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sexta-feira, 4 de agosto de 2023

.: Espetáculo "Veraneio" ganha nova temporada no Teatro Bravos


Montagem escancara desconforto em famílias no pós-pandemia com humor afiado. Foto: Nadja Kouchi
 
O espetáculo "Veraneio" engata nova temporada no Teatro Bravos, em Pinheiros, de 5 a 27 de agosto, com sessões aos sábados, às 21h, e domingos, às 19h. A montagem estreou em janeiro de 2023 no Sesc Ipiranga, e em menos de seis meses já realizou duas temporadas na capital paulista, circulação pelos Sescs de Sorocaba e Santos, e apresentação na Virada Cultural, tendo grande repercussão de público e imprensa. Confira a crítica do espetáculo neste link: "Veraneio" é uma alegoria sobre amor e ódio nas famílias.

A montagem consolida a parceria entre Leonardo Cortez e Pedro Granato, que começou em 2018 com o premiado Pousada Refúgio. O elenco traz como novidade Clarisse Abujamra que se une ao time de Pousada Refúgio formado por Glaucia Libertini, Maurício de Barros, Sílvio Restiffe, Tatiana Thomé e Leonardo Cortez.

A trama, que revela os desdobramentos tragicômicos de um encontro familiar em uma casa de praia, arrebatou público e crítica quando estreou no Sesc Ipiranga em janeiro de 2023, com ingressos esgotados. O público acompanha o reencontro de Dona Laura e seus três filhos amargurados para celebrarem o aniversário da matriarca, interpretada por Clarisse Abujamra. 

O cenário é a uma casa à beira-mar recém-comprada por uma das filhas, Hercília, decadente apresentadora de televisão e incomodada com a presença da mãe no seu refúgio. Ela e os irmãos, Silvio e Mario Sérgio, estão ansiosos para conhecer o novo e misterioso namorado de Dona Laura, um animado professor de ginástica. A expectativa por esse encontro e as novidades que ele traz afetam a relação familiar.

"Veraneio" é um aprofundamento da pesquisa iniciada para Pousada Refúgio, primeiro encontro da dupla Granato e Cortez, que estreou em 2018 e abordava o desmoronamento dos sonhos e da hipocrisia de dois casais de classe média. A obra foi sucesso de público e crítica e ganhou temporadas em vários teatros de São Paulo também no ano seguinte. 

A peça foi indicada a importantes prêmios para Leonardo Cortez como Shell, APCA e Aplauso Brasil e, entre as distinções de destaque, está a de melhor ator para Maurício de Barros no Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). A história de sucesso das peças não se encerra no teatro: elas já estão sendo adaptadas para o cinema, em parceria com a produtora argentina PBA Cinema, responsável pela produção do filme “Medianeras”.

Assim como a antecessora, Veraneio trabalha um texto contemporâneo para refletir não só sobre os efeitos do isolamento e do afastamento das famílias, mas também do novo desafio que se coloca quando essas pessoas se reencontram com bagagens cheias de traumas, perdas, frustrações e angústias. 

O texto coloca o espectador e a sociedade no espelho, pois sua construção e suas referências estão muito ligadas às angústias vividas pelos brasileiros nos últimos anos, atravessando não só uma crise sanitária, mas turbulências políticas e econômicas. Apesar da carga dramática e emocional que essa discussão pode despertar, a peça também quer provocar pelo humor. 

Tudo é retratado por meio de diálogos ágeis e afiados, que marcam o estilo do dramaturgo, com a sensação de desestabilização das personagens. Inclusive a escolha do título da peça está ligada a essa intenção provocadora, esclarece Cortez, autor reconhecido no teatro por sua sensibilidade para tratar cotidianos e incômodos brasileiros. Além da vasta carreira na dramaturgia, ele fez sua estreia no cinema com o filme Down Quixote no Festival do Rio este ano.


Sinopse
O aniversário da mãe é o mote para o reencontro familiar com três filhos amargurados. Todos estão ansiosos por conhecer o novo namorado que a mãe conheceu na praia durante a pandemia. Os dilemas e agonias do mundo pós pandêmico se misturam com a descoberta do amor na melhor idade.


Ficha técnica:
Espetáculo "Veraneio". Idealização: Leonardo Cortez e Pedro Granato. Texto: Leonardo Cortez. Direção: Pedro Granato. Elenco: Clarisse Abujamra, Glaucia Libertini, Leonardo Cortez, Maurício de Barros, Sílvio Restiffe e Tatiana Thomé. Cenário e Adereços: Diego Dac. Iluminação: Beto de Faria. Figurino: Anne Cerutti. Cenotécnico: Roberto Tomasim. Costureira: Binidita Apelina. Assistente de Direção: Jade Mascarenhas. Assistente de Figurino: Luiza Spolti. Assistente de costura: Lis Regina. Produção Executiva: Carolina Henriques. Direção de Palco: Diego Dac. Técnicos de Palco: Victor Moretti e Roberto Tomasim. Técnico de Luz: Ariel Rodrigues e Beto de Faria. Técnica de Som: Julia Terron. Assessoria de Imprensa: Adriana Balsanelli. Video e Edição de Conteúdo: Carolina Romano. Fotos de cena: Nadja Kouchi. Fotos Material Gráfico:Roberto Brilhante. Design Gráfico: Lucas Sancho.  Direção de Produção: Jessica Rodrigues. Realização: Jessica Rodrigues e Pequeno Ato.


Serviço:
Espetáculo "Veraneio". Temporada: de 5 a 27 de agosto. Sábados, às 21h. e domingos, às 19h. Exceto dia 13 de agosto. Ingressos: R$ 80 e R$40,00. Vendas on-line https://www.sympla.com.br/Duração: 110 minutos. Classificação: 14 anos. Teatro Bravos – Rua Coropé, 88 - Pinheiros, São Paulo – SP. Telefone (11) 99008-4859. Bilheteria física: De terça à domingo das 13h às 19h ou até o início do último espetáculo. Capacidade: 611 lugares. Acessibilidade.


Ficha técnica
Idealização: @leonardofcortez e @pdgranato. Texto: @leonardofcortez. Direção: @pdgranato. Elenco: @clarisse_abujamra , @glaucialibertini , @leonardofcortez , @mauricio_de_barros , @silviorestiffe e @tatiana_thome. Cenário e adereços: @digodac. Iluminação: @beto77. Figurino: @annecerutti. Cenotécnico: @robertocenotecico. Costureira: Binidita Apelina. Assistente de Direção: @jademasc. Operação de som: @terrrrrron. Assistente de figurino: @lluizaspolti. Assistente de costura: Lis Regina. Produção executiva: @carol_m_henriques. Video e edição de conteúdo: @_carolinaromano. Direção de palco: @digodac. Técnicos de palco: @vmoretti_ @robertocenotecnico. Técnico de Luz: @beto77. Assessoria de Imprensa: @abalsanelli. Fotos espetáculo: @nadjakouchi. Fotos material gráfico: @betojpeg. Design gráfico: @lucasancho. Direção de produção: @_jazzrodri. Realização: @_jazzrodri e @pequenoato. 

sexta-feira, 21 de julho de 2023

.: Crítica: "Veraneio" é uma alegoria sobre amor e ódio nas famílias


Por 
Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

Há muita humanidade, e a ausência desse sentimento, nas relações humanas mostradas em "Veraneio", exibido na semana passada no Sesc Santos, que nesta sexta-feira, dia 21 de julho traz "Frida - Viva La Vida", mais informações neste link - e agora em cartaz no Teatro Bravos. O espetáculo dirigido por Pedro Granato e escrito por Leonardo Cortez, que atua na peça, trata de pessoas que se amam e não conseguem conviver porque estão tão envolvidos em suas vidas que já não há mais espaço para nada. Em alguns momentos, parecem se odiar, e que o confronto vai explodir a qualquer momento. O espetáculo celebra esses sentimentos antagônicos como uma espécie de ode. 

O pano de fundo é o aniversário da matriarca da família, interpretada por Clarisse Abujamra, uma atriz que dá um toque de delicadeza e sofisticação em todos os projetos em que se envolve. A personagem interpretada por ela reúne os filhos sob o pretexto de comemorar o aniversário para apresentar o novo namorado. No primeiro momento, há a apresentação dos personagens - todos sobreviventes da pandemia de covid-19. Todos interagem entre si, mas ninguém conversa, muito menos se interessa pelo outro. Estão muito envolvidos em seus próprios dramas pessoais. 

Em um texto sensível, todos se destacam, como uma espécie de engrenagem em que ninguém é dispensável. Mas é com a chegada de Rubinho, o namorado da matriarca, que o espetáculo ganha cor. Ele entra na história para remexer as estruturas da família, que já estão danificadas. É um personagem incisivo e extremamente carismático, feito sob medida para o talento do ator Maurício de Barros, que sabe, como ninguém, tirar boas risadas - até mesmo em uma atmosfera tão pesada.

Todos os atores têm bons momentos e, em determinado momento, o foco gira em torno de cada um deles. Sílvio Restiffe, como o filho depressivo, Tatiana Thomé, como a esposa magoada, Glaucia Libertini, como a filha egocêntrica e rica, uma atriz extremamente carismática e engraçada - principalmente quando se mostra indignada ao descobrir os segredos da mãe. Leonardo Cortez, autor desse texto repleto de tanto material humano, brilha como o filho piadista que esconde uma dor profundal.

Todos fazem a dinâmica deste espetáculo evoluir até o ponto de colisão. Eles representam tipos para tratar da alegoria da vida e apertam o público até a reflexão. É um espetáculo que, além de colocar o dedo nas feridas e em assuntos sensíveis a qualquer família, também aborda a hipocrisia e a descoberta da sexualidade durante a velhice. São assuntos pertinentes e há, com isso tudo, a direção certeira de Pedro Granato - neste espetáculo milimetricamente pensada para não poupar ninguém. É como diz o velho ditado: uma mãe pode cuidar de dez filhos, mas dez filhos não conseguem cuidar de uma mãe. "Veraneio" é uma pancada que começa parecendo inofensiva, mas não há como sair ileso.

Ficha técnica:
"Veraneio" no Teatro Bravos. 
Idealização: Leonardo Cortez e Pedro Granato. Texto: Leonardo Cortez. Direção: Pedro Granato. Elenco: Clarisse Abujamra, Glaucia Libertini, Leonardo Cortez, Maurício de Barros, Sílvio Restiffe e Tatiana Thomé. Cenário e Adereços: Diego Dac. Iluminação: Beto de Faria. Figurino: Anne Cerutti. Cenotécnico: Roberto Tomasim. Costureira: Binidita Apelina. Assistente de Direção: Jade Mascarenhas. Assistente de Figurino: Luiza Spolti. Assistente de costura: Lis Regina. Produção Executiva: Carolina Henriques. Direção de Palco: Diego Dac. Técnico de Luz: Ariel Rodrigues e Beto de Faria. Técnica de Som: Jade Mascarenhas. Assessoria de Imprensa: Flavia Fusco. Fotos e Registro em Vídeo: Nadja Kouchi. Direção de Produção: Jessica Rodrigues. Realização: Contorno Produções e Pequeno Ato.


Serviço
"Veraneio" no Teatro Bravos. 
Duração: 80 minutos. Classificação: 14 anos. Gênero: tragicomédia. Temporada: De 5 a 27 de agosto - Sábados às 21h e domingos às 19h. Exceto dia 13 de agosto. Ingressos: R$ 80 e R$ 40.Vendas on-line https://bileto.sympla.com.br/event/85186Horário da bilheteria: de terça à domingo das 13h às 19h ou até o início do último espetáculo. Formas de Pagamentos aceitas na bilheteria: Aceitamos todos os cartões de crédito, débito e dinheiro. Não aceitamos cheques. Local: Teatro Bravos. Rua Coropé, 88 – Pinheiros. Complexo Aché Cultural, entre as Avenidas Faria Lima e Pedroso de Morais. Abertura da casa: 1 horas antes do espetáculo. Café no 3º andar. Capacidade da casa: 611 lugares Acessibilidade para deficiente físico e obesos. Estacionamento: MultiPark - R$ 39,00 (até 3 horas).

sábado, 15 de julho de 2023

.: Crítica: fenômeno pop, "Alguma Coisa Podre" é um grito parado no escuro


Rivais na ficção, Marcos Veras e George Sauma brilham no espetáculo que revela ao público o melhor de suas interpretações. Foto: Caio Gallucci

Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

"Há algo de podre no reino da Dinamarca". Essa frase de "Hamlet", escrita há mais de 400 anos por William Shakespeare, dá o tom de "Alguma Coisa Podre", mais que um musical, um fenômeno pop, que está em cartaz até dia 6 de agosto no Teatro Porto. Há um momento sublime no fenômeno espetáculo, que é nítido - e ao mesmo tempo, chocante - ao público. É quando Marcos Veras canta pela primeira vez e entoa uma canção que parece sair de um espaço sutil entre a alma e o inatingível. Como um grito parado no escuro. 

É algo que que, aparentemente, estava escondido durante muito tempo ou que somente poucos, os íntimos, conheciam. Esqueçam tudo o que já se sabe sobre ele, toda a trajetória de sucesso e toda a fama conquistada na televisão. É no teatro, mais precisamente no momento da primeira música que ele canta no espetáculo, é que se enxerga o artista como um todo em um momento de glória. É algo grandioso porque mistura sensibilidade, entrega e muita exposição. 

Sob a direção competente de Gustavo Barchilon, o quadro pintado por Marcos Veras na pele de Nick do Rêgo Soutto remete a Stephen Dedalus, alter ego literário de James Joyce no romance "Retrato de Um Artista Quando Jovem", que mostra um jovem em busca de identidade, seja ela artística, política ou pessoal. É esse encontro do artista com a sua arte que costura todo o espetáculo pautado pelos bastidores fictícios da escrita de "Hamlet", peça teatral mais célebre de William Shakespeare, escrita há mais de 400 anos. Ou, na ficção, a história de como surgiu o primeiro espetáculo do teatro musical.

Essa é a premissa de "Something Rotten" nome original do musical escrito por Karey Kirkpatrick e John O’Farrell com músicas de Karey e Wayne Korkpatrick, cuja versão brasileira é assinada por Claudio Botelho. Além do protagonista Marcos Veras, destacam-se vários artistas. Faz contraponto com ele o comediante George Sauma, explêndido no papel de um afetadíssimo William Shakespeare, em uma interpretação que soa como uma homenagem a Ney Latorraca nos tempos de "Vamp". Histriônico, provocativo, megalomaníaco e imenso no palco como o personagem requer. Mas nessa mistura de referências também há um George Sauma no seu auge artístico.

Todas as interpretações fazem de "Alguma Coisa Podre" um espetáculo delicioso. Laila Garin, indiscutivelmente uma sumidade no teatro, interpreta a esposa de Veras que busca, enquanto mulher na era da Renascença, um lugar no mundo. É um papel leve, que destaca todo o carisma da artista, em um musical que segue em um crescente para um final épico. Bel Lima, que já se destacou em "Pippin" (crítica neste link), brilha como a doce Portia, ao lado de Leo Bahia, Nigel do Rêgo Soutto. No teatro, eles formam um casal que esbanja química e grandes momentos deste musical.

Sempre carismática e com uma voz que acolhe e encanta, Bel Lima vem se destacando como um dos grandes nomes do teatro musical e merece cada vez mais atenção. Wendell Bendelack, como o vidente  Nostradamus, e Rodrigo Miallaret, como o irmão Jeremias, aparecem em interpretações memoráveis e completam a experiência desse espetáculo que têm algo a mais.

"Alguma Coisa Podre" é solar, para cima e não perde a energia em um só momento - nem quando a ação se passa no segundo ato, quando os espetáculos tendem a cair. Há músicas muito boas e chega a ser irônico que um espetáculo que marca o período da renascença marque, de alguma maneira, o renascimento do teatro depois de uma pandemia em que a arte respirava sobre aparelhos. "Alguma Coisa Podre" é o teatro voltando a lotar mas, sobretudo, é o Brasil voltando a sorrir.

Ficha técnica:
"Alguma Coisa Podre". 
Elenco: Marcos Veras (Nick do Rêgo Soutto). Leo Bahia (Nigel do Rêgo Soutto). George Sauma (Shakespeare). Wendell Bendelack (Nostradamus). Rodrigo Miallaret (Irmão Jeremias). Bel Lima (Portia). Participação especial de Laila Garin (Bea). Produtores Executivos: Renata Borges e Thiago Hofman. Direção Artística: Gustavo Barchilon. Versão Brasileira: Cláudio Botelho. Coreografia/Direção Movimento: Alonso Barros. Direção Musical: Thiago Gimenes. Figurino: Fábio Namatame. Cenário: Duda Arruk. Design de Som: Tocko Michelazzo e Gabriel Bocutti. Design de Luz: Maneco Quinderé. Visagismo e Perucaria: Feliciano San Roman. Diretora Residente: Vanessa Costa. Assessoria de Imprensa: Trigo Casa de Comunicação. Marketing Cultural: R+Marketing. Fotógrafo: Caio Galucci. Direção de Arte: Gustavo Perrella. Gestão de Projetos: Natalia Egler.


Serviço:
"Alguma Coisa Podre".
Até dia 6 de agosto. Sextas, às 20h. Sábados, às 16h e 20h. Domingos, às 15h e 19h. Ingressos: Plateia: R$ 250 (inteira)/ R$125 (meia-entrada). Balcão e frisas: R$150/ R$75 (meia-entrada). Balcão preço popular R$ 50 (inteira)/ R$ 25 (meia-entrada). Duração: 130 minutos. Classificação: 14 anos. Link vendas: https://bileto.sympla.com.br/event/82003


Teatro Porto
Al. Barão de Piracicaba, 740 – Campos Elíseos - São Paulo. Telefone (11) 3366.8700. Bilheteria: aberta somente nos dias de espetáculo, duas horas antes da atração. Clientes Porto Seguro Bank mais acompanhante têm 50% de desconto. Clientes Porto mais acompanhante têm 30% de desconto. Vendas: www.sympla.com.br/teatroporto. Capacidade: 484 lugares. Formas de pagamento: Cartão de crédito e débito (Visa, Mastercard, Elo e Diners). Acessibilidade: 10 lugares para cadeirantes e 5 cadeiras para obesos. Estacionamento no local: Gratuito para clientes do Teatro Porto.

quinta-feira, 15 de junho de 2023

.: #Resenhando20Anos: "Quando Tudo Estiver Pronto" no Teatro Folha

No dia 4 de junho de 2023 o Resenhando.com completa 20 anos. Durante esse mês, matérias emblemáticas que foram destaque no portal editado pelos jornalistas Mary Ellen Farias dos Santos e Helder Moraes Miranda serão republicadas. Ao fazer essa visita ao passado, percebemos que os textos conseguem estar muito atuais. 

Algumas delas, republicadas na íntegra, embora extremamente relevantes, apresentam aspectos datados ou têm marcas de expressões, pensamentos e linguagens que podem estar ultrapassadas, mas são um registro da história deste veículo. A resenha crítica do espetáculo teatral "Quando Tudo Estiver Pronto" é uma das mais lidas nos 20 anos de Resenhando.com.

Leia a postagem original: .: "Quando Tudo Estiver Pronto" reorganiza conflitos no Teatro Folha

Cartaz do espetáculo "Quando Tudo Estiver Pronto", no Teatro Folha, em São Paulo

Por: Mary Ellen Farias dos Santos
Em julho de 2019


Um drama familiar muito bem contado é de emocionar e provocar diversas reflexões. Eis que na peça "Quando Tudo Estiver Pronto", em cartaz de sexta a domingo, no Teatro Folha, em São Paulo, a temática desabrocha de um modo suave deixando a sensação de que o público tem o dever de espiar a forma que aquela família de judeus lida com a morte inesperada, e, em silêncio, torcer para que pai, filho, sogra, sogro e cunhada consigam reorganizar suas vidas, embora Estela, a mãe, esteja morta.

Com direção, tradução e trilha sonora do judeu Isser Korik, no palco e em perfeita harmonia estão Otavio Martins (pai, Samuel), Patricia Pichamone (mãe, Estela), Lilian Blanc (avó), Sylvio Zilber (avô), Eliete Cigaarini (cunhada) e Filipe Ribeiro (filho) defendendo a história de despedida prematura da mãe da família. Em "Quando Tudo Estiver Pronto" o ponta-pé inicial é dado diante da perda da jovem Estela. Logo, pai (Otavio Martins) e filho (Filipe Ribeiro) têm duas formas distintas de lidar com a morte da figura feminina da casa: a esposa e a mãe. O conflito de gerações é tão verídico que faz rir!

Seja na falta de meias palavras e ajuda indelicada, mas hilária da sogra da defunta (Lilian Blanc) ou pela forma, até irônica, do filho (Filipe Ribeiro) de responder ao pai Samuel (Otavio Martins) a respeito das lembranças floridas que decide trazer da esposa falecida. O texto do americano premiado Donald Margulies, é tocante, embora seja, por vezes e na medida certa, suavizado com bom humor. 

No entanto, em "Quando Tudo Estiver Pronto"a problemática em questão não é somente a necessidade de aceitação da morte da jovem mãe (Patricia Pichamone), mas quando, uma semana após a tragédia ocorrida em um restaurante, a própria retorna ao convívio familiar. Cansada por sair da cova e tanto caminhar, a mãe volta com as mesmas manias e a necessidade de organizar tudo. Afinal, a morta reencontra a casa cheia de móveis, pai e filho em pleno conflito, além das visitas de Issac, o apaixonado sogro (Sylvio Zilber), de Clara, a sogra decidida e sem papas na língua (Lilian Blanc) e da divertida e conciliadora cunhada (Eliete Cigaarini). 

A peça é um afago aos apaixonados por teatro que buscam narrativa e representação com excelência. "Quando Tudo Estiver Pronto" é o tipo de montagem que deixa um gostinho de quero mais. Sensação criada, provavelmente, pelo elenco em perfeita sincronia que estabelece um elo entre público e personagens, gerando a expectativa da volta de cada um ao palco, seja para extravasar as emoções ou para fazer rir. Belíssimo e imperdível!! O espetáculo está em cartaz no Teatro Folha, que fica dentro do Shopping Pátio Higienópolis.


Crédito: Heloísa Bortz

FICHA TÉCNICA
Texto: Donald Margulies
Elenco: Otavio Martins, Patricia Pichamone, Lilian Blanc, Sylvio Zilber, Eliete Cigaarini e Filipe Ribeiro
Cenografia e Figurinos: Márcio Vinicius
Fotografia: Heloísa Bortz
Desenho de Luz: César Pivetti e Vânia Jaconis
Produção Executiva e Administração: Will Siqueira
Assessoria de Imprensa: Pombo Correio
Coordenação de Marketing: Emanoela Abrantes
Criação Gráfica: Marjorie Costa
Mídias Sociais: Pedro Tavares
Equipe técnica: Jardim Cabine
Realização: Ian Soffredini Korich Participações e Serviços Teatrais Ltda
Direção, Tradução e Trilha Sonora: Isser Korik

SERVIÇO: QUANDO TUDO ESTIVER PRONTO
Estreia: 21 de junho 
Temporada até: 15 de setembro 
Apresentações: sexta 21h30; sábado e domingo, 20h
Ingresso: R$ 70 (setor 1) e R$ 50 (setor 2)
Duração: 70 minutos
Classificação etária: 12 anos

TEATRO FOLHA
Shopping Pátio Higienópolis – Av. Higienópolis, 618 / Terraço 
tel.: (11) 3823-2323 – Televendas: (11) / 3823 2423 / 3823 2737 / 3823 2323. Vendas on line: www.teatrofolha.com.br
Vendas por telefone e no site do teatro / Capacidade: 305 lugares / Não aceita cheques / Aceita os cartões de crédito: todos da Mastercard, Redecard, Visa, Visa Electron e Amex / Estudantes e pessoas com 60 anos ou mais têm os descontos legais / Clube Folha 50% desconto. Horário de funcionamento da bilheteria: terça a quinta-feira, das 15h às 21h; sexta-feira, das 15h às 21h30; sábado, das 12h às 22h30; domingo, das 12h às 20h / Acesso para cadeirantes / Ar-condicionado / Estacionamento do Shopping: R$ 14,00 (primeiras duas horas) / Venda de espetáculos para grupos e escolas:  (11) 3661-5896, (11) 97628-4993 / Patrocínio do Teatro Folha: Folha de S.Paulo, Consigaz, Owens-llinois, EMS, Bain & Company, Grupo Pro Security, Previsul, Brasforma, NR Acampamentos, Nova Chevrolet.

SOBRE A CONTEÚDO TEATRAL: O grupo empresarial paulista Conteúdo Teatral atua há mais de quinze anos em duas vertentes: gestão de salas de espaços e produção de espetáculos. Como gestora é responsável pela operação do Teatro Folha, no Shopping Pátio Higienópolis, com direção artística e comercial de Isser Korik, programando espetáculos para temporada em regime de coprodução. No período de atuação a empresa soma mais de 2 milhões de espectadores.

Como produtora de espetáculos, viabilizou dezenas de peças, como “Gata Borralheira”, “O Grande Inimigo”, “Os Saltimbancos”, “A Pequena Sereia”, “Grandes Pequeninos”, “Branca de Neve e os Sete Anões”, “A Cigarra e a Formiga”, “Cinderela” e “Chapeuzinho Vermelho” para as crianças. Para os adultos foram realizadas, entre outras montagens, “A Minha Primeira Vez”, “Os Sete Gatinhos”, “O Estrangeiro”, “Senhoras e Senhores”, “O Dia que Raptaram o Papa”, “E o Vento Não Levou”, “Equus” a trilogia “Enquanto Isso…”, além de projetos de humor – como “Nunca Se Sábado…” e “IMPROVISORAMA” – Festival Nacional de Improvisação Teatral. Em parceria com Moeller e Botelho produziu os Musicais “Um Violinista no Telhado”, “Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 Minutos”, “Nine – Um Musical Felliniano” e “Beatles num Céu de Diamantes”.

*Mary Ellen Farias dos Santos é criadora e editora do portal cultural Resenhando.com. É formada em Comunicação Social - Jornalismo, pós-graduada em Literatura e licenciada em Letras pela UniSantos - Universidade Católica de Santos. Twitter: @maryellenfsm



Encerramento de "Quando Tudo Estiver Pronto"

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quinta-feira, 8 de junho de 2023

.: Crítica: "O Guarda Costas - O Musical" consegue ser melhor que o filme

Leilah Moreno brilha no papel de sua vida no teatro. Última apresentação de "O Guarda-costas - O Musical" será neste domingo, no Teatro Claro SP. Foto: Foto: Helena Mello

Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

Mais do que um espetáculo, "O Guarda-costas - O Musical" é uma celebração à música e à memória de Whitney Houston e pode ser visto até este domingo, dia 11 de junho, no Teatro Claro SP. A montagem brasileira do espetáculo, produzida pela 4ACT e dirigida por Ricardo Marques e Igor Pushinov, consegue a proeza de ser melhor que o filme da década de 90 que o inspirou. Grande parte do mérito disto acontecer é a entrega da protagonista, interpretada por Leilah Moreno, que nasceu para o papel. 

Intérprete da personagem principal, ela está entregue e devora tudo o que vem pela frente em mais de duas horas que parecem minutos. Encantado com o que a artista promove a partir da voz e do talento da artistas, o público não vê o tempo passar. Parece que Leilah Moreno, na pele de Rachel Marron, tem o poder de parar o tempo. Não há outra atriz no mundo capaz de interpretar um papel que foi de Whitney Houston como faz Leilah Moreno neste espetáculo.

Caloura do programa Raul Gil há 20 anos, quando ele ainda estava na Record TV, e vocalista da banda "Altas Horas", de Serginho Groisman na TV Globo, ela dá a impressão de que se preparou para o papel a vida inteira, até mesmo antes de saber que ele viria. E o que se vê no palco vai além de uma artista interpretando o papel de sua vida: é uma mulher realizando um sonho. 

No espetáculo, personagem e intérprete se misturam de uma maneira muito delicada e bonita. Sorte a do mundo ter presenciado uma voz como Whitney Houston para ouvir. Sorte a dos brasileiros terem Leilah Moreno para representá-la e, também, ser a artista que é, já que não se atém apenas a covers na produtiva carreira que mantém desde que estreou na televisão como um jovem promissora.

O musical não se atém às músicas do filme. Há, também, um compilado de hits da própria Whitney Houston, como "Greatest Love of All", "How Will I Know", "One Moment in Time" e "I Wanna Dance With Somebody", grandes sucessos da intérprete internacional, que não estão na trilha do longa-metragem, mas fazem total sentido estar na trilha da peça - além de o público gostar de ouvir, também foram em parte responsáveis para que Whitney Houston fosse convidada para o papel devido ao sucesso que tiveram quando foram lançados. No final, "O Guarda-Costas - O Musical" também pode ser visto como um grande show que homenageia uma artista imortal.

O espetáculo não faz apostas ousadas, o que é ótimo, e há pouquíssimas versões em português das canções do filme - que são boas, mas que talvez pudessem soar como "blasfêmias" a uma obra que não precisa ser mexida. As versões, quando aparecem, começam no idioma original. Não há muitas trocas de cenário, mas há muitos figurinos usados por Leilah Moreno. Eles fazem questão de lembrar o porquê de a personagem Rachel Marron ser tão emblemática até hoje no mundo do cinema.

Outro destaque é Talita Cipriano, finalista da terceira temporada do "The Voice Kids" há cinco anos. Agora uma jovem adulta, ela encara o desafio de interpretar o papel de Nicki, a irmã invejosa de Rachel - no espetáculo, no entanto, bem mais profunda e "boazinha" do que no filme - já que dá para entendê-la e, em partes, torcer por ela. São dela alguns dos grandes momentos do espetáculo.

Fabrizio Gorziza, que interpreta o segurança Frank Farmer, papel que pertenceu a Kevin Costner no filme. O guarda-costas brasileiro é extremamente carismático e dá humanidade a um personagem que é bem mais desafiador do que aparenta por ser tão seco. É muito coerente, também, o personagem não cantar - o que seria estranho dentro de todo o contexto. Isso só acontece em um momento engraçadinho do musical: quando ele canta desafinadamente “I Will Always Love You” em um karaokê.

Isso dá ainda mais sentido ao ponto alto do espetáculo, na grand-finale que todos esperam. Depois de passar pelos clássicos do longa-metragem “Run to You” e “I Have Nothing”, a protagonista relembra a música que foi cantada para ela, despretensiosamente, na noite do primeiro encontro, em um karaokê.  

Vinicius Conrad, o stalker do espetáculo, é realmente assustador. No papel do filho de Rachel, o menino Pedro Galvão, como Fletcher une momentos de fofura e talento nato a um espetáculo perfeito e sem pontas soltas. Tudo em "O Guarda-costas - O Musical" é natural, embora se saiba que foi exaustivamente ensaiado. O mérito de não deixar perceber o trabalho duro por traz dessa naturalidade é mérito de todos os envolvidos em um espetáculo desse porte. Nada parece forçado ou piegas.

"O Guarda-costas - O Musical" é uma celebração à vida, ao amor, ao cinema e, principalmente ao teatro. Pena que a última apresentação será na véspera do Dia dos Namorados no Brasil, embora a antecipação da data possa levar alguns casais a mais para assistir a esse, que é o espetáculo do ano.


Ficha técnica
"O Guarda-Costas - O Musical"
Equipe criativa. Diretor: Ricardo Marques. Diretor associado: Igor Pushinov. Diretor musical: Paulo Nogueira. Coreografo: Tutu Morasi. Cenário: Rogério Falcão. Visagista: Antonio Vanfill. Figurino: Bruno Oliveira. Desenho de som: Marcelo Claret. Desenho de luz: Rogério Cândido. Desenho de luz associado: Marcel Rodrigues. Assistente de coreografia/Coreógrafa residente: Victoria Ariante. Assistente de direção musical: Roniel de Souza. Versão brasileira: Sofia Bragança Peres, Silvano Vieira e Ricardo Marques. Produtor de objetos: Clau Carmo.

Equipe de Stage
Production Stage Manager (PSM): Tatah Cerquinho. Stage manager: Vivian Rodrigues. Stage manager: Renatinho.

Equipe de produção
Gerente de produção: Bia Izar; Produtora administrativa: Juliana Lorensseto. Produtor: Clayton Epfani

Equipe de comunicação
Produtora de conteúdo: Marilia Di Dio. Assessoria de imprensa: Pombo Correio. Agência de comunicação: AR Propaganda.

Elenco
Leilah Moreno (Rachel Marron). Fabrizio Gorziza (Frank Farmer). Talita Cipriano (Nicki). Pedro Galvão (Fletcher). Marcelo Goes (Bill). Vinicius Conrad (Stalker). Nalin Junior (Tony). Victor Barreto (Sy Spector) Alvaro Real (Ray Court). Back'n vocal: Daiana Ribeiro. Ensembles: Mari Saraiva,Danilo Coelho, Jefferson Felix, Leandro Naiss, Lucas Maia, Maik Soares, Raquel Gattermeier, Fernanda Salla, Josemara Macedo, Thaiane Chuvas. Swings: Vicky Maila e Lucas Teodoro.

Orquestra
Maestro / Pianista 1: Paulo Nogueira. Pianista 2: André Repizo. Segundo Regente / Pianista 3: Roniel de Souza. Reed: Chiquinho de Almeida. Trompetista: Bruno Belasco. Baterista: Douglas Andrade. Percussão: Wagner Gusmão. Baixista: Mauro Domenech. Guitarrista 1: Thiago Lima. Guitarrista 2: Lucas Fragiacomo. Pianista (ensaio): Roniel de Souza e André Luz Coletti. Produção: 4ACT Performing Arts.


Serviço
"O Guarda-Costas - O Musical"
Temporada até 11 de junho de 2023. Local: Teatro Claro SP – Shopping Vila Olímpia - R. Olimpíadas, 360 - Vila Olímpia/São Paulo. Capacidade: 799 pessoas Site: teatroclarosp.com.br. Classificação: 12 anos. Duração: 125 minutos. Acessibilidade. Ar-condicionado. Sessões: quinta e sexta-feira, às 21h. Sábado, às 17h30 e 21h. Domingo, às 19h. Ingressos: de R$ 50 a R$ 200. Obs.: confira legislação vigente para meia-entrada. Canais de venda oficiais: www.sympla.com.br - com taxa de serviço. Bilheteria física - sem taxa de serviço. Teatro Claro (Shopping Vila Olímpia). De segunda-feira a sábado, das 10h às 22h. Domingos e feriados, das 12h às 20h. Telefone: (11) 3448-5061.

  


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.: #Resenhando20Anos: peça "Ghost - O Musical" emociona do início ao fim


No dia 4 de junho de 2023 o Resenhando.com completou 20 anos. Durante esse mês, matérias emblemáticas que foram destaque no portal editado pelos jornalistas Mary Ellen Farias dos Santos e Helder Moraes Miranda serão republicadas. Ao fazer essa visita ao passado, percebemos que os textos ainda estão atuais. 

Algumas delas, republicadas na íntegra, embora extremamente relevantes, apresentam aspectos datados ou têm marcas de expressões, pensamentos e linguagens que podem estar ultrapassadas, mas são um registro da história deste veículo. A crítica de teatro "'Ghost - O Musical' é completo e emociona do início ao fim", é uma das mais lidas nos 20 anos Resenhando.com.

"Ghost - O Musical' é completo e emociona do início ao fim"

Por Mary Ellen Farias dos SantosEm setembro de 2016

Quem nunca ouviu o sucesso "Unchained Melody" e, mentalmente, visualizou a Demi Moore e Patrick Swayze na cena sensual do vaso de argila em "Ghost - Do Outro Lado da Vida" que atire a primeira pedra, já! O longa de 1990, em 2011, foi adaptado para o teatro e passou por palcos americanos e internacionais na versão musicada. Entretanto, desde o início de setembro de 2016, está mais brasileiro do que nunca e ganhou versão musical que estará em cartaz até 11 de dezembro, no Teatro Bradesco, em São Paulo.

Aos que tanto valorizam o fato de não receber "spoilers", não há o que esconder desta clássica trama. "Ghost - O Musical" reconta a famosa história de amor entre Molly e Sam para os dias atuais, que, fatidicamente é interrompida pelo desejo mega ambicioso de Carl, um amigo-urso. Como nem tudo são lágrimas e tristeza, a graça faz da vidente Oda Mae um personagem de peso que suaviza todo o drama e chororô. Não só pela atuação hilária e caprichada -às vezes caricata- da cantora e atriz Ludmillah Anjos, mas pela cena de apresentação, que tem um "algo a mais", que no caso é em dobro: Duas ajudantes que, de fato, colaboram no alto nível do bom humor, fazendo com que a intérprete de Oda Mae Brown brilhe ainda mais em cena.

Nem tudo são risadas, afinal, a história é de um espírito ainda apegado à vida. Além de ter um "fantasma" em cena, outra curiosidade é a da transformação de um clássico do drama e romance em musical. Considerando apenas o filme é preciso ir além de "Unchained Melody". Por outro lado, facilmente se esbarra na repetitiva provocação de Sam à falsa vidente Oda Mae: "Um elefante incomoda muita gente". Engraçado? Também! O que torna "Ghost - O Musical" imperdível? Todos os ingredientes que amolecem até os mais duros de coração, fazendo rir e até chorar, além de tentar secar as lágrimas enquanto se dá boas gargalhadas com as peripécias de Oda Mae.

Não há dúvida de que a meta do desafio para resgatar e reconquistar o público com algo tão entranhado na memória afetiva é realizado com êxito pelo produtor Ricardo Marques e toda equipe. O uso de recursos como pouca luz e efeitos especiais dão total credibilidade ao que se vê: seja no momento da morte de Sam, em que o corpo permanece caído e a alma dele testemunha a agonia de Molly na rua ou na despedida final dos dois. É para chorar? Totalmente. Logo, o funga-funga e mãozinhas secando as lágrimas viram uma coreografia seguida pelo público.

E ali um pouco abaixo do palco, perto da plateia do gargarejo, uma orquestra perfeitamente sincronizada pelo maestro que faz a emoção transbordar, independente do estilo da canção. Sim! A trilha sonora passeia do romântico ao rock mantendo a transição completamente agradável. O som natural de cada instrumento consegue se conectar diretamente com o público, muitas vezes, passando de modo até imperceptível. 

"Ghost - O Musical" abrange todos os corações, aqueles que ainda vão amar e os que amam para sempre. De fato, embora famílias e amigos marquem presença, é nítido, no público em geral, a maioria formada por casais das mais variadas idades. Detalhe: Seja durante ou no intervalo do espetáculo, as mãos dadas são mantidas. Vale a pena se apaixonar mais uma vez por essa história clássica? Com toda certeza! Emocione-se e repense no valor à vida diante da atuação musicada de André Loddi (Sam), Giulia Nadruz (Molly), Igor Miranda (Carl) -que facilmente rouba as cenas- e Ludmillah Anjos (Oda Mae Brown). 

*Editora do site cultural www.resenhando.com. É jornalista, professora e roteirista. Twitter: @maryellenfsm


"Unchained Melody" e a cena clássica de "Ghost - Do Outro Lado da Vida"

sábado, 3 de junho de 2023

.: #Resenhando20Anos: Crítica: "A Lista", com Lilia Cabral e Giulia Bertolli


No dia 4 de junho de 2023 o Resenhando.com completa 20 anos. Durante esse mês, matérias emblemáticas que foram destaque no portal editado pelos jornalistas Mary Ellen Farias dos Santos e Helder Moraes Miranda serão republicadas. Ao fazer essa visita ao passado, percebemos que os textos conseguem estar muito atuais. 

Algumas delas, republicadas na íntegra, embora extremamente relevantes, apresentam aspectos datados ou têm marcas de expressões, pensamentos e linguagens que podem estar ultrapassadas, mas são um registro da história deste veículo. A resenha crítica do espetáculo "A Lista", que está excursionando pelo país, é uma das mais lidas nos 20 anos de Resenhando.com. Na republicação da crítica, foi retirado o serviço da peça.


.: Crítica: "A Lista", com Lilia Cabral e Giulia Bertolli, mãe e filha no teatro

Por 
Helder Moraes Miranda, editor do Resenhando. 

Depois de dez anos, Lilia Cabral volta ao teatro em São Paulo na estreia nacional da peça "A Lista", ao lado da filha Giulia Bertolli, juntas no palco pela primeira vez. A montagem inédita segue em cartaz nos palcos do Teatro Renaissance com dramaturgia de Gustavo Pinheiro e direção de Guilherme Piva. Foto: Pino Gomes

Algo de mágico acontece nas noites de São Paulo entre o sábado e o domingo. É quando as atrizes Lilia Cabral e Giulia Bertolli sobem ao palco do Teatro Renaissance para apresentar "A Lista", peça teatral escrita por Gustavo Pinheiro. Sob a direção cheia de sensibilidade de Guilherme Piva, elas emocionam, divertem e falam sobre o agora, em um momento em que a pandemia ainda está entre nós e atingiu tanta gente: a catarse é generalizada.

A partir de dois pontos de vista antagônicos, as personagens Laurita (Lília Cabral) e Amanda (Giulia Bertolli) discutem a relação construída a partir de uma gentileza: a história da jovem prestativa que se oferece para fazer compras por alguns moradores de um condomínio, entre eles uma senhora que, para se protager do coronavirus, não sai de casa há meses.

Amanda erra produtos da lista, Laurita não agradece nunca e sempre reclama. Estabelece-se uma péssima relação até que uma delas resolve cortar o vínculo e, a partir de uma conversa franca, passar a limpo uma relação formada por indiferença, mágoas e mal-entendidos. A magia do palco se faz diante dos olhos de um público maravilhado. Impossível não reconhecer o talento de Lilia Cabral e nem se apaixonar pela atuação de Giulia Bertolli.

Na vida real, são mãe e filha - será que há na genética o talento de artista? Talvez essa pergunta permeasse a apresentação no início do espetáculo. Depois, a dúvida se dissolve. Ter parentesco com um artista consagrado, além de ser uma dádiva, também deve ter o dissabor de ter que provar a todo mundo que se é bom no que faz. No caso de Giulia, se por acaso isso ainda for uma questão, a plateia não percebe. Não há um duelo e nem um embate entre quem é melhor - há um complemento, uma sincronia e uma espécie de linha invisível que amarra as duas e envolve a todos em uma espécie de hipnose.

É notório que o público está ali para ver de perto a grande dama da televisão brasileira. Lilia Cabral, musa das reexibições das novelas no período da pandemia em horário nobre da emisssora líder de audiência no país - foram duas protagonistas e um papel de destaque em sequência: "Fina Estampa" (de Aguinaldo Silva), "A Força do Querer" (de Glória Perez) e "Império" (de Aguinaldo Silva).

No palco, não é novidade a entrega de uma artista tarimbada pela televisão - é o que se espera dela, mas o grande ponto de interrogação era a atuação da filha. Giulia Bertolli é, surpreendentemente, a cereja do bolo de "A Lista" - e talvez a espinha dorsal de tudo o que gira em torno desta produção. Em um embate de falas contundentes entre as personagens - a atriz, que chega a interpretar duas personagens - brilha de uma maneira que nenhuma artista da idade dela, diante de um mito feito Lilia Cabral, conseguiria fazer. Há segurança e integridade em todas as falas ditas por ela, mas também há muita humanidade.

Não há a competição de quem é melhor entre as atrizes porque não há disputa. Há, sim, uma atmosfera de afeto que talvez não fosse possível perceber se não fossem mãe e filha em palco cujo público está rendido. Não existe "A Lista" sem Lília Cabral, muito menos o espetáculo não teria o mesmo impacto sem a presença marcante de Giulia Bertolli. Qualquer substituição possível não teria o mesmo efeito.

"A Lista" é sobre o agora, mas é também sobre a urgência de encarar a própria vida e transformar o que restou dela. É imprescindível assistir e, se por algum motivo você não sair mudado, reveja (a vida e a peça - nas duas situações, pode ter certeza, você sairá no lucro).

Ficha técnica:
Espetáculo: 
"A Lista". Texto: Gustavo PinheiroDireção: Guilherme Piva. Elenco: Lilia Cabral e Giulia Bertolli. Cenários e figurinos: J.C. Serroni. Iluminação: Wagner Antônio. Direção de movimento: Marcia Rubin. Assessoria de imprensa: Adriana Balsanelli e Renato Fernandes. Fotógrafo: Pino Gomes. Programador visual: Gilmar Padrão Jr. Direção de produção: Celso Lemos.


A Lista", com Lilia Cabral e Giuliana Bertolli. Foto: Bob Sousa

sábado, 11 de fevereiro de 2023

.: Crítica: "Consentimento" ultrapassa as barreiras do palco ao falar de abusos


Espetáculo "Consentimento", com direção de Camila Turim e Hugo Possola, uma tragicomédia divertida no riso nervoso de quem vê diante do espelho suas contradições e fissuras, no Sesc Santos. Com texto da premiada autora inglesa, Nina Raine, espetáculo é contemporâneo e impactante, uma peça que consegue ser contundente, dolorosa e afiada. Foto: Priscila Prade


Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando.com. 

Você finge que é algo e os outros fingem que acreditam. Assim se mantém a paz entre os relacionamentos - de amigos, amantes e familiares - na vida real. Qualquer semelhança com a vida real não é mera coincidência quando se é colocado diante de um espetáculo do porte de "Consentimento", que ecoa por horas após ser apresentado. É forte, visceral, polêmico e conta com atores que têm gabarito para defender personagens tão contundentes. Ou seja, um espetáculo perfeito.

"Consentimento" vai além do que se espera de uma peça teatral: assistir, entender a mensagem e ir embora para a casa. Para os que vão em busca de dar umas risadas e abstrair a vida, um aviso importante: não é isso que acontece. O espetáculo incomoda e faz valer a máxima de que a arte, muitas vezes, deixa de ser mero entretenimento. Ninguém é anjo no espetáculo da autora inglesa Nina Raine - ainda bem - porque a partir de personagens tão inquietantes - e muitas vezes insuportáveis - surgem discussões e questionamentos que ultrapassam as barreiras do palco.

As situações ocorridas na peça podem conduzir o espectador, pelo menos, a ter um olhar mais crítico e manifestar um pouco mais de empatia por quem passa por situações de abuso. O sistema judicial, que muitas vezes coloca a culpa nas vítimas de violência sexual, é colocado no centro da questão a partir das histórias de cinco amigos que não escondem contradições e expõe maledicências deles próprios e dos outros sem papas na língua.

É na superficialidade dos encontros casuais e festivos que as camadas mais profundas desse quinteto começa a aparecer. Basta uma "brincadeirinha" aqui e um jogo da verdade acolá para as mágoas mais profundas serem colocadas à tona e os personagens tirarem as máscaras. A versão brasileira é dirigida e idealizada por Camila Turim, com co-direção de Hugo Possolo.

Ela também está no elenco com a personagem Kitty, que é a personificação de uma panela de pressão. Sabe-se que ela irá explodir a qualquer momento, mas não se imagina tanto. Essa pólvora, que é a personagem de Camila Turim, é feita sob medida para o talento da atriz, que faz boas trocas com todo o elenco, mas quando o confronto é com Ed, defendido por Flavio Tolezani, o espetáculo chega ao ápice e à catarse: personagens cheios de empáfia sendo destruídos por outros que foram subjugados é de um prazer sobrenatural. Como a bela que derrotou a fera em "King Kong", como a luta de classes na novela "Avenida Brasil" e no romance "O Primo Basílio", de Eça de Queiroz. 

Com a confusão generalizada que se estabelece, o público fica inquieto e, ao mesmo tempo, fascinado. "Consentimento" oferece de bandeja aquelas brigas que só personagens e personalidades de classe-média alta são capazes de proporcionar. No final das contas, vale ressaltar, as vítimas sempre têm razão. "Consentimento" só ressalta que aqueles que estão envolvidos nessa alegoria de situações são somente a representação de um sistema de injustiças em que vítimas e algozes são naturalizados no cotidiano de todos.

No papel de uma vítima de estupro, Lisi Andrade toma para si todas as dores de uma personagem dificílima de ser construída e, depois, reaparece em outro papel mais leve e transforma-se completamente. Helô Cintra Castilho, como Raquel, também mostra todo o seu carisma em uma personagem que sofre nas mãos de um homem e fica do lado de um deles quando a amiga, que a apoiou no passado, passa por uma situação traumática. 

Mas não é somente com assuntos espinhosos que "Consentimento" agarra o espectador. Anna Cecilia Junqueira, como Zara, atriz em ascensão, é uma personagem vibrante e repleta de sonhos. Ela está em busca de ter um filho e é em Tim, interpretado por Gui Calzavarra, que a princípio rejeita, que o espetáculo tem um pouco de cor. Calvazarra, em seu papel, leva o público a testemunhar uma revanche. De alguém que é ironizado por todos, torna-se interesse romântico e estabelece um quadrilátero amoroso que só uma construção sólida, como a que ele fez, para tornar o personagem crível. 

Transitando por todos os personagens, Jake, interpretado por Sidney Santiago Kuanza, é o que parece mais real. No princípio, o público detesta o personagem que normaliza infidelidades. Depois, ele passa por uma redenção ao ficar do lado da mulher do melhor amigo em uma situação grave. Ele é a chave da virada do espetáculo e também o ponto de partida para entender que todos podem mudar - e melhorar como pessoas. Kuanza tem feito uma grande carreira e é um dos nomes a se prestar atenção no teatro brasileiro. 

Nos diálogos ácidos dos personagens é que todos se formam entre acertos e contradições. Os personagens não têm razão e, ao mesmo tempo, têm. Os homens da peça, em sua maioria, têm péssimo caráter e precisam repensar a vida urgentemente. As mulheres - todas - precisam de ajuda. No meio disso tudo, entre personagens que são desprezíveis em boa parte do tempo, "Consentimento" surpreende ao falar de empatia. A empatia que nasce do "olho por olho, dente por dente", mas que direciona um olhar mais real para coisas que não são ditas e precisam de conserto. Recomenda-se assistir "Consentimento" com sentimento de libertação.

O espetáculo foi assistido no palco do Sesc Santos na última sexta-feira, dia 10 de fevereiro. O espetáculo será apresentado também neste sábado, às 20h, no Sesc.

Ficha técnica
Texto: 
Nina Raine
Tradução: Clara Carvalho
Direção: Camila Turim e Hugo Possolo
Elenco: Ed (Flavio Tolezani), Kitty (Camila Turim), Raquel (Helô Cintra Castilho), Jake (Sidney Santiago Kuanza), Tim (Gui Calzavara), Zara (Anna Cecília Junqueira) Gayle e Laura (Lisi Andrade).
Assistente de direção: Tadeu Pinheiro
Cenografia: Bruno Anselmo
Trilha sonora: Dan Maia
Desenho de luz: Miló Martins
Figurinos: Anne Cerutti
Assistente de figurino: Luiza Spolti De Menezes
Colagens: Isabel Wilker
Fotos: Priscila Prade
Visagismo: Carolina Pinsdorf e Sulamita Dancuart
Designer gráfico: Werner Schulz
Vídeos: Cassandra Mello
Assessoria de imprensa e mídia social: Pombo Correio
Operador de luz: PH Moreira
Operador de som: Monique Carvalho
Coordenação de produção: Maurício Inafre
Administração: Erika Horn
Assistente de produção: Regilson Feliciano


Serviço
"Consentimento" – direção de Camila Turim e Hugo Possolo
Dias 10 e 11 de fevereiro, sexta e sábado, às 20h
Teatro do Sesc Santos
Ingresso - R$ 40 (inteira). R$ 20 (meia-entrada). R$ 12 (credencial plena)
Classificação: 16 anos 

Sesc Santos 
Rua Conselheiro Ribas, 136, Aparecida
(13) 3278-9800
www.sescsp.org.br/santos 

Orientação para acesso à unidade
Obrigatório o uso de máscara em lugares fechados.

Bilheteria Sesc Santos - Funcionamento
Terça a sexta, das 9h às 21h30 | Sábado, domingo e feriado, das 10h às 18h30 

Estacionamento em espetáculos (valor promocional – mediante apresentação de ingresso): R$ 6 (Credencial plena); R$ 11 (visitantes). Para ter o desconto, é imprescindível apresentar no caixa a credencial plena atualizada. 

Bicicletário: gratuito. Uso exclusivo para credenciados no Sesc. É necessária a apresentação da credencial plena atualizada e uso de corrente e cadeado por bicicleta. 100 vagas.  

terça-feira, 13 de dezembro de 2022

.: Crítica de teatro: em "Gaslight", as mulheres são o próprio perigo

O Resenhando.com assistiu à peça antes de excursionar pelo país - na última apresentação no Teatro Procópio Ferreira, em São Paulo. Agora, o espetáculo conta com nova formação e traz os atores Gustavo Merighi e Maria Joana nos papéis que antes eram interpretados por Leandro Lima e Kéfera Buchmann. Foto: Priscila Prade

Por Helder Moraes Miranda, editor do portal Resenhando. 

Excursionando pelo país, "Gaslight - Uma Relação Tóxica", a última peça teatral dirigida por Jô Soares,  ainda soa moderna nos dias de hoje. Isso não seria um feito impressionante se o espetáculo não fosse escrito pelo dramaturgo britânico Patrick Hamilton em 1938.

As apresentações fizeram sucesso na Broadway e geraram a expressão que correu a boca do povo e hoje é um símbolo do combate à opressão de homens sobre mulheres. O resultado é uma das peças de maior sucesso da história da Broadway e agora, mais de 84 anos depois, vem traçando uma trajetória de sucesso no Brasil com uma pitada de charme a mais, que pode ser explicada por vários motivos.

O primeiro deles é que "Gaslight" representa o último trabalho de Jô Soares no teatro. Além disso, há elementos que lembram o artista o tempo todo, e que soam como homenagens. Ele assinou tradução, a adaptação e a direção do texto, com colaboração de Matinas Suzuki Jr. e Mauricio Guilherme, parceiros de trabalhos anteriores. Mas não é só isso: Jô está representado no espetáculo a partir de um quadro com a figura dele pintada com uma expressão de que observa tudo e todos.

Não se sabe se aquele quadro no meio do cenário estava previsto ou se foi uma homenagem muito adequada. Trazer à tona um assunto que ainda hoje é tão oportuno, mas escanteado em pleno século XXI, também é um mérito da peça. A  expressão "Gaslighting" surgiu na peça e até hoje se refere a uma forma de abuso psicológico em que informações são distorcidas ou omitidas para favorecer o abusador, que também pode inventar algo com a intenção de fazer a vítima duvidar da própria memória, percepção e sanidade mental. 

Há no espetáculo um quinteto incrível de artistas com personagens igualmente marcante, que formam um espetáculo que vai marcar época. Assistimos a última apresentação do espetáculo no Teatro Procóprio Ferreira, em São Paulo, e o que se pode perceber é a alternância de protagonistas em um texto capaz de fazer com que todos os atores tenham um momento para brilhar em cena. 

Érica Montanheiro na pele da ingênua dona de casa Bella é uma força da natureza. Ela alterna força, bravura, desespero e vulnerabilidade em uma personagem que sofre nas mãos de um marido repugnante. A partir de manipulações do marido, a personagem pensa que está ficando louca, e o desespero é matéria-prima para uma artista desse quilate soltar todas as suas feras e arrebatar o público.

Do lado da sanidade, é muito fácil odiar Giovani Tozi na pele de Jack, o marido abusivo que se utiliza das luzes para confundir a esposa. Não fosse o talento dos dois atores, poderia facilmente cair no caricato, e o embate entre os dois, em uma das cenas mais tensas do teatro brasileiro em 2022, é de cair o queixo. 

Leandro Lima, ator recém saído da novela "Pantanal" mostra versatilidade no papel de Ralf (agora interpretado por Gustavo Merighi),  um investigador de polícia que faz a roda da história avançar. É uma alegria ver como a passagem de tempo fez bem para o ator que brilhou em "A Minha Primeira Vez" no Teatro Folha - crítica neste link. Se já era excelente, aprimorou o talento.

Com muita naturalidade, Kéfera Buchmann é a doce surpresa do espetáculo e talvez a mais marcante. Intérprete da jovem e extrovertida Nancy (agora interpretada pela atriz Maria Joana), a nova arrumadeira da casa, ela aproveita cada momento em cena para mastigar, degustar e devolver cada fala aos companheiros de cena em um bate-bola que envolve o público, extasiado com o que vê. No espetáculo, às vezes Kéfera é uma fada encantadora, em outras é uma bruxa que poderia ser queimada pela inquisição. 

É, também, a personagem mais complexa, pois é a metáfora da tentação que transforma mulheres em seres diabólicos - porque pensam, ou simplesmente porque são mulheres e, consequentemente, provocam o que há de melhor e pior nas pessoas, sobretudo nos homens. O público fica exposto ao surgimento de uma grande atriz, com uma atuação extremamente moderna, que resolveu abdicar do engajamento fácil (para ela) e construir uma carreira sólida de artista. Merece muita atenção e todos os aplausos possíveis. 

Por falar em grande artista, Neusa Maria Faro, que interpreta a governanta Elizabeth, é o ponto de doçura da peça. É impossível não saborear o prazer vê-la em cena, ainda mais em um papel nada óbvio - não é uma senhora adorável, mas também não é um diabo - caminha pelo meio termo. Há uma mistura de doçura e ironia fina nesta atriz que, a cada vez que aparece, torna tudo ainda mais especial. 

Nessa releitura feminista, o final é um recado direto aos homens: as mulheres não são as mesmas de 1938. Não se encaixam mais no papel de pessoas indefesas, relegadas ao papel de vítimas, e muito menos esperam um príncipe encantado para salvá-las de um risco iminente em uma torre alta e inacessível. Elas são o próprio perigo. Que assim seja.

Gustavo Merighi interpreta o investigador Ralf, e Maria Joana é a jovem e espirituosa Nancy, papéis que antes eram defendidos por Leandro Lima e Kéfera Buchmann

sábado, 15 de outubro de 2022

.: "Quando Eu For Mãe Quero Amar Desse Jeito": ninguém é anjo no teatro


Por 
Helder Moraes Miranda, editor do Resenhando. 

O amor é sublime, estranho e, em alguns casos, tétrico. Em "Quando Eu For Mãe Quero Amar Desse Jeito", dirigido com acidez, eficiência e sensibilidade por Tadeu Aguiar e em cartaz até dia 29 de outubro no Teatro Raul Cortez, coloca na essência do amor um tempero picante. O conflito começa quando uma septuagenária recebe a notícia de que o filho único vai se casar com uma mulher desconhecida.  

A partir daí, o espetáculo, que traz Vera Fischer, Larissa Maciel e Mouhamed Harfouch no centro de um ringue em que a disputa é a atenção de um homem - porque o amor elas já têm - tira o açúcar do sentimento amoroso para colocá-lo sobre uma ótica apimentada e sem o conservadorismo a que todos estão acostumados a presenciar.

No texto de Eduardo Bakr que é a nata da mais pura ironia fina, Vera Fischer ressurge no teatro para um papel que dá sentido a toda a trajetória de sucesso que construiu antes e que, muitas vezes, foi menosprezada. Ela está brilhante na pele da dona de casa Dulce Carmona, uma mulher que se torna fera para defender os interesses - financeiros - da família.Não há nela um pingo de pieguice ou falso moralismo: ela é o que é, sem formalidades.

Dizer que a veterana está linda no papel é redundância, no entanto é impossível não perceber as trocas de figurino, as subidas e decidas da escadaria cenográfica e as paradas cinematográficas que ela dá ao longo do espetáculo - além das corridinhas em saltos altíssimos e roupas esvoaçantes que desenham a aura da personagem e alimentam o mito de diva que acompanham a história de Vera Fischer ao longo dos anos. Mas ela não é só isso: Vera Fischer é carisma puro e, a exemplo desta peça, merece papéis tão marcantes quanto o de Dulce Carmona nos próximos trabalhos, já que o talento dela é patrimônio nacional.

Do outro lado do embate, está Larissa Maciel interpretando uma rival à altura. Com nome de flor, Gardênia é cínica, dissimulada, manipuladora e extremamente dócil. Não é uma rivalidade feminina gratuita, ambas se odeiam e se aturam, mas, ao mesmo tempo, querem se destruir. Difícil imaginar outra atriz, que não seja do calibre de Larissa Maciel, para dar coerência a uma personagem tão cheia de camadas. Ela brilha neste papel, sobretudo quando mostra a verdadeira faceta da personagem disposta ao tudo ou nada para alcançar os objetivos. Ninguém é anjo em um espetáculo que fala de amor e isso, por si só, é anárquico e libertador.

Entre as duas personagens está Lauro, interpretado por Mouhamed Harfouch muito bem em um papel que é - propositalmente - ofuscado no duelo de egos e finalidades de mulheres tão profundas e caóticas. Ele se destaca fazendo o contraponto e servindo de escada para duas mulheres alcancem o máximo de suas interpretações. É, também, um exercício de generosidade de um artista talentoso que não precisa provar nada a ninguém.  

É certo dizer que ninguém vale nada entre os "amorosos" personagens da peça teatral. Todos defendem algum interesse e têm suas razões que, dentro de um contexto plausível, são fáceis de ser justificadas. "Quando Eu For Mãe Quero Amar Desse Jeito" prova que as mulheres movem o mundo para o bem e para o mal. Nunca o amor foi retratado deste jeito no teatro, o que é sublime, estranho e... tétrico, mas, ao mesmo tempo, memorável. 


Ficha técnica
"Quando Eu For Mãe Quero Amar Desse Jeito"
Texto: Eduardo Bakr
Direção: Tadeu Aguiar
Elenco: Vera Fischer, Larissa Maciel e Mouhamed Harfouch
Cenário: Natália Lana
Figurino: Ney Madeira e Dani Vidal
Desenho de luz: Daniela Sanchez
Trilha sonora original: Liliane Secco
Assistência de direção: Flavia Rinaldi
Produção Executiva: Edgard Jordão
Coordenação de produção: Norma Thiré
Assessoria de imprensa: Morente Forte


Serviço
"Quando Eu For Mãe Quero Amar Desse Jeito"
Teatro Raul Cortez
Rua Dr. Plínio Barreto, 285 Bela Vista, SP
Funcionamento da bilheteria: terça a quinta-feira, das 14h às 19h. Sexta-feira a domingo, das 14h até o início da sessão. Sextas e sábados, às 21h. Domingos às 18h.
Ingressos a R$ 120.
Classificação indicativa: 12 anos.
Duração: 80 minutos
Ingressos à venda na bilheteria do Teatro e no site da Sympla




sábado, 1 de outubro de 2022

.: Química entre Nívea Maria e Arlindo Lopes faz "Ensina-me a Viver" explodir

Com Nívea Maria e Arlindo Lopes, a peça é uma adaptação do filme "Harold e Maude" (1971) e conta a história do improvável encontro - e paixão - entre um jovem solitário, obcecado pela morte, e uma octogenária livre e apaixonada pela vida. Foto: Lúcio Luna

Por Helder Moraes Miranda, editor do Resenhando. 

Ao que tudo indica, o teatro está dando a atrizes veteranas papeis que a televisão vem lhes negando com o passar do tempo. Um exemplo disso é o espetáculo "Ensina-me a Viver", em últimas apresentações no Teatro Porto, que devolve à atriz Nívea Maria - grande nome das novelas na época de ouro da teledramaturgia brasileira - ao patamar de estrela, desta vez nos palcos.

Ela empresta o talento, a dicção inconfundível e o carisma a uma personagem extremamente marcante: Maude, uma jovem de 80 anos apaixonada pela vida - em texto escrito por Colin Higgins, que rendeu o filme "Harold e Maude" em 1971. O desafio é duplo: ela assumiu a personagem que, durante algumas temporadas, pertenceu a Glória Menezes. Em quase duas horas de espetáculo, o público permite se apaixonar por essa persona tão inusitada e livre de convenções - torná-la plausível e palpável deve-se ao talento da artista, que acolhe uma história de amor que poderia ser polêmica mas que ganha a torcida dos espectadores.

A química se dá, também, pelo outro lado da história de amor - Arlindo Lopes interpreta Harold, um senhor de 20 anos que não vê razão para continuar vivo e tenta, de diferentes maneiras, suicidar-se ou chamar atenção da mãe, interpretada por Susana Ribeiro, ótima no papel da mãe que sente dificuldade para ouvir o que o filho quer dizer e, ao mesmo tempo, não é indiferente a ele - um papel extremamente desafiador que caiu como uma luva para esta atriz brilhante. 

O casal de protagonistas, juntos, é tão arrebatador que a diferença de idade entre o casal de protagonistas torna-se o menor dos empecilhos. Elisa Pinheiro que interpretou as três pretendentes de Harold até a apresentação de domingo passado, dia 25 de setembro, e foi substituída pela atriz Fernanda de Freitas para as últimas apresentações, mostrou versatilidade e é responsável por boas risadas. Luciano Bortoluzzi, outro ator que interpreta vários personagens durante o espetáculo, também rende bons momentos em personagens que fazem a história engrenar.

A versão brasileira tem a sensibilidade de João Falcão, que dirige e adapta o espetáculo a partir da tradução de Millôr Fernandes. No limiar entre vida e a morte, "Ensina-me a Viver" é uma experiência inusitada e, surpreendentemente, um espetáculo leve - com uma trilha sonora alto-astral e personagens que ultrapassam períodos difíceis, mas que sempre veem o lado positivo das situações. No fim das contas, os espectadores aprendem um pouquinho sobre a vida e a maneira de conduzir a vida a partir da ótica de personagens tão cativantes. É uma história de amor, daquelas que poderiam pertencer a quaisquer pessoas, com elementos que fogem das convenções sociais. É uma explosão de afeto imperdível, profunda e suave.


Serviço
Local:
 Teatro Porto - Alameda Barão de Piracicaba, 740 - Campos Elíseos | Sextas e sábados às 20h e domingos às 17h | Classificação: 12 anos | Duração: 110 minutos  | Ingressos: R$ 25 a R$ 100 | Até 9 de outubro | Leia + Espetáculo "Ensina-me a Viver" estreia no Teatro Porto dia 19 de agosto


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