução e direção de Isser Korik.
Elenco: Ricardo Tozzi, Bruna Thedy, Norival Rizzo, Eliete Cigaarini, Igor Cosso, Bia Arantes e Klayton Pavesi.
Cenografia: Ricardo Tozzi.
Figurinos: Renata Ricci.
Produção executiva e cenotecnia: Will Siqueira.
Trilha sonora: Wagner Bernardes
Fotografia: Guilherme Assano
Assistência de direção: Roana Paglianno
Assessoria de imprensa: Flavia Fusco Comunicação
Criação gráfica: Letícia Andrade  e R+Marketing
Administração: Paloma Espíndola
Prestação de contas: Sonia Kavantan
Coordenação de marketing: Emanoela Abrantes
Iluminador e Operação: Rafael Pereir
Mídias sociais: Renata Castanho
Realização: Referendum Participações e Serviços Ltda e Ministério da Cultura

Serviço:
Espetáculo "Ainda Dá Tempo"
De: Jeff Gould
Tradução e direção: Isser Korik
Gênero: comédia
Duração: 80 minutos
Classificação: 12 anos
Temporada: até 27 de julho. Sextas, sábados e domingos, às 20h00.

Ingressos:
Sextas e Domingos – Setor A R$ 100,00 e Setor B R$ 70,00
Sábados – Setor A R$ 120,00 e Setor B R$ 90,00
Ingressos promocionais com descontos de 70% e 80%, no site e na bilheteria, para os primeiros compradores de cada sessão.

Teatro Uol
Shopping Pátio Higienópolis - Av. Higienópolis, 618 / Terraço / tel.: (11) 3823-2323
Televendas: (11) / 3823-2423 / 3823-2737 / 3823-2323
Vendas on-line: www.teatrouol.com.br
Capacidade: 300 lugares
Acesso para cadeirantes / Ar-condicionado / Estacionamento do Shopping: consultar valor pelo tel: 4040-2004 / Venda de espetáculos para grupos e escolas: (11) 3661-5896, (11) 99605-3094

Horário de funcionamento da bilheteria
Quartas e quintas das 17h às 20h, sextas das 16h às 20h, sábados, das 13h às 22h e domingos, das 13h às 20h; não aceita cheques / Aceita os cartões de crédito: todos da Mastercard, Redecard, Visa, Visa Electron e Amex / Estudantes e pessoas com 60 anos ou mais têm os descontos legais / Clube UOL e Clube Folha 50% desconto.Patrocínio do Teatro Uol: Uol, Folha de S.Paulo, Genesys, Banco Luso Brasileiro e MetLife.

domingo, 16 de junho de 2024

.: Betina González: "Só as mulheres têm a obrigação de ser grandes"


Em entrevista exclusiva, Betina González fala sobre as expectativas para o evento em São Paulo e dá opiniões contundentes sobre a vida, a literatura e de que maneira esses dois temas se misturam. Foto: Fernando de la Orden. Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com


Um dos expoentes da literatura contemporânea argentina, Betina González é uma das autoras confirmadas na terceira edição de A Feira do Livro, festival literário organizado pela Associação Quatro Cinco Um que começa no dia 29 de junho, terá nove dias de duração e reunirá alguns dos principais destaques da cena literária brasileira e internacional para debates gratuitos na Praça Charles Miller, Pacaembu, em São Paulo.

Cheia de sensibilidade e acidez, a escrita de Betina reflete a vida e os dilemas reais sem se dissociar da poética do cotidiano. O primeiro romance, "Arte Menor", que conta a história policial de uma filha em busca da memória da figura indescritível do pai falecido – ganhou o Prêmio Clarín e foi elogiado até pelo escritor português José Saramago: "Pode-se dizer que apenas o seu título é arte menor. O que vem depois do título é arte erudita”, afirmou o vencedor do Prêmio Nobel de Literatura.

Nascida em Villa Ballester,​ na Grande Buenos Aires, Betina González estudou Comunicação Social na universidade da capital argentina, onde mais tarde atuaria como professora e pesquisadora. O reconhecimento internacional veio quando ganhou o Prémio Tusquets com o romance de iniciação "Las Poseídas", escrito em Pittsburgh sobre a “perda da inocência”, quando um grupo de mulheres “descobre com horror o que tinha acontecido no país” com os crimes da Junta Militar.

No Brasil, lançou pela editora Bazar do Tempo o livro "A Obrigação de Ser Genial", que propõe uma série de ensaios para desvendar os mistérios da criação literária."Não basta ser boa: é preciso ser genial", afirma. Nesta entrevista exclusiva, Betina González fala sobre as expectativas para o evento em São Paulo e dá opiniões contundentes sobre a vida, a literatura e de que maneira esses dois temas se misturam. Compre os livros de Betina González neste link.

Resenhando.com - Quais as suas expectativas para o evento A Feira do Livro?
Betina González
Nunca estive em São Paulo, então minhas expectativas são altas, sei que é uma cidade cheia de eventos culturais e estou muito animada para ir à Feira. Ainda não decidi sobre o tema da minha palestra, mas certamente terá a ver com como o patriarcado silenciou a escrita das mulheres e como algumas dessas operações ainda estão em vigor, mas com novos disfarces.


Resenhando.com - Por que entende que as pessoas hoje têm a obrigação de serem geniais?
Betina González - Não é isso que o título do meu livro significa. Só as mulheres têm a obrigação de ser grandes, os homens não. Os homens têm garantidos seus lugares, nas profissões, na literatura, só porque são homens. Podem dar-se ao luxo de ser medíocres, ainda vão chegar. As mulheres, não.


Resenhando.com - Que diferenças e semelhanças você percebe entre as literaturas contemporâneas argentina e brasileira?
Betina González - Não conheço literatura brasileira contemporânea o suficiente para julgar de forma tão enfática. Vejo muitas semelhanças entre autores latino-americanos em geral: um movimento ancorado na autoficção que vem acontecendo há décadas e, em paralelo, autores que seguem o caminho da invenção e do humor. Dito isso, o Brasil sempre se caracterizou por ter seus próprios movimentos. Basta pensar nas três fases do modernismo brasileiro para ver que o país tem uma literatura absolutamente única, com escritores maravilhosos como Machado de Assis, Guimarães Rosa e tantos outros. Dos contemporâneos, admiro muito Andrea del Fuego. "As Miniaturas" foi o primeiro livro que li por ela e me apaixonei por sua imaginação narrativa impressionante!

Resenhando.com - Eleja um autor argentino e um brasileiro que são seus favoritos.
Betina González - Clarice Lispector é, sem dúvida, uma das maiores escritoras não só do Brasil, mas do mundo. Sua escrita, seu universo eram únicos. Assim como Machado de Assis, sobre quem escrevi um dos capítulos de minha tese. Tem que escrever assim, textos que não se assemelham a nada. Se não, por que escrever?


Resenhando.com - No seu romance "Arte Menor" , você  conta a história de uma filha em busca da memória da figura paterna. Que elementos você utiliza da sua vida real para criar histórias?
Betina González - Bem, eu "roubei" essa história de um amigo, cujo pai era artista e tinha muitas amantes. Ocorreu-me que era uma grande história para contar que a filha procura todos os amantes que seu pai tinha de uma pequena estátua que ele fez para todos os seus amantes. Claro, depois coloquei no romance muitas coisas que eram da história argentina e da minha posição como escritora na periferia de Buenos Aires.

Resenhando.com - Qual é a importância da memória para sermos o que nos tornamos?
Betina González - Memória é tudo, não é? Sem memória não somos pessoas nem países. O direito de contar a própria história é muito importante.


Resenhando.com - O título do seu livro "El amor Es Una Catástrofe Natural" faz uma afirmação contundente. Você concorda com isso?
Betina González - Você tem que ler essa história (risos). É mais esperançoso do que parece pelo título. Ainda acredito que o amor verdadeiro é catastrófico, sempre nos transforma. Catástrofe em grego significava algo como um fim imprevisto!

Resenhando.com - O que há de autobiográfico em sua escrita? Em que você se expõe mais, e em que protege mais?
Betina González - Pouco. Não estou interessada em contar a minha vida, não acho que seja um assunto interessante. Infelizmente, a vida ainda se esconde em sorrisos.

Resenhando.com - Quem é Betina González pela própria Betina González?
Betina González - Escrevo desde os oito anos de idade para não ser a Betina González, então, neste momento, posso dizer que não sou ninguém. Na verdade, esse é o nome do meu próximo livro: "Como se Tornar Ninguém".


Serviço
A Feira do Livro
De 29 de junho a 7 de julho de 2024
Local: Praça Charles Miller – Pacaembu / São Paulo
Entrada gratuita

sexta-feira, 31 de maio de 2024

.: Crítica: "A Última Entrevista de Marília Gabriela" celebra a liberdade de ser


Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. Foto: divulgação. 

Espetáculo em cartaz no Teatro Unimed até dia 28 de julho, "A Última Entrevista de Marília Gabriela" é um espetáculo que ecoa por muito tempo depois de terminado. São várias as razões para isso acontecer. Com Marília Gabriela e Theodoro Cochrane em um duelo de frases de efeito e permeadas de sentimentos, muitas vezes cortantes, o espetáculo fala sobre as idas e vindas de uma relação pontuada por altos e baixos. É mais que uma lavagem de roupa suja em cena diante dos olhos atentos - e, muitas vezes, fofoqueiros - do público. É uma declaração e uma ode ao amor real sem dar margem a qualquer tipo de ilusão.

Theodoro Cochrane abre o espetáculo com uma surpreendente presença de palco. Sarcástico, forte e vulnerável ao mesmo tempo, ele tem algo de agridoce e não é conivente consigo em nenhum momento. Marília Gabriela demora exatamente o tempo para ser esperada em cena. Sabe do magnetismo que a presença dela impõe, não só pela história que construiu na televisão, mas pelo que é no imaginário popular de quem acompanhou a carreira dela. Nesse ambiente que mistura drama, comédia e até suspense, ambos estão expostos em algo que poderia ser confundido com uma espécie de autoelogio no formato de teatro contemporâneo, não é. 

O que fazem em cena é poesia e generosidade em estado bruto. Em um espetáculo que bastava ser eles mesmos para atrair o público, eles conseguem ser mais e se despem de qualquer tipo de vaidade quando é preciso que demonstrem que também podem ser menos e mostram partes que não são edificantes em uma relação entre mãe e filho. Mas tudo cabe - inclusive as inesperadas vezes em que Marília Gabriela dispara impropérios.

A beleza de "A Última Entrevista de Marília Gabriela" é não ter medo da exposição e proporcionar a liberdade de ser. Tudo é extremamente autobiográfico, mesmo que não seja, porque os intérpretes assumem traços da personalidade que até não podem corresponder com o que de fato aconteceu. Fatos não podem exatamente ter sido da maneira em que são contados no espetáculo, algumas coisas podem ser minimizadas, situações podem ter ganhado contorno com tintas mais fortes.  

Quando trocam de lugar, com Theodoro assumindo o lugar de Marília, eles não apresentam nenhum receio de rir de si mesmos - o que torna tudo ainda mais interessante. Respondem a perguntas polêmicas sobre a carreira e vida pessoal de Marília e até encenam uma espécie de autocrítica sobre os dramas de um "pobre menino rico" enfrentados por Theodoro. Há ainda uma entrevista improvisada, feita por Marilia Gabriela com algum corajoso da plateia que ousa levantar a mão quando ela chama, dando a possibilidade de ver ao vivo o que ela fazia por anos a fio diante da televisão.

Nesse espetáculo sobre realidade, invenções e reinvenções, uma jornalista consagrada se arrisca a ser atriz e o filho de alguém muito relevante passa, definitivamente, a ter a própria identidade. A graça de "A Última Entrevista de Marília Gabriela" é também não saber onde termina a Gabriela e onde começa o Cochrane. Essa simbiose da vida é também a profundidade desse espetáculo que prima por ser antropofágico para quem o interpreta e para o público. 

Assista-o e saia outro, mas é preciso recomendar que o público passa por uma bofetada e um afago ao mesmo tempo, algo que é tão humano que vale cada segundo. Não é possível saber se "A Última Entrevista de Marília Gabriela", de fato, será a derradeira em alguma apresentação. O que se tem certeza, mesmo, é que quem assiste está diante de algo que dificilmente irá se repetir e, por isso mesmo, é único, mágico e especial.


Ficha técnica
Espetáculo "A Última Entrevista de Marília Gabriela"
Elenco: Marília Gabriela e Theodoro Cochrane
Dramaturgia: Michelle Ferreira
Direção: Bruno Guida
Diretora assistente: Mayara Constantino
Figurinos: Theo Cochrane
Iluminação: César Pivetti
Trilha e preparação vocal: Daniel Maia
Realização: Rega Início Produções Artísticas


Serviço
Espetáculo "A Última Entrevista de Marília Gabriela"
Sextas-feiras e sábados, às 20h00. Domingos, às 18h00.
Até dia 28 de julho
Teatro Unimed - Alameda Santos, 2159 - Jardins/São Paulo.
Ingressos: R$ 180,00 (plateia), R$ 120,00 (balcão). Meia-entrada - R$ 90,00 (plateia) e R$ 60,00 (balcão)
Observação: O acesso ao balcão é apenas por escadas fixas
Clientes Unimed têm 50% de desconto com apresentação da carteirinha. Descontos não cumulativos.
Horários da bilheteria: sextas-feiras e sábados, das 12h30 às 20h00. Domingos, das 10h30 às 18h00
Duração: 70 minutos
Classificação: 14 anos
Capacidade: 240 lugares
Gênero: comédia dramática
Acessibilidade: Ingressos para cadeirantes e acompanhantes podem ser reservados pelo e-mail contato@teatrounimed.com.br
Estacionamento:  Valet terceirizado no local
Atenção: não será permitida a entrada na sala após o início do espetáculo, não havendo a devolução de valores ou troca de ingressos para outra data.

quinta-feira, 16 de maio de 2024

.: Tércia Montenegro: "Cada personagem se aproxima e se distancia de seu autor"


"Cada personagem se aproxima e se distancia de seu autor", afirma Tércia Montenegro em entrevista para o Resenhando.com. Foto: Igor de Melo. Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 


Fotógrafa e professora da Universidade Federal do Ceará, Tércia Montenegro é um sopro de frescor na literatura brasileira. Autora de "Turismo para Cegos" "Em Plena Luz", ela acaba de lançar pela Companhia das Letras o romance "Um Prego no Espelho", , que conta a história de uma mulher que leva uma vida normal até que tem sua trajetória abalada quando pensa ver, em uma ação rotineira, o rosto do irmão falecido. Nascida em 1976, em Fortaleza, ela publicou vários livros de contos e crônicas, além de obras voltadas para o público infantil e juvenil. Nesta entrevista exclusiva, ela fala sobre literatura, processo de criação e identidade. Compre o livro "Um Prego no Espelho", de Tércia Montenegro, neste link.


Resenhando.com - O que você quis dizer com o título de seu livro?
Tércia Montenegro -
Um prego no espelho traz, desde o título, uma discussão sobre identidade. Dentro de uma narrativa familiar, como é o caso, cada pessoa se constitui com semelhanças que são reflexos de seus ancestrais.


O que é "um prego no espelho"?
Tércia Montenegro - 
O prego é esse elemento que surge como algo fixo, mas que despedaça, promove fragmentações e desvios também. Em outras palavras, a imagem do sujeito não é algo uniforme, mas sempre múltipla, no jogo de ramificações familiares.

Resenhando.com - Você acredita que os nossos antepassados têm influência na maneira que levamos a vida?
Tércia Montenegro - 
Neste livro, existe a premissa de que a vida de uma pessoa pode ser uma espécie de repetição do destino de seus antepassados, tudo de uma maneira inconsciente, é claro. "Um Prego no Espelho" trata exatamente dessa ideia de uma fissura na identidade, algo que corrompe a individualidade, cria um rasgo no sujeito. A protagonista, Thalia, decide se tornar atriz para viver várias vidas, sem saber que sua escolha acontece justamente por causa da morte de um irmão, ocorrida muito tempo atrás.

Resenhando.com - O que mais a aproxima e o que mais a diferencia de Thalia, a protagonista de seu livro?
Tércia Montenegro - 
Cada personagem se aproxima e se distancia de seu autor.  Embora Thalia seja a protagonista, ela não é a única figura importante. Claro que há pontos de semelhança entre nós, como o magistério e a incursão pelas artes, mas eu fui me surpreendendo muito enquanto escrevia Um prego no espelho. Surgiram algumas conexões, relações entre os personagens, que eu não tinha previsto inicialmente. No fundo, creio que eles se tornaram realmente uma família, e nesse aspecto chegaram a desenvolver um entendimento, uma espécie de pacto interno que eu não chegava a acessar. Em certos momentos, tive a sensação de ser uma espectadora, alguém que não podia interferir nos destinos que se desenrolavam ali, no papel. É uma experiência mágica, quando um livro ganha o próprio rumo. Talvez nesse sentido fique reforçada a ideia de que uma obra literária é quase um filho: nasce de uma pessoa, mas tem uma identidade diversa e imprevisível.

Resenhando.com - As protagonistas de seus livros sempre estão atreladas à alguma arte. Teatro, escultura, artes plásticas. Por quê?
Tércia Montenegro - 
Tenho muitas personagens ligadas às artes, porque este é um assunto que me interessa o tempo inteiro; estou sempre atenta às construções estéticas em várias linguagens. A arte me comove, fascina, inquieta; não saberia dizer sobre a importância dela para as pessoas em geral, porque só posso falar sobre mim, mas do meu ponto de vista a arte é um fator de encanto indispensável na vida.


Resenhando.com - Se pudesse relacionar seus livros a sentidos humanos, quais seriam os de "Um Prego no Espelho", "Turismo para Cegos" e "Em Plena luz"?
Tércia Montenegro - 
"Um Prego no Espelho" traz a visualidade pela cena teatral, já que a personagem Thalia é atriz. "Turismo para Cegos", a partir de uma história sobre uma artista plástica que sofre de retinose pigmentar, também é um livro que experiência o visual, assim como o táctil. "Em Plena Luz", livro sobre uma fotógrafa, mais uma vez reflete sobre as imagens. Essa é uma constante na minha literatura: penso e escrevo através das imagens; para mim, a literatura é uma arte visual.

Resenhando.com - Você se sente mais confortável como cronista, contista ou romancista? 
Tércia Montenegro - 
Cada gênero textual tem o seu apelo, dependendo do momento. Narrativas longas são propícias para momentos de retiro, quando o autor pode conviver demoradamente com seus personagens, vê-los nascer e se desenvolver. Contos já são como situações instantâneas, deflagradas  por uma ideia repentina, uma "inspiração". E crônicas são reflexões, assim como os ensaios; são maneiras de se debruçar sobre um comportamento ou um fato instigante, usando um estilo mais prosaico.

sexta-feira, 29 de março de 2024

.: Crítica: espetáculo "Gostava Mais dos Pais" transita entre clássico e revolução


No palco, 
Bruno Mazzeo e Lucio Mauro Filho oferecem vulnerabilidades e 
se expõem sem medo para entregar de bandeja ao público as performances mais verdadeiras de suas carreiras. Foto: Pedro Miceli


Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

O espetáculo "Gostava Mais dos Pais" é mais que uma homenagem a dois comediantes que fizeram história no Brasil e mais que uma celebração à amizade de dois artistas ligados desde a infância. Bruno Mazzeo e Lucio Mauro Filho não são irmãos de sangue, o vínculo afetivo é por afinidade, e é essa a linha condutora da peça teatral que fica em cartaz até dia 14 de abril no Teatro Porto, em São Paulo.

Com a direção sensível e repleta de ironia e leveza feita por Debora Lamm, o espetáculo é assinado por Aloísio de Abreu e Rosana Ferrão. Em pouco mais de uma hora, a dupla transita entre a profundidade e a crítica, a ternura e a revolta, o clássico e a revolução. No palco, dois artistas talentosos oferecem vulnerabilidades e se expõem sem medo para entregar de bandeja ao público as performances mais verdadeiras de suas carreiras. 

De quebra, fazem entender o sentido da vida, que é nada mais que continuidade e afeto. São eles no palco, mas também são personagens e, ao mesmo tempo, representam a memória viva dos pais e as lembranças afetivas de um país inteiro, em cena, em algo que celebra a arte, a vida e o que está no meio disso.

Entre a comédia e o desabafo, o inusitado e a emoção, os artistas fazem uma espécie de crônica da vida real e toda a poesia que emana dela. Há muita reverência ao passado e uma clara homenagem aos comediantes Chico Anysio (1931 - 2012) e Lucio Mauro (1927 - 2019). Há quem goste mais dos pais e há quem goste mais dos filhos, já que ninguém é unanimidade. No entanto, Bruno Mazzeo e Lúcio Mauro Filho são a prova irrefutável de que a genética não falha mas que, também, talento não depende de berço. Mais que sangue que corre nas veias, eles são essência. E essência, nesse caso, é talento, continuidade e criação de algo que vai além do legado.

Ficha técnica
Espetáculo "Gostava Mais dos Pais". Elenco: Bruno Mazzeo e Lucio Mauro Filho. Direção: Debora Lamm. Dramaturgia: Aloísio de Abreu e Rosana Ferrão. Cenografia: Daniela Thomas. Iluminação: Wagner Antônio. Figurino: Marina Franco. Trilha sonora: Plínio Profeta. 

Serviço
Espetáculo "Gostava Mais dos Pais". Até dia 14 de abril de 2024 - Sextas e sábados às 20h e domingos às 17h. Ingressos: Plateia R$100 e R$50 / Balcão de Frisa R$80 e R$40. Classificação: 14 anos. Duração: 90 minutos. Teatro Porto. Al. Barão de Piracicaba, 740 – Campos Elíseos – São Paulo. Telefone (11) 3366-8700. Bilheteria: aberta somente nos dias de espetáculo, duas horas antes da atração. Clientes Porto Seguro Bank mais acompanhante têm 50% de desconto. Clientes Porto mais acompanhante têm 30% de desconto. Vendas: www.sympla.com.br/teatroporto. Capacidade: 508 lugares. Formas de pagamento: Cartão de crédito e débito (Visa, Mastercard, Elo e Diners). Acessibilidade: 10 lugares para cadeirantes e 5 cadeiras para obesos. Estacionamento no local: Gratuito para clientes do Teatro Porto.

.: Crítica de teatro: "Beetlejuice - O Musical" celebra a vida e o nonsense


Os grandes momentos do musical se revezam entre Eduardo Sterblitch e Ana Luiza Ferreira em um espetáculo que se divide entre a celebração da vida e o nonsense. Foto: Leo Aversa

Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

Clássico do cinema e da "Sessão da Tarde" nas mãos de Tim Burton nos anos 80, "Beetlejuice - O Musical" se reinventa no teatro e é tudo o que se espera, mas vai além disso. Há, no espetáculo, em cartaz até dia 21 de abril no Teatro Liberdade, em São Paulo, o ator Eduardo Sterblitch no papel de sua vida. Ao mesmo tempo, os holofotes também estão apontados para Ana Luiza Ferreira no momento mais desafiador da carreira, em que se mostra uma grande revelação dos palcos como a garota gótica Lydia Deetz. Os grandes momentos do musical se revezam entre esses dois artistas em um espetáculo que se divide entre a celebração da vida e o nonsense.

É tudo muito grande em "Beetlejuice - O Musical". A começar pela interpretação histriônica de Sterblitch, tudo o que esse personagem requer e que por vezes lembra outro grande ator, Selton Mello, e o carisma de Ana Luiza Ferreira, que brinca com as nuances de uma personagem que poderia ser extremamente difícil por ser tão emblemática. Ambos os intérpretes fazem parecer fácil algo que, sabe-se, é tão difícil. Primeiro porque a expectativa em torno desses papéis é imensa. Segundo porque ir além do que o papel requer é para poucos. Ambos fazem isso com talento, maestria e, percebe-se, reverência. Eles homenageiam e se divertem ao mesmo tempo.

Com direção de Tadeu Aguiar, produção geral de Renata Borges Pimenta, produção da Touché Entretenimento e apresentado pelo BB Seguros, nada está acima do tom. O espetáculo pede e os atores entregam. Em "Beetlejuice - O Musical" tudo se encaixa perfeitamente. Há o espaço para a nostalgia dos adultos que vão assistir em busca de algo que viveram no passado, e também para a formação de um novo público - embora o espetáculo não seja propriamente voltado para crianças, o que torna tudo ainda mais interessante.

Marcelo Laham e Thais Piza brilham em seus papéis e também destacam-se Joaquim Lopes e Flavia Santana como os novos moradores da casa. A história gira em torno de uma família que vai morar em uma residência habitada por fantasmas, que querem que os novos moradores vão embora do local. Só que os fantasmas não esperavam se deparar com uma criatura tão fúnebre e tétrica como Lydia Deetz. No meio do caminho, há Beetlejuice, que precisa de um favor. Mas não vá esperando um musical bobinho. O espetáculo tem patrocínio de Shell, Mobilize Financial Services, Eurofarma e BNY Mellon e apoio de Raízen, Outback, Robert Half e SegurPro.

É tudo muito esperto, temperado com a atuação de grandes talentos em momentos memoráveis no palco. "Beetlejuice - O Musical" é uma grande festa em que todos estão convidados para comemorar a vida ou se reencontrar com algo que ficou esquecido e que precisa ser acordado. É a conexão entre o presente e o passado dando aquele "empurrãozinho" para seguir em frente.


Sobre o espetáculo
No final dos anos 80, o cultuado diretor Tim Burton lançou um clássico instantâneo, que atravessou gerações, a comédia "Beetlejuice - Os Fantasmas se Divertem". O sucesso foi tamanho que, mais de 30 anos depois, o filme se transformou em um musical da Broadway, que estreou em 2019, sendo indicado a oito Tony´s Awards. No Brasil, o sucesso se repete: o musical teve a maior bilheteria teatral de 2023, no Rio de Janeiro. "

A montagem brasileira tem um super elenco de 23 atores: além de Eduardo Sterblitch, Ana Luiza Ferreira (Lydia Deetz), João Telles (alternante Beetlejuice), Lara Suleiman (alternante Lydia Deetz), Thais Piza (Barbara Maitland), Marcelo Laham (Adam Maitland), Flávia Santana (Delia Deetz), Joaquim Lopes (Charles Deetz), Rosana Penna (Juno), Gabi Camisotti (Skye e alternante Lydia Deetz), Mary Minóboli (ensemble e alternante Skye), Pamella Machado (Miss Argentina e alternante Barbara Maitland), Diego Campagnolli (Otho), Erika Affonso (Maxine e alternante Miss Argentina), Thór Junior (Maxie), Thiago Perticarrari (ensemble e cover Adam Maitland), Dino Fernandes (ensemble e cover Charles Deetz), Nathalia Serra (ensemble e alternante Delia Deetz e Maxine), Gabriel Querino (ensemble e cover Maxie), Thadeu Torres (ensemble), Duda Carvalho (ensemble), Edmundo Victor (ensemble) e Fernanda Misailidis (swing). 

A ficha técnica é repleta de grandes nomes do teatro musical: Renato Theobaldo (cenografia), Dani Vidal & Ney Madeira (figurino), Sueli Guerra (direção de movimento/coreografia), Dani Sanches (desenho de luz), Gabriel D´angelo (desenho de som), Anderson Bueno (visagismo) e Lucas Pimenta (assistente de direção).

Serviço
Espetáculo "Beetlejuice, o Musical". Teatro Liberdade. Rua São Joaquim, 129, Liberdade - São Paulo. Temporada até 21 de abril. Sessões de quarta-feira a domingo. Quartas, quintas e sextas-feiras, às 21h00. Sábados, às 16h00 e às 21h00. Domingos, às 16h00 e 20h30. Plateia Premium: R$ 350,00 (inteira) / R$ 175,00 (meia). Plateia: R$ 280,00 (inteira) / R$ 140,00 (meia). Balcão A: R$ 240,00 (inteira) / R$ 120,00 (meia). Balcão B: R$ 190,00 (inteira) / R$ 95,00 (meia). Duração: 2h30min (com intervalo de 15min). Classificação etária: 10 anos. *Clientes Glesp tem 25% de desconto nos ingressos inteiros mediante a aplicação do cupom, limitado a 4 ingressos por cupom. Válido para todos os setores. Internet (com taxa de conveniência): https://www.sympla.com.br/. Bilheteria física (sem taxa de conveniência): atendimento presencial de terça à sábado das 13h00 à 19h00. Domingos e feriados apenas em dias de espetáculos até o início da apresentação. Formas de pagamento: dinheiro, cartão de débito ou crédito.

domingo, 17 de março de 2024

.: Entrevista com Midria: "Minha poesia reflete meus processos de inquietação"


Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

Poeta, slammer e cientista social, Midria está entre os principais nomes da atual geração de escritores. A estreia na editora Rosa dos Tempos com "Desamada: um Corpo à Espera do Amor" vem marcada por um texto sensível e amadurecido sobre a descoberta amorosa. Em evidência após o emocionante debut na programação oficial da Flip 2022, também foi capa da revista Glamour em março de 2023 e, em abril do mesmo ano, revelou-se um destaque como referência da geração Z em reportagem da revista Vogue. 

Com texto de orelha assinado pela escritora, tradutora e psicanalista Eliane Marques, Midria vai além do que se espera de quem vive da poesia porque ultrapassa o lirismo para percorrer o universo das vivências. O livro é indicado para qualquer pessoa que já viveu o contrário do amor: a solidão física, corpórea, a falta do toque, a ausência de companhia. Nesta entrevista exclusiva, Midria revela tudo - e um pouco mais - sobre vida, inspiração e amor. Compre o livro "Desamada: um Corpo à Espera do Amor", de Midria, neste link.


Como sobreviver ao desamor?
Midria - Acredito que buscar espaços de autocuidado e de pertencimento coletivo ao mesmo tempo é importante. Para pessoas negras isso pode significar o “aquilombamento”, existir de forma mais plena e amorosa entre pares.


O que há de autobiográfico em "Desamada"?
Midria -  Quase tudo, minha poesia reflete meus processos de inquietação, dores e amores com o mundo.


O que representa a literatura em sua vida?
Midria A literatura pra mim é um fio condutor de muita importância, me reconecta com minha potência criativa e me apresenta o mundo de formas pluriverais. Desde criança, adolescente sempre amei muito ler e mais tarde encontrei nos saraus e slams uma forma de partilhar a escrita que formou muito minha identidade.


Na sua própria literatura, em que você se expõe mais, e por outro lado, em que você mais se preserva, em seus textos?
Midria Acho que busco ter um princípio geral de amor comigo e em relação ao mundo como aquilo que me motiva, isso ajuda a não cair num cinismo ou desesperança frente a questões difíceis que por vezes abordo.


Que conselhos você dá para as pessoas que pretendem enveredar pelos caminhos da escrita?
Midria Sempre busque partilhar só o que você pode dizer, a narrativa que se relaciona com o seu universo pessoal ou de interesses que cruzem uma nova possibilidade de imaginar o mundo.


Quais livros foram fundamentais para a sua formação enquanto escritore e leitore?
Midria - "O Menino do Pijama Listrado", "As Boas Mulheres da China", as obras da Octavia E. Butler no geral e mais recentemente "O Caminho do Artista".


Como e quando começou a escrever?
Midria -  Eu escrevia desde pequene, na escola quando minha professora da segunda série ensinou o que era poesia me encantei pela forma e segui escrevendo poemas aqui e ali. Mais pra frente na quinta, sexta série participei de projetos de formação de leitores na escola, o chamado “Círculos de Leitura”, o que aprofundou mais ainda o amor pela escrita. E nos saraus e slams os poemas que eu já escrevia ganharam mais corpo e espaço de partilha.


Quais escritores mais influenciaram a sua trajetória artística e pessoal?
Midria Gosto de pensar em pares como Mel Duarte, Luz Ribeiro, Danylo Paulo, Igor Chico, Jô Freitas, que são pessoas contemporâneas e para além de escreverem, vivenciam muito o que colocam no papel. Além de serem todes agitadores culturais que criam espaços de escuta e partilha de poesia dos quais pude participar.


É possível viver de literatura no Brasil?
Midria É possível, mas não sem muitos percalços. Fiz uma pesquisa sobre a trajetória de profissionalização de poetas negras do slam em São Paulo ainda na graduação e o que ela mais me mostrou foi como ainda não temos algum tipo de parâmetro que balize os valores mínimos pelos quais nossos trabalhos devem ser valorizados. É tudo muito desigual e por vezes as pessoas não compreendem que a escrita tem um custo de tempo, emocional, interpessoal. Vejo que ainda falta um olhar sério sobre pessoas que escrevem no Brasil, em especial quando falam da margem.


O quanto para você escrever é disciplina? É mais inspiração ou transpiração?
Midria -  Acho que ando no meio termo, vou construindo a inspiração, coletando escritos aqui e ali e quando vejo que o livro está realmente já no caminho sento com mais afinco para dar os toques finais.


Quanto tempo por dia você reserva para escrever?
Midria Tento escrever pelo menos 30 minutos a cada manhã em fluxo livre e o restante vem à medida da inspiração, em especial a poesia que mora bastante nos detalhes do cotidiano.


Você tem um ritual para escrever?
Midria -  Não tenho, só gosto de sentir que há tempo para isso.


Em um processo de criação, o silêncio e isolamento são primordiais para produzir conteúdo ou o barulho não atrapalha?
Midria Muita coisa eu escrevi e escrevo no ônibus, metrô. Mas lapidar as coisas demanda concentração.


Como começar a ler Midria?
Midria -  Ler meus livros desde o primeiro, "A Menina que Nasceu sem Cor" que reúne poesias dos  meus primeiros anos nos slams e seguir conhecendo os seguintes é um bom jeito de se aprofundar nos diferentes momentos que já tive na escrita.


Que livro você gostaria de ter escrito?
Midria Não vou dar spoiler dos próximos, estão no forno! (risos)


Hoje, quem é Midria por Midria?
Midria Midria é uma pessoa que escreve, mas que também se divide entre ser uma pessoa que transforma o mundo por meio de uma ONG, que estuda muito como forma de se alimentar para dar conta da vida, que dança, vai para academia, nada, que está aprendendo a tocar bateria para manter viva sua criança interior, em resumo, uma pessoa que não para quieta para se sentir viva. E que busca a espiritualidade, Orixás e guias como eixo para dar conta de tanto movimento.

sábado, 3 de fevereiro de 2024

.: Crítica: "Matilda - O Musical" é uma festa em que se sobressaem os adultos


Por 
Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

Do universo mágico de Roald Dahl, chega ao fim neste final de semana a temporada de sucesso de "Matilda - O Musical", em cartaz no Teatro Claro Mais SP - com apresentações somente neste sábado e domingo. O espetáculo é uma grande festa protagonizado por três artistas promissoras Luísa Moribe, Belle Rodrigues, Mafê Diniz e Maria Volpe. As quatro, no jeito de interpretar e conduzir a personagem, dão toques pessoais à Matilda tornando a personagem ainda mais peculiar. No dia da apresentação que assistimos, a Matilda era Luísa Moribe, que, além de talento e carisma, também entrega um toque todo especial de doçura à emblemática personagem. 

Ao falar sobre a história de uma garota rejeitada pela família que se liberta a partir do poder das palavras, o espetáculo, além de exaltar a figura e a importância do papel do professor e da educação na vida daqueles que estão iniciando a vida, é também uma ode ao poder da inspiração, quando pessoas que passam em nossas vidas em momentos decisivos. "Matilda - O Musical" é uma festa infantil em que se sobressaem os adultos.

Isso não quer dizer que todo o elenco coadjuvante infantil não esteja impecável, está, mas são os atores adultos que se sobressaem nos papéis mais desafiadores de suas vidas. É o caso de Cleto Baccic, acostumado a colecionar papéis que não se repetem, como Dom Quixote, em "O Homem de La Mancha", Willy Wonka, em "Charlie e a Fantástica Fábrica de Chocolate" e  Juan Péron, em "Evita Open Air". Ele passa por uma verdadeira transformação e surge irreconhecível ao interpretar a diretora da escola onde Matilda estuda, Agatha Trunchbull, uma personagem cheia de nuances. 

A personagem de Baccic transborda acidez pelo mundo e, entre as curiosidades dessa papel, apesar de ser uma mulher, ela foi escrita para ser interpretada no teatro por um ator. Essa interpretação dá mais uma vez a oportunidade de ver Baccic em mais um ponto alto da carreira e também de fazer com que o público se deleite diante de uma grande interpretação. 

A mágica também se faz com Myra Ruiz, que volta a se destacar no teatro e investe na comédia. Desta vez, ao interpretar o papel mais colorido da carreira: a senhora Wormwood, uma perua carismática - mesmo para alguém que já foi totalmente verde, como a Elphaba, de "Wicked". O magnetismo da atriz faz com que ela atraia todas as atenções quando está no palco. É um papel para grandes intérpretes: mãe desnaturada, egocêntrica e histriônica, a personagem leva a atriz a protagonizar os melhores momentos do espetáculo. Além disso, a personagem cai como uma luva para alguém que tem a versatilidade de já ter sido no teatro a dramática Eva Perón de "Evita Open Air" - uma oportunidade de enveredar por caminhos ainda não tão conhecidos pelo grande público. A entrega da atriz é tanta que a construção da personagem está até nas sutilezas, como nas frases com erros propositais de concordância muito discretos que tornam a personagem ainda mais coerente e a atriz, embora belíssima no palco, ainda mais despida de vaidade.

Ingrid Marques, ensemble na apresentação que assistimos, brilhou como a senhorita Honey. Ela esbanja sensibilidade, carisma, meiguice e afinação. Foram dela as cenas mais ternas e inspiradoras de "Matilda". Originalmente, a personagem é interpretada por Fabi Bang, que viveu nos musicais a Glinda, de "Wicked" e a Ariel, de "A Pequena Sereia". 

Fabrizio Gorziza, defendendo o papel de Sr. Wormwood, volta a surpreender em um papel totalmente diferente do anterior, quando interpretava o personagem-título de "O Guarda-costas - O Musical". Extremamente talentoso e versátil, ele vem se consolidando no teatro e colocando a sua assinatura ao interpretar papéis cada vez mais desafiadores. Se em "O Guarda-costas" ele convenceu o público de que não sabia cantar, em "Matilda - O Musical", ele solta o vozeirão e deixa o público arrebatado. "Matilda - O Musical" é para ficar na memória. Sorte a de quem teve a oportunidade de assistir a esses artistas no melhor momento de suas carreiras até agora.

Premiado espetáculo está em cartaz no Teatro Claro
Com um roteiro cativante e divertidíssimo, o aclamado musical segue até este domingo, dia 4 de fevereiro, no Teatro Claro Mais São Paulo, que fica no Shopping Vila Olímpia. A imperdível montagem brasileira traz ao palco um elenco de 50 artistas, entre crianças e adultos, e uma estrutura de mais de 23 toneladas. Os ingressos custam a partir de R$19,80 e estão disponíveis em https://uhuu.com/v/teatroclarosp-257.

"Matilda - O Musical" coloca a pureza da criança, a paixão pela educação, pelos livros e pela criatividade, como forças para a superação. Nesta montagem inédita, a coreografia original é assinada por Peter Darling, o maior coreógrafo de teatro musical em atividade no mundo. O espetáculo é apresentado pelo Ministério da Cultura e Brasilprev e os ingressos podem ser adquiridos pelo site https://uhuu.com/v/teatroclarosp-257.

Ficha técnica
Espetáculo "Matilda - O Musical". Elenco adulto: Agatha Trunchbull (Cleto Baccic), Srta. Honey (Fabi Bang), Sra. Wormwood (Myra Ruiz), Sr. Wormwood (Fabrizio Gorziza), Sra. Phelps (Mari Rosinski), ensemble (Andreina Szoboszlai), ensemble  / A Acrobata (Gabriela Melo), ensemble  (Ingrid Marques), walking cover Senhora Wormwood (Larissa Grajauskas), ensemble (Alvinho de Pádua), ensemble / Doutor (Cezar Rocafi), ensemble / Michael (Guilherme Lopez), ensemble / Rudolpho (Leandro Naiss), ensemble / O Escapologista (Madson de Paula), ensemble / Sergei (Marco Azevedo), ensemble (Matheus Oliveira), kids swing (Julia Sanchis), swing (Ariel Venâncio), swing (Lucas Maia),  swing (Raphael Costa), swing (Thaiane Chuvas) e swing (Vinicius Cafer). Elenco infantil: Matilda: Luísa Moribe, Belle Rodrigues, Mafê Diniz ou Maria Volpe. Alice: Malu Brites, Madu Gonçalves ou Gabriella Pieri. Amanda: Lorrany Gomes, Clara Alvarazi ou Beatrice Rocha Mello. Bruce: Pedro Galvão, Gab Cardoso, Lorenzo Galli. Lavender: Helena Pizol, Mafê Beneduzzi e Livia Maria. Eric: Rodrigo Thomaz, Nico Takaki. Erica: Laura Pinheiro. Hortensia: Erin Borges, Bely Catanoze e Bia Lisboa. Nigel: Miguel Ryan, Levi Saraiva e Alejandro Ovando. Tommy: Pedro Henrique, Arthur Habert e Lorenzo Tironi. Texto: Dennis Kelly. Letras e músicas: Tim Minchin. Orquestração e músicas adicionais: Chris Nightingale. Direção geral: John Stefaniuk. Direção musical: Vânia Pajares. Coreografia: Peter Darling. Figurino: Ligia Rocha, Marco Pacheco & Jemima Tuany. Design de Luz: Rachel Mccutcheon. Design de Som: Gastón Briski. Design de mágica e ilusionismo: Skylar Fox. Design de maquiagem: Joe Dulude II. Design de perucas: Feliciano San Roman. Versão brasileira: Victor Mühlethaler. Diretora e coreógrafa residente: Anelita Gallo. Assistente de direção musical e preparadora vocal: Andréia Vitfer. Coreógrafo associado: Tom Hodgson. Assistente de coreografia: Danilo Santana. Designer de luz associado: Guilherme Paterno. Designer de som associado: Alejandro Zambrano. Company manager: Pia Calixto. Produtora executiva: Deborah Penafiel. Production stage manager: David Brenon. Diretor técnico internacional: Gary Beestone. Gerente de produção internacional: Andy Reader. Produtores: Vinícius Munhoz & Baccic.


Serviço
Espetáculo "Matilda - O Musical". Temporada até 4 de fevereiro de 2024. Teatro Claro SP - Shopping Vila Olímpia - R. Olimpíadas, 360 - Vila Olímpia/São Paulo. Capacidade: 754 pessoas. https://teatroclaromaissp.com.br/. Classificação: livre. Duração: 150 minutos e 15 minutos de intervalo. Sessões: quarta-feira, 20h00. Quinta-feira, 20h00. Sexta-feira, 20h00. Sábado, 15h00 e 20h00. Domingo, 15h00 e 20h00. Ingressos: de R$ 19,80 a R$ 400,00. Confira legislação vigente para meia-entrada. A programação do Teatro Claro mais SP conta com acessibilidade física e de conteúdo.


Canais oficiais de venda
Bilheteria on-line. Garanta seu ingresso em: www.matildamusicalbrasil.com e https://uhuu.com/v/teatroclarosp-257. Bilheteria física – sem taxa de conveniência. Bilheteria aberta das 10h às 22h de segunda a sábado e das 12h às 20h domingos e feriados. Local: Shopping Vila Olímpia - R. Olimpíadas, 360 - Vila Olímpia, São Paulo - SP, 04551-000 - 1 Piso - Acesso A. Telefone: (11) 3448-5061.

quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

.: Bethânia Pires Amaro: "A literatura feita por mulheres sempre foi fecunda"


Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com.

Bethânia Pires Amaro é uma mulher cosmopolita. Pernambucana de nascimento, baiana de criação, ela mora atualmente em São Paulo. Apaixonada por literatura, tem diversos contos premiados em concursos nacionais.mas a grande chance veio ao vencer o Prêmio Sesc de Literatura na categoria Conto. Com o livro "O Ninho", lançado pela editora Record, ela mergulha em um mosaico de imperfeições e doenças familiares para jogar realidade nas idealizações que pairam sobre as relações familiares, sobretudo quando se trata de maternidade. 

O livro oferece 15 contos que acompanham personagens femininas enfrentando diversas adversidades e, através de suas histórias, o leitor é lembrado de que a casa, esse estranho ninho, não é tão sacra assim, nem tão segura. Vícios, suicídios, maternidades disfuncionais, abusos e violências devastadoramente reais podem ser encontrados na obra e, no entanto, a sensibilidade narrativa de Bethânia Pires Amaro ampara o leitor com belezas imperfeitas, que decorrem da tragédia cotidiana, e com a compaixão.

Graduada e pós-graduada em Direito pela Universidade Federal da Bahia e mestre em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo ela  Assinado por ela, o conto “O Adeus da Eletricidade”, premiado no Concurso de Contos Maximiano Campos, foi traduzido para o alemão pela editora Arara Verlag. Confira a entrevista exclusiva abaixo. Compre o livro "O Ninho", de Bethânia Pires Amaro, neste link.


Resenhando.com - Seus contos especificam a casa como lugar de segurança afetiva. Explique essa ideia.
Bethânia Pires Amaro -
Já durante a pandemia, tivemos muitos artigos e reportagens que trouxeram reflexões sobre o aumento da violência de gênero durante o isolamento social, levantando o debate sobre o quanto as mulheres podem realmente se sentir seguras dentro de casa. Para muitas mulheres, o lar não é somente um espaço de amor e aprendizado, mas também o berço de comportamentos tóxicos que elas mesmas reproduzem, geração a geração, é a fonte a partir da qual elas desenvolvem distúrbios alimentares ou de imagem, inseguranças e dores diversas. Todas nós somos moldadas, ao menos em parte, pelo ambiente familiar e existe uma idealização da família enquanto instituição. Estes ideais de perfeição, se observados de perto, rapidamente se desfazem. “O Ninho” quis realçar estas tantas sombras e sutilezas dentro das dinâmicas familiares, especialmente entre mulheres.


Resenhando.com - Como é ser a vencedora do Prêmio Sesc de Literatura 2023 na categoria Conto?
Bethânia Pires Amaro - 
Ter vencido o Prêmio Sesc representou para mim um grande reconhecimento do meu trabalho, pelo qual sou muito grata. É um prêmio muito especial para o autor estreante, porque nos oferece, junto à publicação do livro, um circuito de divulgação que é extremamente importante para que possamos alcançar mais leitores Brasil afora. Na minha formação enquanto leitora, o Prêmio Sesc sempre exerceu um papel relevante, na medida em que pude conhecer diversas obras e autores através da divulgação de edições passadas, e eu sinto que tenho uma dívida imensa com esta literatura brasileira contemporânea, que me inspirou e me acompanhou por diversos momentos de vida. 


Resenhando.com - Sérgio Rodrigues afirmou que você é uma das melhores contistas da literatura brasileira. Como você recebe esse elogio?
Bethânia Pires Amaro - 
Tenho uma admiração imensa pelo Sérgio Rodrigues, tanto como autor como quanto ser humano, e a obra dele me inspirou de diversas formas. “O Drible”, em especial, é um livro de cabeceira ao qual retorno muitas vezes, tanto para estudo como por lazer, de modo que foi para mim uma grande honra tê-lo como jurado e sou extremamente grata por toda a generosidade e incentivo que recebi do Sérgio nestes últimos meses. A melhor parte do Prêmio Sesc, na verdade, tem sido a oportunidade de aproximação com outros escritores que sempre tive como referência, pois o meu livro não se fez sozinho, ele fecundou através da obra de muitos autores, ele passou por caminhos que muitas mulheres abriram antes de mim, e pelas mãos de grandes professores, profissionais e colegas até enfim ter chegado ao papel impresso. O livro jamais teria chegado à publicação sem que tantas pessoas tivessem acreditado nele ao longo de toda essa trajetória.


Resenhando.com - O papel da mulher na sociedade é algo recorrente nos textos de "O Ninho". Como você vê o papel da mulher na literatura?
Bethânia Pires Amaro - 
Penso que a literatura feita por mulheres sempre foi fecunda e felizmente tem crescido o número de publicações femininas no Brasil, embora ainda estejamos longe de um equilíbrio nesse sentido. É muito importante que as mulheres ocupem esses espaços nas livrarias e nas estantes brasileiras, para que possamos compartilhar nossas vivências e experiências da forma mais plural possível, apesar das tantas desvantagens que historicamente afastaram as mulheres do mercado literário profissional. Mais ainda, precisamos repensar o papel da mulher na literatura para afastá-la de modelos tradicionais em que sempre somos representadas como “o sexo frágil”, que tratam de questões femininas de forma estereotipada ou que reforcem qualquer tipo de misoginia. Vejo com grande alegria que cada vez mais coletivos, clubes de leitura e teses vêm focando na redescoberta de vozes femininas marginalizadas e no incentivo a novas autoras. Um belo movimento nesse sentido é o “Um Grande Dia para as Escritoras”, idealizado pela Giovana Madalosso, que conseguiu reunir mais de duas mil mulheres pelo país inteiro, em prol da literatura e da expressão artística feminina.

Resenhando.com - O que há de autobiográfico nos contos de "O Ninho"? 
Bethânia Pires Amaro - 
“O Ninho” é um livro de ficção, mas algumas histórias foram baseadas em experiências minhas, de mulheres da minha família ou ainda de mulheres com as quais convivi das mais diversas formas. A maioria, porém, consiste numa representação de temas que me comovem e me inspiram enquanto mulher. A ideia foi tornar cada uma destas histórias uma espécie de fotografia, para compartilhar meus olhares sobre aspectos das vivências femininas dentro de suas famílias que muitas vezes permanecem na sombra, sobre as quais se fala em regra muito pouco. Os contos são, assim, uma janela para a intimidade das dinâmicas familiares, especialmente entre mulheres, que convidam o leitor a se aproximar e formar suas próprias opiniões sobre as realidades retratadas ali; não há respostas prontas, mas apenas relações humanas, com todas as falhas, pontos cegos e malícias que permeiam cada um de nós. É um livro que foi pensado para exigir muito do leitor, que busca a todo o momento fazê-lo reagir e interpretar suas próprias reações.


Resenhando.com - Qual é o seu conto favorito?
Bethânia Pires Amaro - 
Seria impossível eleger um conto favorito, seja dentre os meus ou de outros autores, porque cada um conversa com tipos diferentes de sensibilidade. Mas um conto ao qual venho retornando muito nos últimos tempos é o “Depois do Jeans”, do Raymond Carver. Gosto muito da obra dele pelo tratamento da linguagem e do prosaico, de modo que o conto parece quase banal até que todos os elementos se juntam e geram um impacto muito poderoso no leitor. Neste conto, um casal de idosos sai para uma noite de bingo, mas tudo dá errado na noite deles: a esposa descobre um sangramento vaginal, a vaga e a mesa que eles sempre ocupam são tomadas por um casal mais jovem, eles não ganham nada no bingo. O desenrolar desse conto, e sua conclusão, são uma reflexão magnífica sobre o envelhecimento, sobre as pequenas torturas que a passagem do tempo impõe ao corpo de alguém, mas ao mesmo tempo o conto é muito sensível e belíssimo. Há ali um equilíbrio difícil de conseguir, entre a descrição da realidade de uma forma direta e concreta, quase crua, e a ternura que desperta no leitor sem uso de qualquer poética evidente na linguagem. É um trabalho excepcional de técnica narrativa aliado a um olhar muito humano sobre a vida, que me comove e me inspira.


Resenhando.com - O que representa a literatura em sua vida?
Bethânia Pires Amaro - 
A literatura é para mim uma forma essencial de expressão e de compartilhamento da experiência humana com outras pessoas. Sempre li muito justamente por necessitar dessa conexão, por querer estar em contato com os olhares de outros seres humanos sobre o que é estar vivo, o que é se relacionar de tantas formas com o mundo e com os outros.

Resenhando.com - Na sua própria literatura, em que você se expõe mais, e por outro lado, em que você mais se preserva, em seus textos?
Bethânia Pires Amaro - 
Todos os textos expõem muito do autor e com “O Ninho” não é diferente: cada conto traduz um recorte na forma pela qual eu enxergo determinada situação ou conflito. A narrativa realça alguns pontos e deixa outros na sombra, à espera de que o leitor os descubra e construa suas próprias reações. Por isso, embora o livro busque destacar a experiência feminina em contextos familiares, as questões postas ali são universais, conversam com qualquer ser humano que se veja exposto àquelas realidades, que se mostre aberto a ingressar na vivência dessas mulheres e conhecer conflitos sobre os quais nem sempre falamos às claras.   

Resenhando.com - Que conselhos você dá para as pessoas que pretendem enveredar pelos caminhos da escrita?
Bethânia Pires Amaro - 
Penso que cada escritor precisará descobrir seu próprio caminho, no sentido de decidir o que funciona melhor para si, porque na escrita não há fórmulas ou estradas universais. Na minha experiência, ajuda muito ter uma ampla bagagem de leitura, dos clássicos e contemporâneos, e especialmente da literatura nacional, porque assim o escritor pode ter uma boa noção do que se vem fazendo tecnicamente em termos literários e se abre a temáticas com as quais pode não ter tanta familiaridade, expandindo seu repertório. Inserir-se também numa comunidade de escritores, para trocar ideias e textos, e principalmente para receber uma análise crítica do que escrevemos, para mim foi também fundamental. Quando escrevemos, nem sempre temos o distanciamento necessário do texto para garantir que estamos passando ao leitor aquilo que queremos, de modo que um retorno honesto de leitores do manuscrito é muito valioso.


Resenhando.com - Quais livros foram fundamentais para a sua formação enquanto escritora e leitora?
Bethânia Pires Amaro - 
Seria impossível listar todos os livros e autores que considero importantes para minha formação ou eleger um favorito, mas na escrita de “O Ninho” tive como principais referências grandes mulheres e contistas como Lucia Berlin, Alice Munro, Maria Fernanda Ampuero, Giovana Madalosso, Jarid Arraes e Cíntia Moscovich.


Resenhando.com - Como e quando começou a escrever?
Bethânia Pires Amaro - 
Escrevo desde muito pequena e, durante a universidade, incentivada por uma amiga, comecei a participar de concursos de contos, tendo integrado diversas antologias nesse período, quando comecei a conhecer melhor a produção de contistas brasileiros contemporâneos. Após a pandemia, decidi me dedicar mais aos aspectos técnicos de minha escrita literária e frequentei o Curso Livre de Preparação de Escritores - Clipe da Casa das Rosas de São Paulo e a Oficina de Criação Literária da PUC/RS, com o Prof. Dr. Luiz Antonio de Assis Brasil, além de outras oficinas e cursos.


Resenhando.com - É possível viver de literatura no Brasil?
Bethânia Pires Amaro - 
Uma vez que estou ingressando agora no mercado literário, precisaria de mais algum tempo para poder opinar com maiores fundamentos sobre esta pergunta. Parece-me, por uma impressão inicial, que viver de literatura no Brasil apresenta seus desafios e que é essencial um apoio mais sólido das políticas públicas para que o mercado leitor brasileiro consiga atingir seu pleno potencial.  


Resenhando.com - O quanto para você escrever é disciplina?
Bethânia Pires Amaro - 
Penso que disciplina contribui no exercício de qualquer atividade, inclusive para a escrita, embora cada autor deva respeitar seu próprio tempo interno e suas próprias inclinações. Eu, por exemplo, não escrevo todos os dias, nem estabeleço uma carga horária predeterminada ou número mínimo de caracteres, mas tento diariamente estar em contato com livros e outras formas de expressão artística que conversem com o meu texto, de modo a me colocar sempre num estado próximo ao da inspiração. Alimentar a inspiração por um esforço consciente, ao meu ver, é parte da transpiração necessária para escrever um livro, já que este tipo de projeto normalmente leva anos para ser concluído. Além disso, uma vez escrita a primeira versão de um texto, é necessário reescrevê-lo ainda algumas vezes, revisá-lo, passá-lo por alguns leitores, além de tantas outras etapas para que se chegue à versão final. “O Ninho” foi escrito e reescrito ao longo de dois anos e foi fruto de muitos estudos sobre a narrativa, de modo a construir um texto o mais intencional possível, então a ideia de um livro escrito num rompante de inspiração é realmente muito distante da minha experiência pessoal.


Resenhando.com - Você tem um ritual para escrever?
Bethânia Pires Amaro - 
Normalmente não tenho nenhum tipo de ritual, mas, quando estou no meio de um projeto, costumo desenhar a estrutura do livro e ter algumas metas compatíveis com minha rotina e carga de trabalho, em regra medidas em semanas ou meses ao invés de dias. Sou uma escritora que prefere escrever sem muitas amarras e definitivamente sem pressa, maturando as ideias que quero expressar no texto. Ao mesmo tempo, tento sempre me envolver em atividades que se relacionem ao projeto, seja ouvindo determinadas músicas, lendo determinadas obras, frequentando determinados espaços, de modo a me manter conectada com a história.


Resenhando.com - Em um processo de criação, o silêncio e isolamento são primordiais para produzir conteúdo ou o barulho não o atrapalha?
Bethânia Pires Amaro - 
Para mim, o silêncio e isolamento são essenciais. Costumo escrever à noite, em casa, num horário em que já encerrei as outras demandas do dia, para que nada me distraia do texto.


Resenhando.com - Como começar a ler Bethânia Pires Amaro?
Bethânia Pires Amaro - 
“O Ninho” foi planejado com um sequenciamento que tornasse a leitura do livro mais prazerosa e frutífera para o leitor, gerando uma determinada experiência sensorial. Ainda assim, os contos podem ser lidos separadamente, se for da preferência de quem lê.


Resenhando.com - Por qual de seus livros - ou personagem - você sente mais carinho?
Bethânia Pires Amaro - 
Tenho especial carinho pela narradora do conto “Espiral”, um conto que tenta mostrar o quanto distúrbios alimentares muitas vezes passam despercebidos pela família, sendo comumente passados de mãe para filha numa cadeia silenciosa de comportamentos nocivos à saúde da mulher. Os distúrbios alimentares, associados a distúrbios de imagem, são frequentes inclusive entre mulheres que não se imagina que teriam questões deste tipo, apresentam por vezes difícil diagnóstico e são sorrateiros, crescendo em crianças e adolescentes com poucos sinais externos, sem que ninguém ao redor desconfie.


Resenhando.com - Hoje, quem é Bethânia Pires Amaro por ela mesma?
Bethânia Pires Amaro - 
Sou uma autora brasileira que se vê inserida num coletivo de mulheres que vêm tentando abrir espaço na literatura nacional contemporânea para compartilhar nossas vivências e experiências, na esteira de muitas autoras que vieram antes de nós. Penso que caminhamos juntas e nos fortalecemos sempre que incentivamos e divulgamos os trabalhos umas das outras. Leiam mulheres!

Garanta o seu exemplar de "O Ninho", escrito por Bethânia Pires Amaro, neste link.

segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

.: Espetáculo "A Herança" é o melhor do ano. Confira a lista dos outros 12

Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

Listar os 13 melhores do ano é tarefa ingrata em qualquer área. Selecionar as 13 melhores peças teatrais de 2023, em meio a centenas de convites que chegam à nossa redação é, também, algo desafiador e uma viagem teatral ao longo do ano a partir de um critério absolutamente subjetivo: o gosto pessoal de quem elaborou a lista. Vários espetáculos tão bons quanto os que estão nesta lista ficaram de fora, o que não quer dizer que não mereçam ser assistidos. Também confira a lista de Melhores Peças Teatrais de 2022. 


1. "A Herança"
Arrebatador, “A Herança” é o espetáculo do ano. Em 1° lugar da lista de Melhores Peças Teatrais do Ano publicada pelo portal Resenhando.com, a peça teatral premiada na Broadway, passou pelo Teatro Raul Cortez e fez história em São Paulo. Em duas partes que totalizam quase seis horas, que parecem minutos, o público se apaixona e torce pelo personagem defendido por Bruno Fagundes. Com sutileza e muita senibilidade, ele transforma um personagem que poderia ser apenas a caricatura da bondade em alguém para torcer e vibrar por ele. Entregando de modo esmiuçado o que é ser gay, desde a vivência do escritor E. M. Forster, autor de "Retorno a Howards End" refletida no livro "Maurice", até os dias de hoje, "A Herança" é uma peça que continuará atual por muito tempo. Mudam-se os tempos, mas a história se repete. A montagem de Matthew Lopez aborda com sensibilidade e profundidade as gerações de homens gays e seus dilemas. Os atores Reynaldo Gianecchini, em uma interpretação muito corajosa para um artista que ficou conhecido por interpretar muitos galãs nas telenovelas brasileiras, além de Marco Antônio Pâmio, Rafael Primot e André Torquato brilham nos papéis principais. Também fizeram parte do elenco os atores Cleomácio Inácio, Davi Tápias, Felipe Hintze, Gabriel Lodi, Haroldo Miklos, Rafael Américo e Wallace Mendes que se revezam na interpretação de 25 personagens. Um espetáculo para guardar na memória... e no coração.



2. "Uma Linda Mulher - O Musical"

Em 2° lugar na lista de Melhores Peças Teatrais do Ano, o clássico contemporâneo "Uma Linda Mulher" esteve em cartaz como musical até dezembro no Teatro Santander e repetiu a trajetória bem-sucedida do filme filme-fenômeno-pop de 1990, ao fazer uma releitura feminista do clássico dos irmãos Grimm. Tudo nesse espetáculo é grande, desde os cenários que reproduzem as cenas do longa-metragem, até o talento dos protagonistas. A atriz Thais Piza é mais do que carisma e coração ao interpretar Vivian Ward, personagem que alçou Julia Roberts ao estrelato. O risco era alto: as comparações com a interpretação clássica do cinema e outro ainda maior, o de ser devorada por uma personagem tão grande. Com experiência de sobra e a entrega de uma atriz em busca do papel de sua vida, Thais Piza brilhou com uma personagem capaz de demonstrar ao público toda expressividade, potência vocal e até a vulnerabilidade de uma atriz imensa. Par romântico da atriz no espetáculo, Jarbas Homem de Mello consegue ser mais humano que Richard Gere no papel de Edward Lewis, executivo que contrata uma acompanhante para passar uma semana com ele. Confira a crítica: Musical "Uma Linda Mulher" é a surpresa do ano ao focar no carisma.

3. "O Guarda-Costas - O Musical"
Mais do que um espetáculo, "O Guarda-costas - O Musical" é uma celebração à música e à memória de Whitney Houston e está em 3° lugar na lista de Melhores Peças Teatrais do Ano publicada no portal Resenhando.com. A montagem brasileira do espetáculo, produzida pela 4ACT e dirigida por Ricardo Marques e Igor Pushinov, consegue a proeza de ser melhor que o filme da década de 90 que o inspirou. Grande parte do mérito disto acontecer é a entrega da protagonista, interpretada por  Leilah Moreno, que nasceu para o papel. Intérprete da personagem principal, ela está entregue e devora tudo o que vem pela frente em mais de duas horas que parecem minutos. Encantado com o que a artista promove a partir da voz e do talento da artistas, o público não vê o tempo passar. Parece que Leilah Moreno, na pele de Rachel Marron, tem o poder de parar o tempo. Não há outra atriz no mundo capaz de interpretar um papel que foi de Whitney Houston como faz Leilah Moreno neste espetáculo. O ator Fabrizio Gorziza deu vida ao guarda-costas. Fizeram parte do espetáculo os atores Talita Cipriano, Davi Martins, Pedro Galvão, Marcelo Goes, Vinicius Conrad, Nalin Junior, Victor Barreto, Alvaro Real e Daiana Ribeiro. Já o ensemble traz os experientes bailarinos Mari Saraiva, Danilo Coelho, Felipe Tadeu, Leandro Naiss, Lucas Maia, Raquel Gattermeier, Fernanda Salla, Josemara Macedo, Thaiane Chuvas, Vicky Maila e Thiago Alves. Foto: Felipe Quintin. Confira as críticas:
.: "O Guarda Costas - O Musical" consegue ser melhor que o filme
.: "O Guarda Costas - O Musical" em 11 motivos para não perder 
.: Crônica: "O Guarda Costas - O Musical" é showzão de Leilah Moreno. 


4. "Alguma Coisa Podre"
"Há algo de podre no reino da Dinamarca". Essa frase de "Hamlet", escrita há mais de 400 anos por William Shakespeare, dá o tom de "Alguma Coisa Podre", mais que um musical, um fenômeno pop, que esteve em cartaz até dia 6 de agosto no Teatro Porto e está em 4° lugar na lista de Melhores Peças Teatrais do ano publicada no portal Resenhando.com. O espetáculo é solar, para cima e não perde a energia em um só momento - nem quando a ação se passa no segundo ato, quando os espetáculos tendem a cair. Há músicas muito boas e chega a ser irônico que um espetáculo que marca o período da renascença marque, de alguma maneira, o renascimento do teatro depois de uma pandemia em que a arte respirava sobre aparelhos. "Alguma Coisa Podre" é o teatro voltando a lotar mas, sobretudo, é o Brasil voltando a sorrir. No elenco, Marcos Veras, Leo Bahia, George Sauma, Wendell Bendelack, Rodrigo Miallaret, Bel Lima e Laila Garin. Direção Artística: Gustavo Barchilon. Versão brasileira: Cláudio Botelho. Confira as críticas: 


5. "Sylvia"
O mundo mudou depois da primeira temporada do espetáculo "Sylvia", apresentado no Brasil pela primeira vez em 2019. A expectativa, e a curiosidade, era saber de que maneira os atores deste espetáculo mudaram nessa nova temporada, que esteve em cartaz até dezembro no Teatro Porto. A resposta é uma: "Sylvia" é como o vinho e os atores amadureceram as interpretações, tornando tudo ainda mais mágico. O espetáculo está em 5° lugar entre as Melhores Peças Teatrais do Ano publicada no portal Resenhando.com. Além de ter como personagem principal uma dócil cãzinha, "Sylvia" é um espetáculo que se apoia em temas sensíveis como crise de meia idade, síndrome do ninho vazio e responsabilidade afetiva. Destaque para Vera Zimmermann, que teve o desafio de substituir a saudosa atriz François Fourton e se saiu muito bem, e a interpretação delicada e extremamente sensível da personagem-título feita por Simone Zucato, que também assina a tradução da peça escrita por A.R. Gurney. No elenco, também estavam Cássio Scapin e Thiago Adorno, sob a direção de Gustavo Wabner. Confira a crítica à primeira temporada do espetáculo neste link: "Sylvia", papel que foi de Sarah Jéssica Parker, faz autocrítica ao ser humano.


6. "Funny Girl - A Garota Genial"

Escrita por Bianca Tadini e Luciano Andrey, a releitura feminista de"Funny Girl" teve um sucesso estrondoso em São Paulo e no Rio de Janeiro. Dirigida por Gustavo Barchilon, a versão brasileira do clássico foi protagonizada por Giulia Nadruz e Eriberto Leão. Assistimos no Teatro Porto, em São Paulo, com Vânia Canto no papel de Fanny Brice. A personagem para ela, uma mistura de Adele com todas as características de uma atriz de musicais, resultou em uma interpretação arrebatadora. Queremos mais de Vânia Canto como protagonista absoluta no teatro musical em 2024. "Funny Girl - A Garota Genial" tem produção da Barho Produções em parceria com a 7.8 Produções Artísticas. .: Confira a crítica: "Funny Girl - A Garota Genial" em sete motivos para não perder no Porto.


7. "Consentimento"
Com direção de Camila Turim e Hugo Possolo, o espetáculo "Consentimento" é uma tragicomédia divertida no riso nervoso de quem vê diante do espelho suas contradições e fissuras. Com texto da premiada autora inglesa, Nina Raine, espetáculo é contemporâneo e impactante, uma peça que consegue ser contundente, dolorosa e afiada. Você finge que é algo e os outros fingem que acreditam. Assim se mantém a paz entre os relacionamentos - de amigos, amantes e familiares - na vida real. Qualquer semelhança com a vida real não é mera coincidência quando se é colocado diante de um espetáculo do porte de "Consentimento", que ecoa por horas após ser apresentado. É forte, visceral, polêmico e conta com atores que têm gabarito para defender personagens tão contundentes. O espetáculo incomoda e faz valer a máxima de que a arte, muitas vezes, deixa de ser mero entretenimento. Ninguém é anjo no espetáculo - ainda bem - porque a partir de personagens tão inquietantes - e muitas vezes insuportáveis - surgem discussões e questionamentos que ultrapassam as barreiras do palco. No elenco, Flavio Tolezani, Camila Turim, Helô Cintra Castilho, Sidney Santiago Kuanza, Gui Calzavara, Anna Cecília Junqueira e Lisi Andrade. Confira a crítica: "Consentimento" ultrapassa as barreiras do palco ao falar de abusos


8. "Veraneio"
Após uma premiada parceria de sucesso em 2018 em "Pousada Refúgio", o diretor Pedro Granato e o dramaturgo Leonardo Cortez se uniram mais uma vez no espetáculo "Veraneio", que discute dramas familiares, dilemas e agonias do mundo pós-pandêmico com humor afiado. A trama acompanha o reencontro, repleto de curiosidades e dramas, de Dona Laura e seus três filhos amargurados para celebrarem o aniversário da matriarca, interpretada por Clarisse Abujamra. Em um texto sensível, todos se destacam, como uma espécie de engrenagem em que ninguém é dispensável. Todos os atores têm bons momentos e, em determinado momento, o foco gira em torno de cada um deles. Eles representam tipos para tratar da alegoria da vida e apertam o público até a reflexão. É um espetáculo que, além de colocar o dedo nas feridas e em assuntos sensíveis a qualquer família, também aborda a hipocrisia e a descoberta da sexualidade durante a velhice. São assuntos pertinentes e há, com isso tudo, a direção certeira de Pedro Granato - neste espetáculo milimetricamente pensada para não poupar ninguém. "Veraneio" é uma pancada que começa parecendo inofensiva, mas não há como sair ileso. Assistimos dia 21 de julho no Teatro do Sesc Santos. No elenco, Clarisse Abujamra, Glaucia Libertini, Leonardo Cortez, Maurício de Barros, Sílvio Restiffe e Tatiana Thomé. Foto: Nadja Kouchi. Confira a crítica: "Veraneio" é uma alegoria sobre amor e ódio nas famílias.


9. "A Megera Domada"
"A Megera Domada" é uma das peças mais famosas do grande dramaturgo inglês William Shakespeare. A comédia narra as confusões criadas por um grupo de pretendentes pela bela e doce Bianca, após saberem da decisão de seu pai controlador: ela só se casaria após o enlace de sua irmã mais velha, a indomável Catarina, que é refratária à natureza dos relacionamentos amorosos da época. É neste cenário que entra Petruchio que, na busca por um casamento de interesse, se dispõe a enfrentar a fera.  A tradução e a adaptação são dos dramaturgos e roteiristas Fabio Brandi Torres e Isser Korik, que também assina a direção. A nova montagem esteve em cartaz até o final de novembro no Teatro Uol com novo elenco. Agora, Eduardo Semerjian, Leticia Tomazella, Lizandra Cortez, Marcelo Diaz e Pedro Lemos interpretam 16 personagens do texto original, numa troca rápida que vai além do figurino. A exigência de uma mudança interna para cada personagem, desafia os atores e exige um grande preparo técnico. Confira a crítica: A Megera Domada": cinco motivos para não perder a comédia em SP. 


10. "Grease, o Musical"
"Grease é o caminho", destaca o refrão da música clássica do trio Bee Gees que dá nome ao teatro musical da produtora 4Act Entretenimento, "Grease, o Musical", que encerrou as apresentações dia 6 de março do ano passado com muita energia e emoção, no Teatro Claro SP. O espetáculo é inspirado no musical da Broadway de 1971, que foi transformado no icônico filme de 1978, estrelado por John Travolta e Olivia Newton-John. A jovialidade do elenco, em coreografias e figurinos impecáveis reforçaram a engrenagem do musical sobre a história de amor de Danny e Sandy, que acontece durante o verão dos anos 50, nas praias da Califórnia. Com a volta às aulas, eles se reencontram de modo inesperado, afinal, ele não é tão doce como se mostrou, Danny lidera a gangue do Burguer Palace Boys. Enquanto que a mocinha certinha vai se enturmando com as Pink Ladies, Danny tenta seu lado de atleta - sem sucesso. O enredo condizente a uma época ultrapassada, reflete quando as mocinhas deveriam seguir certas condutas para evitar que fossem rotuladas da pior forma. De fato, "Grease" é o retrato da liberdade feminina que começava a se desenhar. No elenco, Tiago Prado, Luli, Alice Zamur, Nathan Leitão, Sofie Orleans, Carol Pita, Camila Brandão, Pedro Nasser, Rafa Diverse e outros. Não há como negar que rever no teatro em nova montagem do meu filme favorito, após tantos anos, foi extremamente emocionante. Confira a crítica: "Grease, o Musical" resgata nos palcos clássico sobre os anos 50.


11. "Pagú - Até Onde Chega a Sonda"
Um manuscrito, ainda inédito, deixado pela escritora, poeta, feminista, desenhista, jornalista e militante Patrícia Rehder Galvão, a Pagú (1910-1962) é o ponto de partida para o espetáculo, que tem direção de Elias Andreato e atuação de Martha Nowill - que também assina o texto e tem o poder de transformar um texto tão denso em algo mais leve. É preciso muita sensibilidade e empatia para conseguir fazer isso.  A dramaturgia, assinada pela atriz que protagoniza a peça, foi escrita a partir de um manuscrito inédito que Pagú produziu enquanto estava presa. Duas mulheres, uma em 1939 na Casa de detenção, outra mãe de gêmeos em plena pandemia, contam suas histórias. O resultado é trancedental. Foto: Rodrigo Chueri.


12. "O Avesso da Pele"
Montagem teatral oficial do premiado romance escrito por Jeferson Tenório (Prêmio Jabuti 2021), o espetáculo "O Avesso da Pele" se passa em Porto Alegre, na década de 80, e conta a história de Pedro, filho de um professor de literatura assassinado em uma desastrosa abordagem policial. Após este episódio, ele inicia uma investigação acerca de suas origens, o passado da sua família e a trajetória de seu pai, Henrique. Construindo assim, uma jornada que elucida, não só questões de paternidade preta em um país marcado pelo racismo, mas também os caminhos que levam ao afeto e à redenção. A peça é idealizada pelo Coletivo Ocutá, com direção de Beatriz Barros e tem o elenco composto por Alexandre Ammano, Bruno Rocha, Marcos Oli e Vitor Britto. Em cena, os quatro atores se alternam entre os personagens, em um movimento em que todos serão pai e filho em algum momento. Assistimos ao espetáculo no dia 26 de agosto no Teatro do Sesc Santos. Foto: Helt Rodrigues.



13. 
"Frida Kahlo - Viva la Vida"
Com atuação de Christiane Tricerri e direção de Cacá Rosset, o espetáculo “Frida Kahlo - Viva la Vida” mostra um novo olhar sobre a vida da artista mexicana, com o texto de Humberto Robles, considerado um dos maiores dramaturgos mexicanos. O solo traz uma Frida Kahlo lúcida, solar e cáustica, que celebra o triunfo paradoxalmente no Dia dos Mortos. Enquanto prepara um jantar para convidados, vivos ou mortos, passeia por sua vida relembrando e trazendo os personagens que passaram por sua história. A produção é de Alonso Alvarez. Assistimos no dia 21 de julho no Teatro do Sesc. Foto: Isadora Tricerri. 
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